Vinte pilotos e no final… Hamilton
O maior assunto do momento não passa pelas pistas, mas tem tudo a ver com os carros que nelas evoluem. Morreu Sergio Marchionne. Muitos perguntarão: “Quem?”. Ora, Sergio Marchionne era o presidente e CEO da Ferrari e de mais uma ou duas subsidiárias do Grupo Fiat Chrysler Autmobiles. Era também o mentor da equipa de Fórmula 1 da Ferrari, esta sob o comando directo de Maurizio Arrivabene.
O falecido presidente da equipa formada por Enzo Ferrari em 1948 estava muitíssimo envolvido com tudo o que se passava ou poderia vir a passar em relação ao novo contrato da Fórmula 1, que será implementado em 2021. A sua postura face às ideias de Chase Carey, presidente da Liberty Media (a actual proprietária da categoria), era conhecida. A posição de Marchionne de desacordo em relação às propostas de Carey era radical. «Se não estivermos de acordo, a Ferrari poderá sair da Fórmula 1», disse-o mais do que uma vez. Uma ameaça a ser levada em conta!
A primeira curiosidade foi ver como a morte do presidente da Ferrari iria influenciar Carey. No entanto, ainda antes de ser saber o resultado, os cargos deixados vagos por Marchionne foram rapidamente ocupados por dois dos seus “braços direitos”. Para presidente foi nomeado John Elkann. E para CEO Louis Carey Camilleri. Ambos com larga experiência em gestão de empresas “difíceis”, sendo que estão em linha com o pensamento de Marchionne no que respeita à Ferrari. Do lado da marca de Maranello o ambiente é tranquilo e a “mensagem” foi enviada aos patrões da Fórmula 1 e às outras equipas…
ALEMANHA E HUNGRIA
Duas corridas diferentes com muito em comum. Os protagonistas de sempre, ou seja, a Ferrari e a Mercedes, deram nas vistas em ambas as provas.
Comecemos pela Alemanha. Apesar da meteorologia não o prever, a chuva esteve presente. A ponto da terceira sessão de treinos livres ter sido quase nula. Lewis Hamilton foi o actor principal na segunda sessão de qualificação. O Mercedes do piloto britânico avariou na primeira volta, pouco depois de ter saído do “pit lane”. O desespero de Hamilton foi notório, tendo saído do carro para o empurrar de volta à sua box. Três ou quatro comissários acabaram – e bem – por dissuadir Hamilton. A acção do piloto sair do carro e empurrá-lo na pista é extremamente perigosa e… ilegal.
Regressemos a 10 de Janeiro de 1971, na Argentina. Durante os mil quilómetros de Buenos Aires ocorreu um acidente mortal. O piloto francês Jean Pierre Beltoise ficou sem gasolina no seu Matra 660. Beltoise saiu do carro e empurrou-o durante mais de sessenta metros. Como estava do lado oposto às boxes, teve que atravessar a pista, enquanto empurrava o carro. Por sua vez, o piloto italiano Ignazio Giunti, no seu pequeno Ferrari 312PB, recém-abastecido na volta anterior, preparava-se para ultrapassar um outro Ferrari, bem maior do que o seu. Ao sair da traseira do adversário, Giunti embateu no Matra de Beltoise. O Ferrari 312PB explodiu e o italiano foi declarado morto no local. Desde então, tornou-se expressamente proibido – a qualquer piloto, de qualquer categoria sancionada pela FIA – empurrar um carro na pista ou nas suas imediações. Esta a razão pela qual quando um carro avaria o piloto sai do veículo e deixa os comissários colocarem o carro, de preferência, atrás das barreiras protectoras. Consequente, entra o “safety car” – real ou virtual – até que o asfalto esteja livre de problemas.
No entanto, em Hockenheim, parece que ninguém ligou muito ao sucedido. Como não repararam o carro, Lewis Hamilton viu dificultadas as suas possibilidades de vencer a corrida, pois foi relegado para o 14º lugar da grelha de partida. Sebastian Vettel, em Ferrari, conseguiu a “pole position”, tendo dominado grande parte da prova sem sobressaltos. Já Hamilton, a lutar com pneus que se degradavam rapidamente, foi ultrapassando todos os pilotos que apareciam à sua frente. A poucas voltas do fim, um pequeno aguaceiro deixou uma zona do circuito molhada, o que descompensou o Ferrari de Vettel à entrada do “estádio”. O alemão não conseguiu segurar o Ferrari e só parou nas barreiras de protecção. Algo que pode acontecer a qualquer piloto, mesmo a um tetracampeão do mundo. Hamilton venceu a corrida, chegando o britânico a afirmar que se tratou de um «milagre».
Depois da lotaria da Alemanha, os dois candidatos (reais) ao título de campeão do mundo de pilotos foram para a Hungria ainda com mais vontade de se imporem. Mais uma vez, sem que se estivesse à espera, a chuva apareceu e quase que estragava a festa. A Fórmula 2 foi a mais afectada, tanto no sábado como no Domingo. A Fórmula 1 não foi muito prejudicada, mas ainda assim houve pilotos que rolaram com pneus de chuva.
A “pole position”, disputada ao milésimo de segundo, acabou nas mãos dos dois Mercedes, com Hamilton a surpreender Valtteri Bottas por uma margem só possível de verificar através dos modernos cronógrafos electrónicos. Vettel, Hamilton, Kimi Raikkonen e Bottas foram os actores secundários de um filme que teve Daniel Ricciardo como actor principal. Vettel perdeu a liderança devido a um problema na troca de pneus, que o fez perder muito tempo. Bottas teve um comportamento estranho, embatendo em Vettel, que estava a andar muito mais que o Mercedes. O Ferrari número 5 perdeu algumas peças da aerodinâmica do carro. Não satisfeito, Bottas voltou a colidir com o piloto australiano da Red Bull, o que não impediu Ricciardo de subir ao quarto lugar. Se bem que, muito provavelmente, ambas as colisões de Bottas tenham sido furtuitas, os comissários acharam por bem impor-lhe uma penalização de dez segundos. Contudo, manteve a sua posição na classificação da prova pois encontrava-se a mais de vinte segundos de Pierre Gasly (Toro Rosso). Sem muita publicidade, nem festejos, a Honda parece ter acertado com os seus motores de Fórmula 1, com os dois Toro Rosso-Honda a realizarem boas prestações.
Teoricamente, a Fórmula 1 vai agora de férias, como muitos de nós… mas na prática não é bem assim. Apenas os pilotos e um ou outro elemento das equipas vão de férias. A “Silly Season” já não é o que era. Já não se ouvem os boatos e fofocas de um passado recente. Hoje, as condições de cada um dos pilotos, dos membros das equipas e mesmo de alguns “engenheiros” estão previamente estabelecidas, e já se sabe quem vai para qual equipa, quando e quanto vai ganhar. O grosso do “staff” fica a trabalhar horas a fio, com o objectivo de ganhar aqueles milésimos de segundo que farão a diferença no agendado regresso às pistas. O recomeço tem lugar na Bélgica, no mítico Circuito de Spa Francorchamps, a 26 de Agosto.
No próximo artigo faremos um resumo do que foi acontecendo desde a Austrália até ao passado fim-de-semana na Hungria.
Manuel dos Santos