Depois de muito reflectirmos, tomámos a decisão de rumar a norte para mais tarde reunirmos com os amigos brasileiros. Eles irão das Antilhas Holandesas directamente para as Ilhas Virgens Britânicas. Nós estamos a caminho do mesmo destino mas ainda sem sabermos se teremos permissão de entrada, pois viajamos com um cão e a NaE tem passaporte tailandês, sendo que necessita de visto de entrada em território britânico. Embora tenha visto de longa duração para o espaço Schengen e para os Estados Unidos, a burocracia inglesa pode vir a ser um entrave. Da primeira vez que lá estivemos não levantaram problemas, mas obrigaram ao pagamento de um visto de custo elevado. Acabámos, no entanto, por não permanecer mais de 24 horas, uma vez que a verba que exigiram para a entrada do cachorro, que nessa altura não tinha toda a documentação necessária, foi exorbitante e inaceitável.
Quando começar a época das tempestades iremos em direcção às Antilhas Holandesas e ao Panamá – assim que houver dinheiro – onde atravessaremos para o lado do Pacífico.
Entretanto, deixámos a capital de Martinica, Fort-de-France, depois de esperarmos dois dias por melhores condições meteorológicas. Ainda assim, fizemos a travessia para a ilha de Dominica com ventos acima de trinta nós. Foi um bom teste para saber se a reparação do estái de proa ficou bem feita. E parece que sim, porque não partiu nem se moveu do lugar, apesar de ter sido submetido a uma pressão extrema. Cumprimos uma média de seis nós, o que para o nosso veleiro é bastante elevado. Em Dominica decidimos ficar na capital, Roseau, onde já tínhamos estado anteriormente. Desta feita, nem demos entrada (oficial) no País e passadas duas noites seguimos para a ilha seguinte, Guadalupe. A paragem em Dominica estava prevista durar um dia, mas estendeu-se por mais de 24 horas devido ao vento elevado, sempre na esperança que acalmasse, mas em vão…
As cerca de quarenta milhas náuticas que separam Roseau do arquipélago de Les Saintes, em Guadalupe, foram calcorreadas com ventos acima dos 25 nós, com o veleiro a navegar entre os sete e oito nós nas rajadas mais fortes. Foi uma viagem sem quaisquer problemas, apesar do vento ter soprado mais forte a pouco mais de cinco milhas do destino. A sensação foi mais desconfortável dado que tivemos de andar contra a corrente, tendo a ondulação chegado aos três metros de altura. O barulho do casco a bater entre as ondas e o movimento violento do barco deu para brincarmos entre nós, com o facto do casco ficar mais limpo.
Estamos neste momento em Les Saintes onde iremos ficar uns dias. Ao contrário do que tínhamos planeado, não utilizámos poita. Estavam todas preenchidas e fomos obrigados a ancorar a quarenta pés do fundo do mar. Pessoalmente não gosto desta solução porque não consigo verificar se a âncora está bem enterrada. Como até agora não nos afastámos do local, mesmo com rajadas de vento a rondar os 25 nós, deduzo que a âncora deva estar bem segura na areia. Temos a sorte de não haver outros barcos por perto, pelo que também não há o problema de chocarmos.
De Les Saintes planeamos chegar a Deshaies, uma baía enorme na costa norte, que normalmente é usada como último porto na viagem para Antiga e Barbuda. Iremos então viver novas emoções, visto que ainda não tivemos a oportunidade de visitar nenhuma ilha entre Guadalupe e Saint Maarten. Pelo caminho ficam Saba, Montserrat, Saint Kitts e Nevis, e Saint Barthelemy.
Nas últimas travessias entre ilhas voltámos a pescar, o que já não fazíamos desde Santa Lúcia. No ancoradouro em Fort-de-France não havia peixe e a água estava turva.
Poucas milhas depois de sairmos de Roseau apanhámos uma pequena barracuda, que devolvemos à água pois não gostamos do sabor. Pouco depois foi um king fish, que ficou a secar ao Sol. Será aproveitado para uma caldeirada ou para um arroz de peixe.
Já ancorados em Les Saintes apanhámos dois xaréus, com cerca de dois quilos cada, que morderam o isco artificial que lancei para a água assim que os ouvi a saltar. Estava a escrever esta crónica.
Ter peixe fresco é algo que prezamos. Não compramos peixe no mercado e muito menos congelado. Apenas comemos peixe que apanhamos ou que nos dão. Em Fort-de-France, por exemplo, ofereceram-nos seis postas de king fish, que havia sido apanhado antes da aportarmos.
JOÃO SANTOS GOMES