Descaracterização em perspectiva
Alterações na programação da RDP Internacional estão a gerar polémica, levando alguns sectores da sociedade, alertados para a situação, a tomarem uma posição pública.
Fonte contactada pel’O CLARIM informa que, no início de Janeiro, o responsável da Direcção de Informação da Rádio e Televisão Portuguesa anunciou que a RDPi passaria a dar apenas notícias sobre as comunidades portuguesas, deixando de lado «a aposta na lusofonia e na projecção do prestígio e valores lusófonos, com destaque para os luso-descendentes», de resto, a imagem de marca desse canal nos últimos anos.
A decisão surge – de acordo com a nossa fonte – na sequência da recente extinção do Serviço Internacional de rádio e TV da RTP «com a sua respectiva autonomia». Assim, com a nova orientação da Direcção de Informação para a RDPi e para a redacção da RDP África, «esvazia-se o âmbito abrangente destes dois canais e, ao mesmo tempo, reforça-se a Antena 1 (em primeiro plano nas preocupações da Direcção de Informação como canal informativo e, como tal, a ser procurado por quem queira estar ao corrente da actualidade)». Aliás, à semelhança do que aconteceu à Antena 2 (cujos noticiários de cerca de dez passaram a dois) e à Antena 3, cujos espaços noticiosos foram também parcialmente afectados.
A nossa fonte lembra que a RDPi, «além da informação sobre as comunidades, que nunca deixou de dar, há alguns anos tinha alargado os seus horizontes como veículo de aspirações de comunidades de herança portuguesa», muitas delas esquecidas ou abandonadas, como as da ex-Índia Portuguesa e a de Malaca, já para não falar de Macau.
Critica, por isso, a nova hierarquia de ignorar o facto de «que há muito a RDPi tem dado atenção particular aos luso-descendentes e aos novos fluxos migratórios», o que se impôs como algo natural. Assim, a RDPi, além de ter perdido muito do seu auditório «devido à suspensão da Onda Curta, perde naturalmente muitos dos seus ouvintes da primeira geração de emigrantes, ou porque regressam e deixam de o ser ou porque alguns morrem, dada a idade avançada que já registam».
A mesma fonte considera ainda que «se está a descaracterizar a RDPi» colocando-a ao nível «dessa oca web Rádio Lusitânia», muito pouco escutada, por sinal. «Retiraram-lhe muito do seu pendor popular. Alguma da música excluída do sistema informático de emissão, dita sem qualidade, tinha de facto alguma qualidade, era de raiz popular portuguesa». Retira-se também a liberdade criativa do pivô, ao optar-se por uma “playlist”, à qual terá já um responsável definido.
A nova hierarquia da RDPi e da redacção da RDP África, «sem cuidar do estipulado nas leis, estatutos e contrato de concessão de serviço público, e nos acordos de cooperação com os PALOP e Timor-Leste», estaria também a pensar em alterar a designação dos canais.
APELO A QUEM DE DIREITO
Alguns funcionários descontentes deste serviço público lançaram, entretanto, um apelo a quem de direito, «no sentido de parar imediatamente a acção em curso», exortando figuras públicas a enviarem missivas «em defesa da RDPi» ao presidente do Conselho Geral Independente, António Feijó, ao ministro Poiares Maduro e ao presidente da RTP, Alberto da Ponte. Tudo isto «pela lusofonia, pela herança portuguesa no mundo, pelo prestígio cultural português e lusófono em geral».
Após responder afirmativamente a essa solicitação, a historiadora Maria de Deus Manso, docente da Universidade de Évora e entusiasta pelas questões da lusofonia, obteve pronta resposta de Alberto da Ponte, que justifica a polémica tomada de decisão pelo «contexto de mudança, onde as alternativas tecnológicas substituem com vantagem os modelos tradicionais de distribuição e acesso a conteúdos», pretendendo, desse modo, a RTP «assegurar que os seus públicos (Rádio e TV) possam aceder a qualquer momento e em qualquer parte do mundo, de forma não condicionada, aos conteúdos das suas emissões». Alberto da Ponte aponta, como exemplo, «o desenvolvimento de uma política de distribuição que assegura a presença das emissões internacionais de Rádio e Televisão nas redes de satélites, cabo, DTH e Internet». E conclui: «Estamos cientes da importância que tem para o país a existência de uma programação específica que chegue a todos os portugueses, e amigos de Portugal, que se encontram espalhados pelo globo».
A QUESTÃO DA ONDA CURTA
Há quatro anos a RTP suspendeu e depois encerrou a emissão em Onda Curta, medida bastante polémica que está de novo em cima da mesa. Considerado pela administração do canal público português um meio de distribuição obsoleto – «quer pela má qualidade do som recebido quer pela necessidade de semestralmente serem alteradas e comunicadas as frequências, quer pelo elevado custo da utilização e manutenção de emissores de grande potência» (palavras de Alberto da Ponte) – a Onda Curta seria, assim, perfeitamente dispensável, até porque «o sinal da RDP é retransmitido localmente em Macau, Timor, países da África Lusófona e comunidades Portuguesas através de emissores próprios de FM ou em parceria com rádios locais que emitem nas Comunidades Portuguesas e naqueles países».
Assim não entende a fonte contactada pel’O Clarim, garantindo, «com conhecimento de causa», que foram «centenas e centenas de queixas (por carta, mail, facebook, blogues, telefone e durante as emissões) feitas e dirigidas não só à RTP, como a outras entidades (em especial ao Provedor do Ouvinte, ao tempo Mário Figueiredo)». Além dessas queixas, muitos ouvintes subscreveram e comentaram a petição “Manter a Onda Curta RTP Internacional RDP Internacional”.
Por outro lado, «a garantia de qualidade da Onda Curta é de tal ordem que nenhum outro país a abandonou». Houve apenas redução por parte de alguns (caso da Alemanha) e a Espanha desistiria da sua suspensão, face aos protestos dos ouvintes.
Mais informa que «António Feijó, presidente do CGI – Conselho Geral Independente (entidade que passou a superintender aos destinos da RTP – Rádio e Televisão de Portugal), numa recente entrevista ao jornalista José Manuel Rosendo reafirmou a importância da sua reactivação». No caso de se concretizar, a emissão da RDP por Onda Curta pode ser de imediato retomada, pois basta uma informação à I.T.U (sigla inglesa para U.I.T – União Internacional de Telecomunicações). E isto porque, neste tipo de bandas, não há captivação de frequências, e o Estado Português não chegou a informar a U.I.T de que havia desistido (em definitivo) das Ondas Curtas.
Joaquim Magalhães de Castro