Patuá: nova investigação afasta origem sinítica
Se dúvidas restassem, Alexandre Lebel dissipou-as. O investigador canadiano, que na próxima semana defende na Universidade de São José uma dissertação de doutoramento na área da creolística, conseguiu provar através de uma abordagem filogenética que o Patuá é mais próximo do Kristang – e, por inerência, das línguas malaias – do que propriamente do Cantonense e de outros idiomas siníticos.
As conclusões foram na quarta-feira apresentadas por Lebel, no âmbito de um seminário sobre a gramática do crioulo português de Macau, dinamizado pelo Centro de Investigação para a Memória e Identidade Xavier, organismo da Universidade de São José liderado pelo linguista Alan Baxter. Nascido em Macau, mas criado no Quebeque, o investigador canadiano, formado em Antropologia pela Universidade de Montreal, comparou o vocabulário e as estruturas com dezenas de idiomas que integram a base de dados APICS (Atlas of Pidgin and Creole Language Structures), projecto desenvolvido pelo Instituto Max Planck de Antropologia Evolutiva que revolucionou os estudos linguísticos. A análise comparativa conduzida por Alexandre Lebel permitiu concluir que o “maquísta” tem mais em comum com o Kristang do que propriamente com o Cantonense, fazendo cair por terra a perspectiva de que o Patuá possa ser visto como um crioulo sino-português. As conclusões vão ao encontro das teorias defendidas por linguistas como o próprio Alan Baxter ou Mário Pinharanda Nunes, mas o trabalho desenvolvido por Alexandre Lebel é importante também em termos metodológicos, por deixar pela primeira vez à distância de um clique um vasto corpo de recursos em Patuá. «Recolhi todo o corpo documental existente. Estes documentos, que dizem respeito a vários tipos de fontes – arquivos, livros antigos –, são difíceis de encontrar. Aquilo que eu fiz foi organizá-los, não apenas a pensar no meu processo de investigação, mas também noutras investigações que possam vir a ser feitas no futuro. Quem quiser estudar o “maquísta” tem estes documentos todos disponíveis», explicou Alexandre Lebel, em declarações a’O CLARIM. «Pode ser um bom ponto de partida para os outros, para os ajudar a descobrir algo novo e a reforçar o corpo de material existente», referiu o investigador canadiano.
Mestre em Ambiente, também pela Universidade de São José, Alexandre Lebel defendeu que as conclusões a que a sua investigação o conduziu ajudam a clarificar a natureza do Patuá em relação ao Kristang, mas não dissipam as incertezas quer em relação à origem dos dois idiomas, quer em relação ao seu futuro. «As duas comunidades – a kristang e a macaense – ocupam posições muito diferentes em termos sócio-políticos e eu não sei até que ponto estão dispostas a interagir uma com a outra. É uma possibilidade. Mas é uma possibilidade que não me cabe a mim promover. Temos que esperar para ver o que retiram desta investigação», sublinhou o doutorando. «No caso do “maquísta”, é uma língua mas não funciona bem como língua. É mais um conjunto de práticas. O “maquísta” tem o condão de unir as pessoas (…)tem um aspecto mais simbólico», concluiu Alexandre Lebel.
Marco Carvalho