Saber medir as nossas palavras
Estávamos os três a tomar uma cerveja. A esplanada, quase vazia. Depois de um dia extenuante de trabalho, logicamente, o cansaço fazia-se notar.
De repente, um deles fez ao outro uma pergunta indelicada, com uma certa ironia e até violência. Mais do que perguntar, parecia que estava a brincar com uma atitude que não entendia.
Instintivamente, fiquei à espera de uma resposta à altura das circunstâncias – mas ela não veio. Pelo contrário, a contestação foi cordial e sem azedume.
Fez-me pensar.
Aquela pessoa levava consigo o seu próprio ambiente. Um ambiente que não dependia de circunstâncias nem de provocações. Podendo fazê-lo – por uma questão de estrita justiça – não tinha devolvido o mal com o mal. Demonstrava com isto um senhorio de si próprio fora do comum.
Ao outro só restavam duas opções: pedir desculpas pelo modo como tinha abordado o assunto ou fingir que nada tinha acontecido. Escolheu esta última por ser a mais cómoda, e – pensava ele erradamente – a menos humilhante.
Que diferença tão grande de nível humano em duas pessoas com a mesma profissão!
O meu amigo cordial tinha um tom humano impressionante. Um tom que facilitava o relacionamento mútuo, que fazia com que os outros se sentissem bem ao seu lado.
Sabia estar com todos e irradiava à sua volta um ambiente agradável, de profunda dignidade. Oferecia uma amizade sincera – sem ocultar a sua identidade de cristão coerente por medo a ser rejeitado. E foi devido a essa sua coerência que a pergunta irónica tinha surgido.
Ao fazer-lhe ver a minha admiração pelo modo como tinha actuado, respondeu-me:
«– Não há caridade sem respeito, e não há respeito se não sabemos medir as nossas palavras».
Saber medir as nossas palavras. Quantas vezes ferimos os outros porque não sabemos medir as nossas palavras!
Isso não é hipocrisia nem falta de sinceridade – é simplesmente respeito. É capacidade de nos pormos na situação dos outros e descobrir que não gostaríamos que nos falassem desse modo.
Dizer o que pensamos, sem pensar no que dizemos, é uma atitude bastante irresponsável. É como atirar uma pedra pela janela sem preocuparmo-nos com os estragos que possa provocar.
Cuidar o modo como dizemos as coisas não é um pormenor de pouco valor. Quantas vezes, tendo alguma razão, a perdemos não por aquilo que dizemos, mas pelo modo como o fazemos. Há muitos modos de dizer a mesma coisa e não é necessário tornar a verdade antipática a ninguém.
A verdade é como uma flor. Não é a mesma coisa oferecê-la a alguém ou esfregá-la na sua cara. A segunda atitude não é mais sincera – mesmo que alguns nos tentem convencer do contrário!
Pe. Rodrigo Lynce de Faria
Doutor em Teologia