Podemos ser felizes fora da realidade?
Depois de algum tempo de ansiosa espera, a criança nasceu. Foi uma grande alegria. O pai estava radiante. Pegou no telemóvel e comunicou a notícia aos familiares. Deram-lhe os parabéns e perguntaram se era um rapaz ou uma rapariga. É a pergunta mais natural numa situação destas.
O pai da criança, ainda com a voz emocionada, respondeu do corredor do hospital: Nasceu rapaz. Já temos um nome para ele: vai-se chamar Fernando. No entanto, tanto eu como a Cristina respeitamos desde já a sua liberdade. Se mais tarde ele decidir mudar de género, passará a ser ela, e chamar-se-á Fernanda.
Se observarmos com calma, veremos que, nos dias de hoje, é cada vez mais habitual utilizar a palavra “género” para substituir a palavra “sexo”.
Fala-se com frequência da igualdade de género, da violência de género, do direito a escolher o próprio género. Pretende-se instaurar uma sociedade na qual todas as pessoas sejam radicalmente iguais e radicalmente livres. Na qual cada um possa escolher a sua identidade de género e a sua orientação sexual com total independência da biologia.
A natureza com a qual nascemos é vista, por alguns, como um limite à nossa liberdade. Porque é que uma pessoa tem de aceitar nascer rapaz ou rapariga?
Porque é que não pode livremente escolher? Quem é que escolheu por mim? Tenho ou não o direito de ser aquilo que quero ser? Quem me pode impedir?
Em nome desta liberdade, promovem-se leis para o matrimónio entre pessoas do mesmo sexo ou para a mudança de sexo no Registo Civil.
Todos aqueles que não concordam com isto são vistos como homófobos e intolerantes. São vistos como pessoas arcaicas que querem impor os seus valores aos outros e não respeitam o valor supremo da liberdade sem limites.
O problema é que quando nos esquecemos da verdade, a liberdade perde o seu norte e o seu sentido. E a verdade é que o sexo com o qual nascemos não depende da nossa liberdade de escolha.
Para a grande maioria das pessoas isto é evidente. No entanto, em nome de um falso conceito de tolerância, existe no ambiente um medo real de fazer tais afirmações. São consideradas intolerantes, homofóbicas e politicamente incorrectas.
Mas a realidade continua a ser a mesma. Nós só podemos escolher – com verdadeira liberdade – a partir daquilo que somos.
Nenhum de nós escolheu existir, ser pessoa, ser livre, ser homem ou mulher. Nenhum de nós escolheu o dia do seu nascimento nem os seus pais.
Estas condições iniciais da nossa biografia não foram escolhidas – são a natureza com a qual nascemos.
Podemos revoltar-nos contra a realidade e procurar viver como se ela não fosse assim. O que não podemos é evitar que essa revolta passe a sua factura.
Uma factura que nos impede de ser genuinamente felizes. Porque a própria vida nos demonstra que não há verdadeira felicidade fora da realidade.
Pe. Rodrigo Lynce de Faria
Doutor em Teologia