Macau à volta da mesa
É curioso como acabamos por encontrar pessoas relacionadas com Macau em todo o lado. Na recente incursão pelo Algarve com o nosso conceito “thai street food” acabámos por reunir três pessoas que em momentos diferentes da sua vida passaram pelo antigo território português. Mas a história deste encontro casual começou bem antes.
Nos meses de Inverno, quando estávamos estacionados em Mira, fomos contactados por um casal do Norte de Portugal que diz ser apaixonado por comida e que por essa faceta mantém uma página de Facebook e viaja – sempre que pode – para conhecer novos conceitos. Ao saber da nossa carrinha de comida tailandesa, não hesitou em aproveitar uma ida a Mira por ocasião de um encontro de música sacra que se realiza anualmente na vila. Apareceu um dia à noite (chovia), quando já pensávamos encerrar para regressar para casa. Veio por duas vezes e escreveu uns comentários bem elogiosos sobre a nossa comida. Agora em Julho, ao chegarmos a Portimão, qual não foi a nossa surpresa ao vermos o mesmo casal, que nos esperava com o intuito de serem os primeiros clientes. Comeram, falaram e seguiram para a carrinha seguinte.
Passado algum tempo, quando tive de falar com a responsável pela organização e coordenação do evento que precedeu o de Portimão, em Lagos, reparei que estava na conversa com o referido casal. Interrompi para falar com a Maria, a responsável do evento de Lagos, e foi quando a Nínu, a tal cliente do Norte, perguntou surpreendida se nos conhecíamos. Palavra puxa palavra e veio Macau à conversa, ficando eu a saber que era amiga de longa data da família da Maria e que se conheciam desde os tempos de Macau! Fiquei a saber que a Maria é sobrinha de Nuno Silva Ramos, antigo jornalista da Rádio Macau, e filha de Miguel Lemos, antigo director do Gabinete de Comunicação Social. A Nínu era amiga da família, juntamente com o ex-marido, Jorge Pêgo.
Ficámos todos surpreendidos, tanto que a Maria (Nobre de Carvalho) aprontou-se a tirar uma fotografia connosco, para partilhar no seu grupo de família no WhatsApp e ver se alguém da sua família reconhecia os três presentes.
A Maria nasceu em Lisboa e mudou-se para Macau em 1986, quando os pais para ali foram. Estudou no território até 1992, ano em que regressou a Portugal com a família. A vida em Macau traz boas recordações, fruto de uma vivência forte no Hoi Fu. Ainda se lembra do tio (Nuno Silva Ramos) chegar a Macau em 1988 ou 1989 e dele ficar mais uns anos após ela e os pais terem regressado a Portugal. Quanto à nossa cliente do Norte, a Nínu, guarda recordações das idas ao Grande Prémio e de outros encontros dos quais tem imensas fotografias.
São estes encontros fortuitos que nos deixam de coração cheio. De pessoas quase desconhecidas passamos a ser bons amigos, com experiências em comum que ajudam a cimentar amizades, muitas vezes para o resto da vida.
Mais tarde, durante o evento em Portimão, a Maria veio falar connosco e chegou mesmo a manifestar-se envergonhada por não ter chegado à conclusão que eu e a NaE somos o casal que o tio tanto lhe falou. O tal casal de Macau, luso-tailandês, que havia comprado um veleiro para dar a volta ao mundo, mas que devido a contratempos da vida estava agora em Portugal, tendo criado um conceito de comida de rua tailandesa. Convivi alguns anos com o Nuno, penso que estava ele na Rádio Macau e eu no Jornal Tribuna de Macau ou no Hoje Macau.
Quando iniciámos a nossa vida a bordo do Dee fiquei a saber mais sobre a família Silva Ramos e a sua ligação aos barcos. A família é numerosa e um dos irmãos do Nuno fugiu de Angola, nos anos oitenta, a bordo do Tartan, o pequeno veleiro que tinha naquela época. Esta odisseia deu origem, há uns anos, a um livro escrito pelo Nuno e por Pedro Silva Ramos. O relato emocionante intitula-se “Tartan: As velas da Liberdade” e relata todo o processo desde a saída – às escondidas – de Angola, à navegação costeira com um rádio a pilhas, para irem sintonizando as estações de rádio e assim saberem onde estavam ao longo da costa africana, até à chegada a território português.
O irmão do Nuno, o Pedro, agora a viver em Palma de Maiorca, fez do seu barco a sua casa em Portimão e sempre foi uma pessoa muito ligada à vela e a tudo o que está relacionado com o mar.
Há no Algarve um movimento de solidariedade que tem como objectivo ajudar pessoas com deficiência a praticaram vela, o “Vela Solidária”, projecto no qual os membros da família Silva Ramos sempre estiveram muito activos.
Na próxima semana irei falar de outra pessoa ligada a Macau que acabámos de conhecer. Trata-se de uma pessoa da família Leitão, um neto de uma refugiada de Xangai.
João Santos Gomes