O Pentecostalismo – XI
Mas quantos são os pentecostalistas actualmente, nas suas várias denominações e na sua distribuição no mundo? Qual a fidelidade ao Pentecostalismo inicial do movimento da Rua Azusa, qual a observância ou afastamento dos que seguem algum dos credos que dali derivaram? E a grande questão que se põe, qual a relação entre o Pentecostalismo e a política, o Estado e a sociedade nos dias de hoje?
David Barrett, um carismático cristão pentecostal americano, referiu em 1995 que existiam então 217 milhões de “Pentecostais Denominacionais” em todo o mundo. Em 2011, um relatório do grupo de estudos americano especializado em religiões e particularmente no Cristianismo global, o “Pew Research Center”, revelou que essa estatística pentecostal se poderia cifrar em cerca de 279 milhões de pentecostais clássicos, constituindo quatro por cento da população mundial total. Cerca de 12,8 por cento da população cristã mundial seria, assim, pentecostal. Este estudo definiu o que se consideram como “denominações historicamente pentecostais” (uma categoria que não incluía igrejas pentecostais independentes ou dissociadas) como a maior família denominacional protestante.
A maior percentagem de pentecostais na actualidade acha-se na África Subsaariana (44 por cento) seguida pelas Américas (37 por cento) e Ásia e Pacífico (dezasseis por cento). A Europa tem perdido fiéis e conta hoje com uma pálida amostra das cifras de meados do Século XX. Muitos analistas consideram que o movimento pentecostal é hoje um movimento globalmente do “Sul”, ou do mundo menos desenvolvido, tropical dizem outros autores. África, América Central e Latina, além de boa parte da Ásia constituem o alfobre mais prolífico de novas gerações pentecostais, com efeito.
AS DENOMINAÇÕES PENTECOSTAIS
Existem 740 denominações pentecostais reconhecidas, mas há que recordar que o movimento tem também um número significativo de igrejas independentes que não estão organizadas em denominações. Entre as mais de setecentas denominações pentecostais, 240 são classificadas como parte do Pentecostalismo dito wesleyano, de santidade pessoal ou “metodista”. Até 1910 o Pentecostalismo era universalmente wesleyano na doutrina: o Pentecostalismo da Santidade, por exemplo, continua a predominar no Sul dos Estados Unidos. Os pentecostais wesleyanos, note-se, ensinam que há três experiências de mudança ou choque dentro da vida de um cristão: a conversão, a santificação e o baptismo espiritual. De acordo com os pentecostais wesleyanos, toda a santificação é um evento definitivo que ocorre após a salvação, mas antes do baptismo espiritual. Essa experiência interior purifica e permite que o crente viva uma vida de santidade externa. É como que uma limpeza pessoal que prepara o crente para receber o baptismo no Espírito Santo. As denominações pentecostais de santidade, de matriz wesleyana, portanto, incluem a Igreja de Deus em Cristo, a Igreja de Deus (Cleveland e Tennessee) e a Igreja Pentecostal da Santidade.
Na sequência da pregação do teólogo e missionário americano William H. Durham (1873-1912) em torno da sua doutrina da “Obra Consumada” (ou “Trabalho Acabado”, “Finished Work”), iniciada em 1910, muitos pentecostais começaram a rejeitar a doutrina wesleyana de total santificação. Começaram então a ensinar que havia apenas duas experiências de choque/crise definidas na vida de um cristão: a conversão e o baptismo espiritual. Estes pentecostais da “Obra Consumada” (também conhecidos como pentecostais “baptistas” ou “reformados”, pois muitos dos convertidos provinham de igrejas baptistas e presbiterianas) ensinam que uma pessoa é inicialmente santificada no momento da conversão. Após a conversão, o crente cresce em graça através de um processo de santificação progressiva ao longo da vida. Existem 390 denominações que seguem esta doutrina da “Obra Consumada”. Entre elas, incluem-se as Assembleias de Deus, a Igreja do Evangelho Quadrangular e as Igrejas da Bíblia Aberta.
