Filosofia, uma dentada de cada vez (27)

O que é uma Mudança Substancial?

Quinhentos anos antes de Cristo, quando os gregos começaram a observar o mundo que os rodeava, uma das primeiras coisas que verificaram foi o facto de que, se por um lado as coisas mudavam, também existia permanência (a ausência de mudança).

Numa tentativa para simplificar o problema, dois filósofos decidiram explicar o mundo, mas as suas teorias eram radicalmente opostas uma da outra.

Heráclito (535-475 a.C.) disse que não havia a noção de permanência no mundo. Neste mundo tudo era mudança, tudo se encontrava no estado de “acontecer” e que não existia um estado de “ser”. «Nenhum homem caminhará pelo mesmo rio (caminho) duas vezes, porque (já) não será o mesmo rio (caminho) e ele já não será o mesmo homem», defendeu.

Parménides (515-445 a.C.) discordava de Heráclito e seguiu um rumo oposto. Parménides dizia que as mudanças não podiam acontecer. Para ele, “ser” era existir, “não-ser” era não existir, e não havia nada de permeio (ser ou não-ser): existiam apenas o estado de ser, ou de não-ser, e não havia o conceito de “acontecer”. Ex nihilo nihil fit – do nada, nada pode surgir (nada aparece do nada) – pelo que não podia haver forma de que um ser pudesse ter sido feito ou criado de um não-ser, argumentava Parménides. Mas nenhum ser podia deixar de existir: um “ser” não podia tornar-se num não-ser. O mundo sempre esteve ali, e sempre estará: ele é eterno.

A nossa experiência normal diz-nos que algo está errado nestas duas teorias.

Tal como Heráclito defendia, encontramos mudanças no mundo. Mas, também ao contrário do que o filósofo afirmava, vemos que nem tudo muda a todo o momento. Também verificamos a existência de “permanência”. Concordamos com Heráclito que o mundo é “acontecer”, mas acrescentamos que também existe o “ser”.

Parménides acentuava – e bem! – que ser É, não-ser Não É. No entanto, também verificamos que é possível que passe a existir algo que não existia; algo como vocês e eu. Há alguns anos, vocês e eu não existíamos. Éramos não-seres. Neste momento, vocês e eu existimos. Também algo que exista agora é possível que deixe de existir no futuro. Nada no mundo é para sempre.

Aristóteles resolveu este problema da seguinte forma: Em todas as mudanças algo fica e algo vem ou vai. Além disso, Aristóteles fez a distinção entre dois tipos de mudança: a mudança acidental e a mudança substancial.

Já tínhamos mencionado a mudança acidental, quando falámos sobre a diferença entre substância e acidentes. Quando um homem avança na idade, quando as folhas das árvores se tornam amarelas, quando a temperatura do ar sobe, quando a água se transforma em gelo ou vapor, todas essas coisas são exemplos de mudanças acidentais. Neste tipo de mudanças, a substância permanece, mas o acidente muda.

A mudança substancial é um outro tipo de mudança. Quando a madeira arde até se transformar em cinza, quando o hidróxido de sódio reage com o ácido clorídrico e a reacção produz sal e água, quando um escultor pega num bloco de mármore e o transforma numa estátua, são alguns exemplos de mudanças substanciais. Se examinarmos este tipo de mudança, verificaremos que está acompanhado por mudanças acidentais, mas há algo mais que muda: o objecto em si. Quando se dá uma mudança substancial, algo se transforma numa outra coisa.

Mesmo numa mudança substancial algo fica e algo vai ou vem. Quando a madeira se transforma em cinza a madeira não desaparece no ar e as cinzas não aparecem de repente. A mesma observação se aplica às reacções químicas e ao escultor de uma estátua. O aspecto que fica do processo de mudança é chamado de matéria-prima, e o aspecto do que mudou é chamado de forma substancial.

Há mais da próxima vez!

Pe. José Mario Mandía

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