CAPELA DO SENHOR DAS BARROCAS

CAPELA DO SENHOR DAS BARROCAS

Depois do restauro, a contemplação

O primeiro edifício da cidade de Aveiro a ser classificado como Imóvel de Interesse Público Nacional está, finalmente, a ser alvo de restauro e a merecer a atenção devida das autoridades responsáveis por este tipo de património.

A Capela do Senhor das Barrocas, que facilmente encontramos na Internet mas que é difícil de encontrar no local onde está edificada, data do reinado de D. João V e para quem se interessa por história e tradições merece, pois, uma visita demorada. Mas é melhor aguardar mais uns meses para que as obras terminem e se possa apreciar a sua beleza na totalidade.

Esperamos ansiosamente que a intervenção seja rapidamente concluída pelo empreiteiro para que possamos conhecer o interior da pequena capela. As poucas fotos existentes revelam tratar-se de uma obra lindíssima, sendo que as pinturas e desenhos que ostenta de vários artistas elevam-na a outro patamar. Mas, claro está, não há como ver com os nossos próprios olhos e emprestarmos a nossa atenção e percepção a cada detalhe da sua elaborada arquitectura e decoração.

Visto do exterior, o edifício é já por si imponente; é de estilo barroco joanino, no seu maior esplendor, e tal é bem visível na fachada principal e no pórtico de entrada. Todos estes conjuntos estão a ser alvo de intervenção por técnicos especializados, depois de várias décadas a deteriorarem-se com a “grande ajuda” do ar salgado, em resultado da proximidade ao mar e à Ria de Aveiro. Um trabalho demorado que irá trazer de volta o brilho original da obra, devolvendo assim à população de Aveiro um dos templos mais carismáticos da região. A primeira pedra da Capela foi lançada em Novembro de 1722, depois de vários milagres terem sido registados pelas autoridades religiosas.

A devoção ao Senhor das Barrocas está bem documentada e é bem conhecida pelas gentes locais – a par de São Gonçalinho, no bairro da Beira Mar, é a outra imagem que mais estima nutre entre os fiéis.

Esta devoção nasceu de uma imagem milagrosa que, segundo documentos da época, estava num cruzeiro no lugar das Barrocas. Hoje um grande bairro de Aveiro, outrora foi um ermo onde nada crescia, visto o solo ser barrento. Com a sucessão de milagres e de desejos correspondidos, foram aumentando os donativos dos devotos, pelo que as autoridades eclesiásticas se viram na necessidade de construir um templo que desse maior dignidade ao local e mais conforto aos peregrinos que ali se deslocavam na ânsia de ver os seus males curados.

Uma década depois do lançamento da primeira pedra foi levada a primitiva imagem para o interior da Capela, data em que a mesma foi consagrada.

A Capela é composta de duas partes: a nave (de planta octogonal) e a capela-mor (rectangular). No exterior podemos ver – se bem que agora está tudo coberto por andaimes e telas – três portais de grande aparato ornamental, dos quais o principal ostenta um sumptuoso remate decorativo nos frontões decorados com folhagem e grinaldas de pedra. No interior, ao melhor estilo barroco, cada face da nave octogonal forma um arco pleno e são também arcos de pedra que sustentam a abóbada, a qual fecha com um belo florão de madeira entalhada, a avaliar pelas fotos existentes. A completar a decoração interior estão dois retábulos de talha com pinturas de Pedro Alexandrino. Esta e outras informações podem ser encontradas na Internet, com a assinatura da diocese de Aveiro – uma forma de visitar o espaço até que seja possível fazê-lo fisicamente.

Sem grande estupefacção, considerando as semelhanças no estilo, lemos que as linhas da Capela foram desenhadas pelo mesmo arquitecto que idealizou a Biblioteca Joanina da Universidade de Coimbra. Aliás, Gaspar Ferreira deixou obra um pouco por toda a região-centro de Portugal, sendo os projectos mais conhecidos a Biblioteca Joanina e os claustros de Santa Clara-a-Nova.

O restauro da Capela do Senhor das Barrocas há muito que era pedido por várias individualidades, mais precisamente desde a primeira metade do século passado, como se pode constatar num texto da autoria de António Nascimento Leitão, datado de Julho de 1945. Dita assim a prosa: “É considerada a Capela como monumento nacional. Tanto bastará para que a respectiva Direcção lhe acuda com urgente restauro − não vá o agravamento do mal acabar em pouco tempo com o que resta de mais vulnerável desta apreciada obra de arte”. Mais de meio século depois e de muito se ter perdido à erosão, o almejado restauro chegou!

A zona onde se encontra a Capela, as Barrocas, é hoje uma das áreas residências com maior crescimento na cidade de Aveiro, o que faz com que a Capela e as artérias envolventes acabem por ficar algo escondidas e passem despercebidas ao cidadão mais apressado. Quanto aos turistas, pensamos que a maioria desconhece por completo esta obra-prima; e mesmo que soubessem da sua existência, muito dificilmente conseguiriam chegar ao local, sem se perderem uma boa dezena de vezes no emaranhado de ruas e ruelas em que se tornou a zona mais velha da cidade. No entanto, os guias mais recentes, publicados pela edilidade, contemplam informação sobre a Capela e as formas de a ela chegar mais facilmente.

Contudo, o facto de ficar algo afastada do conhecido centro – Rossio, Mercado do Peixe e Avenida Lourenço Peixinho – faz com que a Capela do Senhor das Barrocas continue a ser de certa forma “marginalizada”.

Esperamos que a revitalização da zona envolvente do Canal de São Roque, contíguo às Barrocas, contribua para que este local seja mais conhecido.

Caso o trabalho de restauro traga os resultados que todos esperam, este será uma mais-valia para a cidade de Aveiro em termos de oferta descentralizada para os turistas.

João Santos Gomes

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