Família e Fé

Fugir da realidade

Alguém me dizia, recentemente, que os livros mais «consumidos» pela juventude hodierna são aqueles que ajudam a fugir da realidade.

Em concreto, os livros cujo público-alvo são as adolescentes possuem uma receita que não falha: transportá-las para mundos imaginários que as ajudem a «emitir» frequentes suspiros cor-de-rosa. E finalizava essa pessoa dizendo: «Basta ajudá-las a refugiarem-se na sua imaginação e elas sentem-se felizes. E, mais importante ainda, recomendam o livro às amigas».

É necessário reconhecer, em abono da verdade, que cada um de nós necessita da sua imaginação para viver de um modo humano. Se não fosse assim, Deus não no-la teria dado.

Sem imaginação, não haveria projectos na nossa vida. E, sem projectos, a vida tornar-se-ia maçuda, monótona e insonsa.

Sem imaginação, faltar-nos-ia criatividade. E, sem criatividade, seria deveras difícil encarar o nosso trabalho quotidiano com um salutar entusiasmo.

A imaginação ajuda-nos a expandir o nosso mundo interior e a transcendê-lo. Torna-nos maiores do que aquilo que somos. E é por isso que temos a sensação de que ela nos dá vida e nos anima a viver.

Dá-nos asas, faz-nos voar – e liberta-nos da excessiva monotonia do dia-a-dia.

No entanto, a imaginação descontrolada converte-se num mecanismo de evasão.

Soltar a imaginação sem nenhum tipo de controlo é uma autêntica droga. É verdade que proporciona uma alegria e um alívio passageiros, mas também é verdade que acaba por submergir as pessoas numa triste dependência, como é próprio dos estupefacientes.

Evadir-se em sonhos proporciona um certo bálsamo de refrigério interior.

Mergulhar num mundo imaginário – em que somos sempre heróis, sem defeitos nem limitações – é fácil, entusiasmante e acessível a qualquer um. Faz-nos sentir uma completa liberdade: ninguém, excepto nós próprios, consegue pôr obstáculos à nossa imaginação.

Mas, não nos enganemos, é uma liberdade fictícia. Só existe numa vida que não é real – falsa por definição!

Fugir da realidade não nos pode proporcionar a verdadeira felicidade. Pode ser – como o canto de uma sereia – entusiasmante, deslumbrante e sedutor. Basta pensar no êxito da “second life” no mundo informático.

No entanto, bem vistas as coisas, nunca é libertador.

Porque procede de uma vida falsificada. E a liberdade e a felicidade só são possíveis na realidade. Nunca na mentira, nem no imaginário que afasta da realidade.

Fugir da realidade também não é libertador porque na vida imaginária não há esforço. E, sem esforço, as pessoas tornam-se passivas e inactivas – escravas de uma vontade adormecida.

Essa fuga da realidade não dá a paz que tanto se procura. A paz autêntica também é fruto do esforço por pôr ordem na nossa imaginação e não nos deixarmos enganar ou anestesiar por ela.

Pe. Rodrigo Lynce de Faria 

Doutor em Teologia

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