Amigos, está tudo no roteiro

Do que estais a falar?

O capítulo 24 do Evangelho segundo São Lucas diz: «Naquele mesmo dia, dois deles (discípulos) iam a caminho de uma aldeia chamada Emmaus, localizada a cerca de sete milhas de Jerusalém, comentando entre eles tudo o que tinha acontecido (versículos 13-14)».

Uns poucos versículos depois, ficamos a saber sobre do que iam eles a falar: «De Jesus de Nazaré, que era um poderoso profeta, em actos e palavras perante Deus e todas as pessoas, e como os nossos sumo sacerdotes e governantes O tinham entregue para ser condenado à morte, e O tinham crucificado. Mas nós esperávamos que Ele fosse quem viria redimir Israel (versículos 19-21)». Essas esperanças estavam, agora, desfeitas. Eles tentavam encontrar uma lógica para tudo o que acontecera, como tinha acontecido, porque é que tinha acontecido… e o que iria ser. No entanto, quanto mais os dois discípulos falavam, maior era a angustia sentida. Apenas aumentavam mutuamente o desapontamento e a frustração um do outro.

Quando os problemas nos afligem é natural que falemos sobre eles e procuremos apoio humano. Mas, num bom número de vezes, poderemos não encontrar uma explicação, porque nós humanos temos limitações. Nós apenas aumentamos a frustração ou raiva uns dos outros.

«Enquanto eles falavam e discutiam entre eles, o próprio Jesus apareceu por perto e juntou-Se a eles. Mas os seus olhos estavam fechados para O reconhecerem (versículos 15-16)». São Josemaría Escrivá dizia muitas vezes que Cristo está sempre a cruzar-Se connosco, mas que, devido à nossa forma terrena e humana de vermos as coisas, possivelmente cegos por sentimentos de orgulho, não somos capazes de levantar os nossos olhos e sentir a Sua presença. Ele escreveu em “O Caminho da Cruz”: «Se te sentes abandonado é porque não queres olhar para esse Cristo que passa perto de ti… talvez carregando a Cruz. Simão, o Cireneu, não viu Jesus de imediato porque estava apenas a olhar para a Cruz e não para o Homem que a carregava».

Mas Jesus toma a iniciativa: «E disse-lhes: “de que estavam a conversar enquanto caminhavam?” E eles ficaram na mesma, parecendo tristes (versículo 17)».

O Mestre convida a vós e a mim para nos elevarmos do nível “natural” para o “sobrenatural”, abrindo-Lhe os nossos corações. Conversas humanas podem ajudar, mas falar com Deus é infinitamente melhor.

«Então um deles, de nome Cleofas, respondeu-Lhe: “És o único visitante de Jerusalém que ainda não sabe as coisas que têm acontecido nestes últimos dias?” E Ele disse-lhes: ‘Que coisas?’ (versículos 18-19a)».

Por vezes o Senhor pretende desconhecer o que se passa connosco. E muitas vezes esquecemo-nos que Ele sabe sempre absolutamente tudo, que «a palavra de Deus é viva e activa, mais acutilante que qualquer espada de dois gumes, perfurando até à divisão da alma e do espírito, até às juntas e à medula, reconhecendo os pensamentos e as intenções do coração. E, perante Ele, nenhuma criatura se esconde, pois todas estão abertas e nuas aos Seus olhos como nós devemos estar (Hebreus 4:12-13)». Ele convida-nos a abrirmos os nossos corações perante Ele: «E eles disseram-lhe: “O que se passou com Jesus de Nazaré… (versículo 19b)». «E eles desnudaram as almas para Ele: “Senhor tudo o que desejo é conhecer-Te, nem os meus desejos estão escondidos de Vós. O meu coração palpita. A minha força foge-me… (Salmo 38:9-10)».

«E Ele disse-lhes: “Oh homens loucos, e lentos no coração em acreditar em tudo o que os profetas disseram. Não foi necessário que Cristo tivesse que suportar esses sofrimentos para entrar na sua glória?” E começando com Moisés e todos os profetas, Ele interpretou para eles em todas as escrituras tudo o que se relacionava com Ele (versículos 25-27)». Digamos isso em linguagem corrente. «Hei, amigos, está tudo no roteiro!». Quantas vezes nós lemos o roteiro? (sim, as Escrituras) Qual é a minha disposição para Ouvi-Lo, àquele que é o meu Senhor e Salvador? Não era necessário que Cristo tivesse que sofrer? E não é necessário que os seus seguidores tenham que sofrer? Então porque estamos a resmungar tanto?

«Estavam a chegar perto da aldeia para onde iam. Pareceu-lhes que Ele pretendia continuar a sua jornada, mas eles detiveram-No, dizendo: “Fica connosco, porque já está a anoitecer, e o dia está acabado”. Assim Ele acabou por ficar com eles (versículos 28-29)».

Jesus nunca impõe a sua presença a ninguém. Ele respeita a nossa liberdade. Somos livres para dizer “sim”, livres para dizer “não”. «Vejam, chego à porta e chamo; se alguém ouvir a minha voz e abrir a porta, eu entrarei na sua casa e comerei com ele e ele comigo (Revelação 3:20)».

«Quando já estavam sentados há mesa com Ele, Ele tomou o pão e abençoou-o, partiu-o, e deu-lhes. E os seus olhos abriram-se para Ele e reconheceram-No: E ele desapareceu das suas vistas (versículos 30-31)».

Tomando, abençoando, partindo e dando. Sinais da Eucaristia. Como é que eles reconheceram Jesus? Através da Eucaristia. Onde esteja a Eucaristia, está Jesus. Onde Jesus estiver, aí estará a Verdadeira Igreja.

Todo o episódio de Emmaus fala-nos sobre o Sacrifício da Missa. O Encontro Real com Jesus acontece aí. Na primeira parte, somos alimentados com a “Tabela das Palavras” – lemos as Escrituras, e as Escrituras são-nos explicadas. Na segunda parte, somos alimentados com a “Tabela do Pão”, não de um pão normal, vulgar, mas do Pão da Vida, o próprio Jesus (ver o que São João Paulo II escreveu em Mane nobiscum, Domine, 12).

E qual foi o resultado deste encontro? «Eles disseram um para o outro: “Não nos arderam os nossos corações enquanto Ele falava connosco na estrada, enquanto nos decifrou as Escrituras?” (versículo 32)». Os seus corações brilharam com alegria e esperança. Todo aquele desapontamento e frustração anterior pareciam agora absurdas: «Fui estúpido e ignorante, portei-me como uma besta perante Ele (Salmo 73:22)».

Com a ressurreição de Cristo eles também podiam renascer. E foi o que fizeram. «E eles ressuscitaram nesse momento e regressaram a Jerusalém; e aí encontraram os onze reunidos e os que estavam com eles, que disseram: “O Senhor realmente Ressuscitou, e apareceu a Simão”. Então, eles contaram o que lhes tinha acontecido na estrada, e como Ele se lhes deu a conhecer ao partir o pão (versículos 33-35)».

Eles ressuscitaram e regressaram. Os portadores de más noticias transformaram-se em «semeadores de paz e felicidade» (São Josemaría Escrivá).

Pe. José Mario Mandía

jmomandia@gmail.com

(Tradução: António R. Martins)

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