Adventistas do Sétimo Dia – I
Vamos começar um capítulo novo, sobre os Adventistas do Sétimo Dia. Uma importante denominação cristã, de origem norte-americana. Um Adventista do Sétimo Dia é assim, genericamente, um membro de uma das Igrejas Cristãs Protestantes, com origem nos Estados Unidos, em meados do Século XIX, e que se distinguem pela sua ênfase na crença de que o retorno pessoal e visível de Cristo em glória (ou seja, a Sua segunda vinda) está próxima – crença que é até compartilhada por muitos cristãos. Embora a maioria dos grupos adventistas permaneça relativamente pequena, a Igreja Adventista do Sétimo Dia tornou-se um corpo global significativo, com congregações em mais de duzentos países e cerca de quinze milhões de membros.
O Adventismo está em si mesmo enraizado nas expectativas milenaristas plasmadas na Bíblia. A partir do seu estudo bíblico, os Adventistas passaram a acreditar que, na Sua segunda vinda, Cristo separará os santos dos ímpios e inaugurará o seu reino milenar (por mil anos). A ênfase dos Adventistas na Segunda Vinda levou até muitos deles a predizer a data da sua ocorrência.
O DESPERTAR DO ADVENTISMO
Foi durante o Segundo Grande Despertar (revival) religioso que animou o território americano (principalmente nas fronteiras), no início do Século XIX, que William Miller (1782-1849), cujas especulações estão na origem do movimento adventista, começou a pregar as suas ideias e interpretações bíblicas. Mas do que é que falamos, afinal?
Trata-se de despertares religiosos. São pelo menos quatro, um no início do Século XVIII, depois este Segundo Grande Despertar, entre 1795 e 1835, e outros de que também falaremos ulteriormente. São reavivamentos religiosos protestantes nos Estados Unidos, que ocorreram ciclicamente e deram origem a denominações cristãs dentro do Protestantismo, ou a movimentos desalinhados. Durante este segundo reavivamento, ou renovação, foram realizadas várias reuniões em pequenas e grandes cidades em todo o País, e muitas de forma campal, como sucedeu nos alvores do Protestantismo na França (Calvinismo).
Muitas denominações cristãs experimentaram então um grande aumento no número de membros, particularmente entre as igrejas Metodistas e Baptistas. O Segundo Grande Despertar fez da conquista de almas a principal função do ministério, estimulando também várias reformas morais e filantrópicas, bem como as bases da emancipação das mulheres. Sendo geralmente considerado menos emotivo e retumbante que o Grande Despertar do início do Século XVIII, esta segunda onda de revivalismo evangélico levou à fundação de várias faculdades e seminários de Teologia e à organização de sociedades missionárias em todo o País.
O Segundo Grande Despertar pode ser dividido em três fases. A primeira fase (1795-1810) foi associada às reuniões campais de fronteira conduzidas pelos pregadores americanos James McGready, John McGee e Barton W. Stone, em Kentucky e no Tennessee. A segunda e mais conservadora fase deste despertar (1810-1825) centrou-se nas igrejas Congregacionais da Nova Inglaterra, sob a liderança dos teólogos Timothy Dwight, Lyman Beecher, Nathaniel W. Taylor e Asahel Nettleton. A terceira e última fase (1825-1835) resultou das actividades do evangelista Charles Grandison Finney, que começou o seu projecto de renovação em pequenas cidades no oeste do Estado de Nova Iorque na década de 1820, mas acabou conduzindo reuniões revivalnas maiores cidades dos Estados Unidos e também na Grã-Bretanha.
Durante o Segundo Grande Despertar, em muitas denominações, a teologia reavivalista transitaria do Calvinismo para o Arminianismo, mais prático, à medida que os pregadores enfatizavam a capacidade dos pecadores de tomarem uma decisão imediata para a sua salvação; diferenças teológicas que, diga-se, quase desapareceram entre as igrejas evangélicas. A ele voltaremos, mas por Arminianismo entenda-se uma escola de pensamento soteriológico (doutrina da salvação), baseada nas ideias do calvinista holandês Jacobus Arminius (1560-1609) e nos seus seguidores históricos, os Remonstrantes.
Retomando o Grande Despertar, recordemos que sob a égide de Finney surgiu uma justificação para técnicas de reavivamento espiritual cuidadosamente planeadas. Depois de 1835, um corpo irregular de especialistas profissionais em reavivamento viajou pelas localidades e cidades da América do Norte e da Grã-Bretanha, organizando reuniões anuais de renovação a convite de pastores locais que queriam revigorar mais as suas igrejas. Embora muitos protestantes americanos tenham perdido o interesse no revivalismo na primeira metade do Século XX, os reavivamentos em experiências campais, bem como os reavivamentos anuais nas igrejas no Sul e no Midwest, continuariam a ser uma característica importante da vida da igreja protestante e da sua renovação.
O Segundo Grande Despertar foi estimulado pela fundação de muitas Sociedades Bíblicas que tentavam resolver o problema da falta de Bíblias a preços acessíveis. Acabou também por promover o surgimento de outras sociedades, note-se. A disseminação de Bíblias permitiu que muitos, num espírito muito protestante, que não tinham uma, pudessem comprá-la e estudá-la em vez de apenas ouvir a sua pregação, na interpretação de outrem, o que levou ao estabelecimento de muitos movimentos de reforma destinados a remediar os males da sociedade antes da prevista Segunda Vinda de Jesus Cristo. Muitos movimentos religiosos minoritários formar-se-iam a partir das igrejas Congregacional, Presbiteriana, Baptista e Metodista. Alguns desses movimentos sustentavam crenças que mais tarde vieram a ser adoptadas pelos Adventistas do Sétimo Dia.
O interesse pelas profecias foi despertado entre alguns grupos protestantes após a prisão do Papa Pio VI, em 1798, pelo general francês Louis Alexandre Berthier, que o levou cativo para Valence, em França, onde viria a falecer. Os precursores do movimento adventista acreditavam que esse evento marcou o fim da profecia de mil 260 dias do livro de Daniel. Mas certos grupos começaram a ponderar depois em torno da profecia dos dois mil e 300 dias (“duas mil e trezentas tardes e manhãs”, depois o santuário será restaurado), revelada na segunda visão em Daniel 8,14. O interesse pela profecia também fez o seu caminho na Igreja Católica Romana, quando um padre jesuíta exilado, chamado Manuel de Lacunza (1731-1801), escreveu um manuscrito (de 22 páginas, que viria a ser publicado, postumamente, em 1811, em 3 tomos), intitulado “A vinda do Messias em Glória y Majestade, observações de Juan Josafat Ben-Ezra” (seu pseudónimo), em que renovava o interesse pela Segunda Vinda de Cristo. A publicação causou entusiasmo e reanimou a exegese bíblica e a profecia, mas também agitação, tendo acabado por posteriormente condenada pelo Papa Leão XII, em 1824.
Vítor Teixeira
Universidade Católica Portuguesa