Amnésia familiar.
Numa época de enorme amnésia familiar e social, a Associação Famílias sugeriu um dia de “Memórias da Família”, o qual é celebrado todos os anos, no primeiro Domingo de Dezembro.
“Preservar e promover a memória familiar colectiva é trabalhar por famílias mais equilibradas e por uma sociedade contemporânea mais estável”.
Rezar pelos familiares já falecidos, preparar uma refeição com iguarias típicas de cada família, visitar localidades ou moradias de antepassados e recordar e criar condições para um diálogo intra-familiar e inter-geracional de memórias, recordações, hábitos e tradições dos tempos vividos, poderão ser óptimas sugestões para fazer a ponte entre passado e presente, rumo a um futuro mais ciente e consciente.
Os mais velhos sabem histórias dum passado comum e conhecem factos familiares, que nos revelam as raízes e as origens de tudo o que na realidade somos.
“Com as armas atómicas a humanidade contemplou a possibilidade da nossa própria extinção. Sabotar a família é um caminho muito mais rápido e seguro para essa aniquilação. (…) Ora, o que está a acontecer na família, por causa da mesma mudança socio-económica, é ainda mais determinante e devastador que os impactos ecológicos. De facto, aí não está apenas em causa a sobrevivência da sociedade, mas da própria personalidade, cultura e civilização. (…) As alterações a nível familiar estão a mudar, não apenas a envolvente em que o ser humano vive, mas a sua própria identidade humana e equilíbrio emocional. (…) Todos os estudos mostram que uma família equilibrada é a forma natural e eficaz de promover a educação, saúde, felicidade e combater o crime, a injustiça e a violência”. (**)
Ciente da premência da Família, também o Papa Francisco, no seu discurso em Estrasburgo aos Eurodeputados e a toda a Europa referiu: «Dar esperança à Europa não significa apenas reconhecer a centralidade da pessoa humana, mas implica também promover os seus dotes. Trata-se, portanto, de investir nela e nos âmbitos onde os seus talentos são formados e dão fruto. O primeiro âmbito é seguramente o da educação, a começar pela família, célula fundamental e elemento precioso de toda a sociedade. A família unida, fecunda e indissolúvel traz consigo os elementos fundamentais para dar esperança ao futuro. Sem uma tal solidez, acaba-se por construir sobre a areia, com graves consequências sociais. Aliás, sublinhar a importância da família não só ajuda a dar perspectivas e esperança às novas gerações, mas também a muitos idosos, frequentemente constrangidos a viver em condições de solidão e abandono, porque já não há o calor dum lar doméstico capaz de os acompanhar e apoiar».
Em tempos de voracidade consumista, asfixia espiritual e afectiva, em que as pessoas têm tudo mas não sorriem, é bom recordar que a educação dos filhos não acaba nunca. Eles vêem, julgam, imitam e aprendem por osmose. Logo a coerência da vida encontra-se num fio condutor do passado ao futuro geracional com paragem obrigatória no presente.
Parafraseando Gilbert Chesterton: “Em todas as famílias há problemas, mas os problemas não se resolvem dissolvendo a família. Na verdade agigantam-se”.
Sem sombra de dúvida que cuidar da árvore genealógica e aperfeiçoar os seus rebentos é o melhor antídoto para curar as muitas epidemias que têm assolado e até desmembrado esta célula, base da sociedade. Não estamos só a situar-nos num plano ético, moral ou religioso, mas essencialmente estruturante, balizador e formador de afectos, de personalidades fortes e da educação do carácter.
É que o mundo é um lugar perigoso, não por causa daqueles que fazem o mal, mas sim por causa daqueles que observam, deixam o mal acontecer e não protegem, não defendem nem preparam as novas gerações para enfrentarem com segurança e saber todas as vicissitudes e armadilhas que a vida lhes prepara, deixando-os ficar à mercê do ambiente, num abandono irreversível e num desamparo de ausência de protecção e reforço familiar.
Susana Mexia
Professora
(**) João César das Neves, “Portugal, esse desconhecido”, D. Quixote, pp 165,167.