Os Mórmons – XIV
Um dos assuntos mais recorrentes quando se fala dos Mórmons são as suas finanças. Muitos consideram a igreja Mórmon como a igreja mais rica da América, per capita. A igreja não divulga as suas finanças, mas têm sido efectuadas tentativas, simulações, para se estimar as suas receitas e activos. São estimativas, aproximações, mas por mais “baixo” que sejam, os resultados são sempre impressivos em termos de valores.
Em 1997, a revista Timeestimou que os activos da igreja totalizaram “um mínimo de trinta biliões [mil milhões] de dólares”. Num outro trabalho, de 1999, de dois autores norte-americanos, Richard e Joan K. Ostling, “Mormon America”, apresenta-se uma estimativa “conservadora” dos activos totais, 25 a trinta mil milhões de dólares, mas com a observação de que provavelmente seria “muito para além disso”. Embora a igreja tenha criticado os cálculos da Time, classificando-os como excessivos, de acordo com os Ostling “não forneceu nem mesmo as mais vagas explicações sobre o que estaria errado e o que poderia ser a verdade”…
Na sua base, o crescimento financeiro da igreja Mórmon foi alimentado por “impostos sagrados”, ou seja, o dízimo. Para gozarem de uma boa reputação, todos os Mórmons devem doar o dízimo à igreja, ou seja, dar dez por cento dos seus rendimentos brutos. A pesquisa dos Ostling concluiu, neste sentido, que a receita anual do dízimo, em meados da década de 1990, rondaria, provavelmente, entre 4,25 e 5,3 mil milhões de dólares.
Mas nem todos os Mórmons pagam o dízimo, apesar de ser um requisito importante para o templo permitir que os fiéis o frequentem e desenvolvam a sua fé. No entanto, a percentagem de membros que pagam o dízimo é muito alta, provavelmente bem acima de sessenta por cento, com dízimos muito variáveis, mas gerando copiosas receitas, segundo todas as fontes consultadas, apesar da igreja não apresentar contas.
AS FINANÇAS DOS MÓRMONS
A igreja administra também uma grande quantidade de investimentos comerciais, principalmente através do seu conglomerado empresarial, “Deseret Management Corporation”. Os Ostling estimam que a receita dessas empresas ultrapasse os seiscentos milhões anuais, com inúmeras participações financeiras. Referem no seu título que os empreendimentos mórmons vão desde uma seguradora que vale mais de 16 mil milhões de dólares a talvez mais de seis mil milhões em acções e títulos, se não mesmo mais. Detêm ainda uma rede de estações de rádio que valem mais de 172 milhões de dólares (a sétima maior dos Estados Unidos). Além desses investimentos, a igreja tem inúmeras propriedades, mais de 150 quintas e ranchos, incluindo a maior unidade de criação de gado da América, o que a torna num dos maiores proprietários de terras do País. As suas quintas e ranchos, todos latifúndios, abrangem uma superfície total de aproximadamente 405 mil hectares (cerca de seis mil e 500 km²), ou seja, o quase o equivalente ao Estado de Delaware.
Os edifícios religiosos e propriedades da igreja, embora incluídos nas estimativas de activos, são considerados despesas e não fontes de receita. A igreja também canaliza fundos significativos para o trabalho humanitário; é talvez a única rubrica que justifica e declara, na forma de doações anuais de dezenas de milhões de dólares e actividades em 147 países.
A igreja tem, contudo, uma política muito severa em relação ao uso do dinheiro. Nenhum homem ou líder eclesiástico da igreja, por exemplo, pode receber qualquer quantia em dinheiro. Todos os líderes da igreja são, segundo afirmam, voluntários, e o dinheiro a igreja é apenas usado para construção e manutenção dos edifícios e recursos materiais ou técnicos dos templos.
Apesar da igreja não divulgar o seu desempenho financeiro desde 1959, continua a ser classificada por todos os analistas e estudiosos do fenómeno religioso, como uma das mais ricas igrejas do mundo. Para demonstrar transparência e legalidade, desde 2007 que os seus fins lucrativos e entidades de ensino filiadas na igreja são auditadas por uma empresa independente, a Deloitte & Touche. Além disso, a igreja emprega um outro serviço de auditoria independente para garantir a certificação, em cada conferência geral anual, de que as contribuições mórmons são recolhidas e gastas de acordo com a política e práticas da igreja, de forma clara e sem opacidades.
O dízimo, afirmam, é a sua maior fonte de receitas, a par de doações ou legados, testamentários por exemplo. Segundo a igreja, o dízimo é canalizado para fins ligados à instituição, não sendo utilizado em empreendimentos de fins lucrativos, ou em quaisquer investimentos ou especulações. De acordo com os seus manifestos públicos, a igreja utiliza esses fundos provenientes do dízimo, por exemplo, para a construção e manutenção de edifícios e outras instalações, além da impressão das Escrituras e outros materiais para o trabalho missionário, bem como o proporcionar de bem-estar social e de assistência aos mais desamparados, tal como o apoio missionário, educacional, entre muitos outros programas patrocinados pela igreja de carácter humanitário e filantrópico. Mais: mil milhões de dólares são reservados, anualmente, para assistência humanitária a ser realizada em diversos países.
As finanças mórmons são discutidas publicamente pelos líderes da igreja. Duas vezes por ano, a igreja realiza uma conferência transmitida globalmente e depois publicada no órgão e site oficiais. Em 1985, Gordon B. Hinckley, presidente da igreja na época, respondeu a uma série de perguntas dos membros sobre finanças. Explicou então que a maior parte dos bens da igreja estão em prédios, templos, escolas, educação religiosa fornecida para estudantes universitários e adolescentes, trabalho de bem-estar, instalações genealógicas e edifícios de missão. Também ressalvou que esses “bens” não geram rendimentos, mas antes utilizam recursos. Não foram construídos para criar riqueza, mas para apoiar o trabalho da igreja e edificar e ajudar os membros. Essa é, dizia, uma forma pela qual as finanças religiosas diferem das finanças seculares.
Os Mórmons acreditam ser financeiramente responsáveis. Não são ensinados a ter riquezas, mas a serem responsáveis, a não ter dívidas e a manter economias e recursos em tempos de dificuldade financeira. Os Mórmons sabem que devem estar preparados para os momentos em que os membros não dão o dízimo suficiente para atender às necessidades da igreja, principalmente porque a igreja está a crescer em número de convertidos em países pobres. A igreja não tem dívidas, o que é quase incomum hoje, principalmente no mundo secular, o que significa que o dinheiro do dízimo não é desperdiçado em pagamentos de juros. Embora muitas igrejas construam usando dinheiro emprestado, os Mórmons garantem sempre o dinheiro antes de iniciar um projecto. A responsabilidade financeira é assim a marca das finanças mórmons, por si só superavitárias e capazes de enfrentar os desafios da igreja. Mas nem tudo parece ser assim tão simples….
Vítor Teixeira
Universidade Católica Portuguesa