Filosofia, uma dentada de cada vez (48)

O que a liberdade tem a ver com responsabilidade?

Definimos a liberdade como a capacidade de fazer escolhas conscientes e inteligentes. É essa a forma como configuramos as nossas vidas. Essa é a forma como crescemos.

Deixem-nos falar sobre as consequências das escolhas conscientes e inteligentes. Depois de ter escolhido de entre uma variedade de escolhas possíveis, depois de ter sopesado cada possível escolha, estou consciente de que eu é que escolhi, e que a escolha foi minha, a acção foi minha. O facto de ter escolhido uma acção fez de mim o “dono” (responsável) dessa acção, e não qualquer outra pessoa. É por isso que digo muitas vezes que, ao escolher algo, essa liberdade traz-nos posse; faz de nós os donos das nossas acções.

E porque é que tal é importante? Suponhamos que tenho um carro. E porque o possuo devo cuidar dele. Eu sou responsável por ele. A posse (direito de propriedade) acarreta responsabilidade.

Sendo assim, se uma acção é minha, eu sou responsável por essa acção e pelas consequências que acarrete.

Acontece que o carro não é tão bom como eu esperava – basicamente culpar-me-ei pela má escolha. Oh sim, eu poderia (como algumas pessoas fazem) passar as culpas para a pessoa que me convenceu a comprá-lo. Algumas pessoas dizem que as nossas escolhas são consequências necessárias da “natureza”, da forma como fomos feitos (os nossos genes), ou da forma como nos criaram. Há psicólogos que debatem acerrimamente sobre qual destas duas opções é que nos influencia. Na realidade, ambas influenciam, mas os psicólogos erram pelo simples facto de não levarem em conta um terceiro factor: a escolha livre.

Se as nossas acções fossem apenas resultado da natureza ou da maneira como fomos criados, então nunca assumiríamos uma responsabilidade pessoal pelas nossas acções. Passaríamos sempre a responsabilidade para os outros.

O conceito correcto de liberdade é absolutamente necessário para uma educação e formação efectivas. Uma pessoa cuja vontade tenha sido substituída pela de um seu superior ou professor, a quem sempre foi dito “faz o que eu digo”, é uma pessoa a quem nunca foi ensinado o que é a liberdade. Mas porque nunca aprendeu o que significa fazer escolhas conscientes e inteligentes, também nunca aprenderá a ser responsável pelas suas próprias acções.

Algumas pessoas poderão objectar: “Mas ele cometerá erros!”. Naturalmente que sim, cometê-los-á. A maioria de nós aprendemos apenas depois de termos cometido erros. Os erros ensinam-nos lições, lições inesquecíveis. Essas lições ajudam-nos a fazermos escolhas mais inteligentes no futuro.

Deixem-nos conduzir esta discussão a um nível mais elevado.

Deus quer-nos no Paraíso. E para isso Ele deu-nos um manual de instruções (os Mandamentos). Mas os Mandamentos requerem escolhas livres. Deus deseja-nos livres. Porquê?

Quando temos que escolher entre uma boa acção e uma má acção, essa escolha traz-nos mérito (se escolhermos a boa acção) ou culpa (se escolhermos a má acção). O mérito traz-nos recompensa, e a culpa, punição.

Deus deseja recompensar-nos. Mas para o fazer temos que merecer a recompensa. Merecer a recompensa implica que reconheçamos as acções como nossas (que aceitamos a responsabilidade do que fazemos). Mas a acção só pode ser considerada como nossa se for feita de livre vontade. Recompensa implica mérito, mérito implica propriedade, e propriedade implica liberdade. Onde não houver liberdade, não há posse; se não há posse, não há mérito; onde não há mérito, não há recompensa.

A título de exemplo, voltemos à analogia do carro.

(1) Suponhamos que entrei numa corrida de carros. Suponhamos que o meu carro ganhou. Bom! Como o carro é meu, recebi uma recompensa. Propriedade – boa acção – mérito – recompensa.

(2) Suponhamos que um dia, ao conduzir o meu carro, choquei contra outro carro. Mau! Como o carro que causou o acidente é meu, sou responsável pelos danos. Sou culpado, sou castigado. Propriedade – má acção – culpa – punição.

Pe. José Mario Mandía

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