Para percebermos esta via da “Obra Consumada” de Durham, importa reflectir que naquela época, em finais da década de 1910, a maioria das igrejas pentecostais defendiam a doutrina wesleyana da santificação, que ensinava a santificação como a segunda obra da Graça, sendo o baptismo no Espírito Santo a terceira obra da Graça. Porém, Durham, como não aceitava tal doutrina, começou a ensinar a “Obra Consumada”, no Calvário, completava ele, segundo a qual o cristão é santificado em Cristo no momento da conversão e deve a partir de então manter progressivamente um estado de santificação. Mas não foi fácil. Naquela época, Durham enfrentou uma grande resistência da parte de vários sectores importantes do Pentecostalismo. A sua doutrina da “Obra Consumada” no Calvário teve importantes detractores, como os próprios William J. Seymour e Charles F. Parham, entre outros importantes líderes pentecostais da fundação, líderes estes que continuaram a defender a doutrina wesleyana da santificação.
Por outro lado, na Europa, o já referido Renascimento Galês de 1904-1905 lançou as bases para o Pentecostalismo britânico e especialmente para um agrupamento distinto de denominações conhecido como Pentecostalismo Apostólico (não confundir com o Pentecostalismo de Unicidade, ou “Oneness”, no termo original). Estes pentecostais são liderados por uma hierarquia na qual se incluem apóstolos vivos, profetas e outros cargos carismáticos. Os pentecostais apostólicos são actualmente encontrados em todo o mundo em trinta denominações, incluindo a Igreja Apostólica sediada no Reino Unido.
Existem também oitenta denominações pentecostais classificadas como Nome de Jesus ou Pentecostalismo de Unicidade (os quais muitas vezes se auto-identificam como “Pentecostais Apostólicos”). Este grupo de denominações difere dos restantes grupos dentro do Pentecostalismo de várias formas significativas. Por exemplo, rejeitam a doutrina da Trindade. Ou seja, não descrevem Deus como três pessoas, mas sim como três manifestações do Deus vivo. Estes pentecostais, do Nome de Jesus ou Pentecostalismo de Unicidade, praticam o Baptismo em Nome de Jesus – baptismos de água realizados em nome de Jesus Cristo, em vez da Trindade. Acreditam também que o arrependimento, o baptismo em nome de Jesus e o baptismo espiritual são elementos essenciais da experiência de conversão. Sustentam também que o arrependimento é necessário antes do baptismo para tornar a adesão válida, além de que a recepção do Espírito Santo manifestado na fala de outras línguas é necessário depois, para completar o trabalho de baptismo. Nestes aspectos, diferem de outros pentecostais, como aliás dos cristãos evangélicos em geral, que vêem apenas o arrependimento e a fé em Cristo como essenciais para a salvação. Todas estas formas diferentes fizeram com que os crentes da Unicidade fossem acusados por alguns (incluindo outros pentecostais) de uma soteriologia de tipo “obra-salvação”, uma acusação que, no entanto, negam de forma veemente. A Unicidade pentecostal insiste, por seu lado, que a salvação vem precisamente pela graça através da fé em Cristo, juntamente com a obediência ao seu mandamento para ser “nascido da água e do Espírito”; logo, nenhuma boa obra ou obediência às leis ou regras pode salvar por si só qualquer um. Para eles, o baptismo não é visto como uma “obra”, mas sim o meio indispensável que o próprio Jesus forneceu para se entrar no seu Reino. As principais igrejas da Unicidade Pentecostal incluem a Igreja Pentecostal Unida Internacional e as Assembleias Pentecostais do Mundo.
Além das igrejas pentecostais denominacionais, existem muitas igrejas pentecostais que optam por existir independentemente da supervisão denominacional. Algumas dessas igrejas podem ser doutrinariamente idênticas às várias denominações pentecostais, enquanto outras podem adoptar crenças e práticas que diferem consideravelmente do Pentecostalismo clássico, como as que seguem os ensinamentos da Palavra de Fé ou a teologia do Reino Agora. Alguns destes grupos têm sido bem-sucedidos no uso dos “massa media”, especialmente a televisão e a rádio, na difusão da sua mensagem.
Vítor Teixeira
Universidade Fernando Pessoa