A lista VIP

A política portuguesa foi mais uma vez sacudida por mais um caso a atestar as fundamentadas incompetências, ilegalidades e fuga às responsabilidades da expressiva maioria dos nossos governantes. Mas, porque não há espaço para mais, falemos dos mais recentes.

Com a morosidade da justiça portuguesa em pano de fundo, ninguém tinha ainda perdoado os disparates da ministra da Justiça e do seu novo mapa judiciário que, com a sua nova ferramenta informática CITIUS, colocou os processos judiciais numa enorme barafunda e prolongou por mais meses o descalabro do seu pelouro porque – segundo ela – ninguém a avisou (?) que o programa não funcionava. Para a ministra, os culpados foram os informáticos. Para os investigadores judiciais, eles não foram culpados. Resultado: a ministra não assumiu e continuou a passar a bola para os funcionários.

O ministro da Educação, a braços com inúmeros problemas no seu departamento (originados por ele próprio), falhou neste ano lectivo na colocação dos professores, tendo, como consequência, atrasos significativos na abertura das aulas e na aprendizagem dos alunos. Para o ministro, a culpa foi do programa informático que não funcionou (ninguém o avisou…) e, como tal, dos funcionários, pelo que também não assumiu.

Ainda não estávamos recompostos das dívidas do Primeiro-Ministro à Segurança Social, ao tempo em que exercia actividades privadas, justificando não saber que tinha de pagar (ninguém o avisou…) e estalou mais um caso. Desta vez foi nas Finanças e na existência de uma lista confidencial de contribuintes.

Aquilo que designou como lista VIP o chefe da auditoria interna do próprio Ministério das Finanças, quando dava instruções a centenas de funcionários do referido departamento, tratava-se de uma lista selectiva de pessoas que exercem cargos públicos, financeiros e mediáticos, que não podia ser consultada sem autorização das chefias superiores do Ministério, sob pena de serem exercidos autos disciplinares imediatos aos funcionários que o fizessem. O que veio a acontecer.

Em virtude da liberdade de Imprensa (que por vezes é tão boa que nos faz esquecer quando é mal conduzida) ficámos a saber que a lista VIP da Autoridade Aduaneira (AT) existe desde Outubro do ano passado, após a investigação das contribuições do Primeiro-Ministro, no caso Tecnoforma, o que nos faz razoavelmente pensar que esta ilegalidade constitucional, tratando os contribuintes de forma diferenciada, foi pressionada pelo próprio poder. Assim, perante o escândalo e em síntese:

O secretário de Estado da AT começa por afirmar que não existe, nem existiu nenhuma lista VIP; Passos Coelho vai ao Parlamento afirmar que o secretário de Estado estava inocente e que não havia nenhuma lista; a ministra das Finanças declara «nada a declarar»; o director-geral da AT diz que «não existe, nem existiu» a lista, coloca o lugar à disposição e é despedido; o subdirector-geral não coloca o lugar à disposição e demite-se e o tal alto funcionário do Ministério, que declarou existir a lista VIP, não se demitiu, não foi demitido, calou-se ou foi…

Entretanto, veio a saber-se que este esquema da lista VIP tinha sido objecto de tratamento com autoridades internacionais (EUA) e, nesse caso, não poderia deixar de ser do conhecimento do actual secretário de Estado, pelo que o conduziu a alterar a sua primeira afirmação (não existiu, nem existe), para vir a afirmar que não tinha conhecimento (não foi avisado…).

Para o comum dos cidadãos, não excluindo outros desenvolvimentos responsáveis neste caso, o secretário de Estado da AT, ou é directamente responsável por ter ordenado a execução dessa famosa lista de protegidos, ou não controla o que se faz na sua tutela. Em qualquer dos casos a responsabilidade política é sua, pelo que deveria demitir-se imediatamente e não refugiar-se na justificação de que não tinha sido avisado da sua existência.

Quando a ponte de Entre-os-Rios caiu e o então ministro do Equipamento Social, Jorge Coelho, encarou a sua responsabilidade ética demitindo-se, o que se diria se ele, para se manter no lugar, tivesse evocado que não tinha sido avisado que a ponte ia cair!?

Luis Barreira

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