Universidade de São José cria rádio digital para combater a fome
Combater a fome e a insegurança alimentar com a ajuda da Inteligência Artificial. Este é o objectivo de um novo consórcio académico, criado por iniciativa da Universidade de São Paulo, no Brasil. A Universidade de São José associou-se ao projecto e vai acolher um dos polos de uma nova rádio digital que aposta na criação de conteúdos de divulgação científica, direccionados para os países de língua portuguesa.
A Universidade de São José (USJ) associou-se à Universidade de São Paulo e a cerca de uma dezena de outras instituições de Ensino Superior do Brasil, e de outras nações, num projecto pioneiro de combate à fome e à insegurança alimentar.
Com uma duração de três anos, a iniciativa apresenta uma natureza multidisciplinar e une académicos e especialistas em domínios tão distintos como a Agricultura, Economia, Comunicação, Engenharia ou a definição de políticas públicas em torno do desígnio comum de delinear estratégias de combate à fome, explicou Adérito Fernandes Marcos, académico responsável por coordenar a participação da USJ no projecto. «Este foi concebido com base na premissa de que é necessária a união de esforços multi e transdisciplinares, com o trabalho conjunto de especialistas em Agricultura, Meio-Ambiente, Urbanização, Economia, Engenharia, Comportamento Alimentar, Comunicação e Políticas Públicas, e outros que se possam somar para instanciar acções eficazes de combate à fome, seja no Brasil ou em outros pontos do globo», disse o investigador, em declarações a’O CLARIM.
A fome e a segurança alimentar são os aspectos mais flagrantes de um problema que se ramificou e deixou de afligir apenas os países e as sociedades mais pobres. Coordenado por Dirce Maria Lobo Marchioni, professora universitária e cientista de renome no campo da Nutrição, o projecto propõe abordar outras variações do desafio original, como o acesso a nutrientes ou o desperdício alimentar. «A questão não se cinge hoje apenas à fome como carência de alimentação fundamental, um problema gritante dos países e territórios mais pobres do mundo, mas também às questões da saúde e nutrição, a segurança alimentar ou desperdício de alimentos – assuntos prementes nas sociedades mais desenvolvidas», ressalvou Adérito Marcos.
Com uma abrangência global, o projecto pressupõe a recolha e o processamento de um grande volume de dados e pretende fazer uso de sistemas de Inteligência Artificial para delinear modelos sustentáveis de produção e consumo que possam ajudar a tornar tangível a erradicação da fome. «A Inteligência Artificial assume um papel crucial no projecto pelo potencial de processamento integrado e sistematizado do grande volume de dados que hoje é gerado por toda a cadeia de valor, desde a produção até ao consumo dos alimentos, passando por todas as etapas dos sistemas agro-alimentares, de gestão de resíduos e restos alimentares, ou ainda de controlo da poluição, entre outros», elencou o professor catedrático, acrescentando: «A Inteligência Artificial permitirá a extração de conhecimento e a aprendizagem para um efectivo apoio à decisão na resolução de problemas reais no suprimento de alimentos-base, na gestão dos desperdícios, promoção da segurança alimentar e nutrição, em todas as suas dimensões».
FOME NO MUNDO:COMBATE NO ÉTER
O projecto contempla intervenções em cinco grandes eixos temáticos: Saúde e Nutrição, Políticas Públicas, Cadeias de Valor, Inteligência Artificial e Comunicação. A participação da Universidade de São José, através da Faculdade de Artes e Humanidades, centra-se no domínio da comunicação mediática e prevê a criação, em Macau, de um dos polos de uma rádio digital e a produção no território de conteúdos – com uma forte aposta na divulgação científica – direccionados para os países de língua oficial portuguesa. «No que toca a Macau, aquilo que nos propomos fazer é verificar, aprofundar, estudar e aplicar diferentes recursos mediáticos para abordar a questão da segurança alimentar, a forma como podemos ampliar o conhecimento e como o podemos fazer chegar e ser compreensível à população em geral, com especial enfoque na população do território», revelou Adérito Marcos. «No que toca à “webradio”, este é um projecto que é feito por estudantes e professores e focar-se-á na divulgação científica e cultural em geral, incluindo as questões da nutrição e do combate à fome, no âmbito deste projecto. Os conteúdos focar-se-ão primeiramente no conhecimento gerado nas Universidades e entidades parceiras para depois alargar para outras entidades, e ainda abarcando a dimensão cultural local a cada território. As emissões serão em língua portuguesa».
Coordenada por José Manuel Simões, responsável pelo Departamento de Comunicação e Média da Universidade de São José, a nova rádio digital arranca com polos em Macau e em São Paulo, no Brasil, mas o objectivo dos responsáveis pelo projecto é garantir a produção de conteúdos em todos os países e territórios de expressão portuguesa. «A rádio “web” académica de divulgação científica a constituir-se em rede, agrega polos nos diferentes países e territórios de língua portuguesa, envolvendo os cinco de África (Angola, Cabo Verde, Guiné-Bissau, Moçambique, São Tomé e Príncipe), os dois da Ásia (Timor Leste e Macau), e Brasil e Portugal. O projecto arranca com dois polos localizados na Universidade de São Paulo e na Universidade de São José», sublinhou.
A participação da RAEM pode, no entanto, evoluir noutros sentidos. Na calha está a eventual criação de um museu virtual que pretende explorar a diversidade cultural e gastronómica de Macau, através de registos de natureza audiovisual. «Com o eventual entrosamento neste projeto está previsto o estabelecimento de uma nova linha multi e transdisciplinar de investigação na área da narrativa biográfica, tomando Macau como referência epistemológica multicultural, um laboratório vivo de diversidade cultural para o desenvolvimento sustentável, onde a narrativa digital pessoal se constitui como instrumento de afirmação cultural das diferentes tradições gastronómicas e hábitos alimentares, prevendo-se para o efeito a criação de um espaço museológico virtual da narração de histórias de vida», adiantou o académico.
Para além da Universidade de São Paulo, da USJ e de várias outras instituições de Ensino Superior do Brasil, o projecto conta ainda com a colaboração das Universidades de Toronto, Newcastle e de Lisboa e do Porto.
Marco Carvalho