Apeados em Point-à-Pitre

A primeira experiência com clientes a bordo terminou em Point-à-Pitre, na passada quarta-feira, depois de termos deixado o arquipélago de Les Saintes no dia anterior. A travessia decorreu com vento pouco favorável e, uma vez mais, o hélice ficou preso em cabos de armadilhas de pesca, enquanto velejávamos sem o motor a funcionar. O mesmo aconteceu quando fomos para Les Saintes, praticamente na mesma área. Felizmente estávamos com o motor desligado e apenas foi necessário saltar para a água e cortar os cabos. Desaconselhamos vivamente a navegação nesta zona da costa de Guadalupe. Então se for à noite o melhor é optar por águas mais profundas.

Libertados dos cabos – o que demorou apenas alguns minutos – e com o motor a funcionar, deparámos com um problema que há muito tempo se anunciava: a transmissão do motor começou a emitir um barulho fora do normal. Há vários meses que apresentava sintomas e desta vez decidiu não engatar.

Com mais de metade da distância por percorrer, com ventos pouco favoráveis e sem motor, foi necessário velejar na verdadeira acepção da palavra, orçando para bombordo e estibordo de forma a seguir numa rota mais certa e directa para a entrada da barra do porto de Pointe-à-Pitre. Apesar da aportagem não ser difícil, há do lado esquerdo um recife e correntes contrárias, pelo que se fosse inevitável entrarmos apenas com o auxílio da vela haveria que planear muito bem os movimentos. Felizmente, quando nos aproximámos da entrada, ao testarmos o motor para ver se nos ajudaria a ancorar, a caixa de transmissão resolveu funcionar – se bem que a baixa velocidade – o que facilitou a manobra de entrada e de ancoragem.

Uma distância em linha recta de cerca de 15 milhas náuticas demorou quase seis horas a ser percorrida, mas conseguimos chegar ainda durante o dia, o que permitiu jantar em terra para nos despedirmos dos jovens neo-zelandeses, que nos deixaram no dia seguinte.

Com o problema da transmissão por resolver, fui a dois mecânicos, mas acabei por regressar sozinho dado que nenhum deles estava disponível para se deslocar ao barco. Meti mãos à obra para retirar a caixa de transmissão do motor, o que me deixou surpreendido pois pensei tratar-se de algo muito complicado de executar. O maior problema foi retirá-la do compartimento do motor. O espaço entre o motor e a parede do compartimento é tão apertado que tive de desmontar o prato que segura a caixa de transmissão ao bloco do motor, de forma a que fosse possível retirá-la para o exterior. Depois de muitos cortes e arranhões acabou por sair, sendo limpa e empacotada para a levar ao mecânico.

O prognóstico foi conhecido no dia seguinte e não podia ser pior. Está completamente destruída no interior. Desde os rolamentos aos discos de embraiagem está tudo em condições de ir para o lixo. Colocou-se então a questão de como a consertar ou adquirir uma nova.

Como em tudo nos barcos, qualquer solução é sempre demorada e bastante cara. A reconstrução da transmissão, da marca Hurth, fica em milhares de euros e sem que haja a garantia de funcionar em pleno. A compra de uma transmissão nova, da mesma ou de outra marca que a possa substituir, demora dias, se não mesmo semanas, porque não há na ilha.

Na loja do mecânico onde estamos a tentar resolver o problema vendem transmissões Lombardini, mas não servem, pelo que tem de ser encomendado (em Itália) um modelo com as especificações pretendidas. Pode chegar em três ou quatro dias, mas o custo do transporte é quase tanto como o preço do equipamento…

Entretanto, descobri que em Martinica, num revendedor oficial da marca do nosso motor, há caixas de transmissão novas e usadas. Se houver uma caixa que nos sirva, o melhor será encomendar em Martinica, em vez de importar de Itália. O preço de aquisição deve ser semelhante, mas o preço de envio deverá ser menor. De qualquer forma estamos a prever uma factura acima dos mil euros, o que vem na pior altura.

Os primeiros clientes a bordo trouxeram uma nova atmosfera à tripulação e ajudaram a equilibrar o orçamento mensal. Com este gasto extra os planos foram por “água abaixo” e vamos ter de começar do zero.

Temos agora de ver como vamos resolver a situação da transmissão, pois de outro modo não podemos prosseguir a viagem. É que se ficarmos parados não conseguimos encontrar novos clientes, e sem clientes é impossível alimentar o nosso magro orçamento.

JOÃO SANTOS GOMES

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