Fé renovada em tradição confinada
A diocese de Macau celebra hoje, 16 de Julho, a festa litúrgica de Nossa Senhora do Carmo. Ao que O CLARIMapurou, há pelo menos duas igrejas que vão assinalar a data: São Domingos e Nossa Senhora do Carmo, esta última na ilha da Taipa. Tanto numa como noutra igreja, as celebrações foram praticamente limitadas aos horários habituais das missas diárias, segundo explicaram ao nosso jornal o padre Daniel Ribeiro e a irmã Maria Lúcia. A razão por detrás desta decisão prende-se com a pandemia, motivo pelo qual já em 2020 os fiéis não puderam manifestar a sua devoção nos mesmos moldes dos anos anteriores. Ontem terminou tradicional a novena dedicada a Nossa Senhora do Carmo.
Ao nos debruçarmos sobre a História da Igreja, encontramos uma página marcada pelos servos do Senhor, pela dor, fervor e amor à Virgem Mãe de Deus: é a história da Ordem dos Carmelitas, da qual dá testemunho o cardeal carmelita D. Piazza: “O Carmo existe para Maria, e Maria é tudo para o Carmelo, na sua origem e na sua história, na sua vida de lutas e de triunfos, na sua vida interior e espiritual”.
A palavra “Carmelo” vem do Hebraico “Carmo” e significa “Vinha”, e “el” significa “Senhor”; portanto: “Vinha do Senhor”. Este nome remete-nos à famosa montanha na Palestina onde o profeta Elias e o sucessor Eliseu fizeram história com Deus e com Nossa Senhora, que conforme uma interpretação piedosa foi prefigurada numa pequena nuvem (1 Reis, 18,20:45).
O Monte Carmelo, na Palestina, é lugar sagrado do Antigo e do Novo Testamento. É no Monte Carmelo que a tradição colocou a origem da Ordem Carmelitana. Ali viviam eremitas entregues à oração e à penitência. Devido às perseguições dos cristãos na Terra Santa, o grupo de eremitas do Monte Carmelo acabou por deslocar-se para a Europa, estabelecendo-se em Inglaterra, onde vivia Simão, um também eremita que veio a unir-se a eles. Simão era penitente, como o profeta Elias, e austero como João Baptista. Dado a sua vida solitária na convexidade de uma árvore no seio da floresta, deram-lhe o apelido de Stock.
Já a viver com os eremitas do Carmelo, e depois de ter passado por várias dificuldades, São Simão teve a graça da sua vida e Ordem no dia 16 de Julho de 1251. Neste dia, suplicava com maior empenho à Mãe do Carmelo a sua protecção, recitando a bela oração por ele composta: “Flor do Carmelo, vinha florífera, Esplendor do céu, Virgem fecunda, singular. Ó Mãe benigna, sem conhecer varão, aos Carmelitas dá privilégio, Estrela do Mar!”. Terminada a oração, levanta os olhos marejados de lágrimas e vê a cela encher-se subitamente de luz. Rodeada de anjos, em grande cortejo, apareceu-lhe a Virgem Santíssima, revestida de esplendor – traz nas mãos o Escapulário, e diz a São Simão Stock, com inexprimível ternura maternal: «Recebe, diletíssimo filho, este escapulário da tua Ordem como sinal distintivo e a marca do privilégio que eu obtive para ti e para todos os filhos do Carmelo; é um sinal de salvação, uma salvaguarda nos perigos, aliança de paz e de uma protecção sempiterna. Quem morrer revestido com ele será preservado do fogo eterno».
A devoção ao Escapulário na História da Igreja é muito parecida com a do Rosário, constituindo-se numa das mais antigas e populares formas de devoção à Virgem Maria. Santa Teresa (reformadora da Ordem das Freiras Carmelitas, juntamente com São João da Cruz) dizia que portar o Escapulário era estar revestido com o hábito de Nossa Senhora.
AS RAÍZES
DA ORDEM CARMELITA
“Cada Ordem toma o seu nome de um lugar ou de um Santo”, escreveu João Baconthorp, carmelita inglês do Século XIV. No caso dos Carmelitas, recebem o nome devido ao Monte Carmelo, Monte da Palestina, junto do Mediterrâneo e da Baía de Haifa, pois foi aí que viveram os primeiros monges, junto da fonte de Elias.
Quanto à data do início da Ordem Carmelita, não há muita certeza e é um ponto de discussão que se tornou clássico na História da Igreja, pois é difícil de precisar. É como que um labirinto histórico onde os historiadores divergem. Por um lado, aparecem lendas piedosas sem qualquer valor histórico; por outro, há uma grande quantidade de documentos, fruto da pesquisa dos historiadores do Século XX, que provocaram um renascimento da história da Ordem. Há, no entanto, dois fenómenos marcantes nos Séculos XI e XII que interessam para a história da Ordem: o ressurgimento da vida eremítica e as peregrinações maciças à Terra Santa, conhecidas como Cruzadas.
Apesar de tudo, apontam-se duas datas certas para a origem da Ordem Carmelita – entre 1153 e 1159, Bertoldo, por inspiração do profeta Elias, dirige-se para o Monte Carmelo. Aí, com o auxílio do seu primo, o Patriarca D. Aimerico de Antioquia, constrói uma pequena capela perto da gruta de Elias e cerca as ruínas que existiam por lá. Aos poucos, cresce o número de eremitas espalhando-se por todo o Monte, que vivem separados uns dos outros em pequenas cavernas; procuram assim imitar Elias. Provavelmente em 1209, Alberto, Patriarca de Jerusalém, dá-lhes uma forma de viver concreta, escrita (Regra), e reúne-os perto da fonte de Elias, sob a obediência de um certo B (pensa-se que seria Brocardo), que é assim, de facto, o primeiro superior da Ordem. Com a Regra dada por Alberto de Jerusalém, os Carmelitas receberam a sua existência canónica.
Como em outras Ordens, também na Carmelita houve reformas. As duas mais importantes ocorreram no Século XV, após o Cisma do Ocidente, e no Século XVI, após o Concílio de Trento. Desta segunda reforma surgiram os hoje denominados “Carmelitas Descalços”.
Por ocasião dos 750 anos da revelação do Santo Escapulário, São João Paulo II exprimiu numa carta – datada de 25 de Março de 2001 – dirigida aos Carmelitas: “O Escapulário passa a ser um sinal da ‘aliança’ e recíproca comunhão existente entre Maria e os fiéis: ele traduz, de facto e de forma concreta, a entrega que Jesus, do alto da cruz, fez a João – e nele a todos nós – da sua Mãe”. São João Paulo II termina a mensagem relevando sobretudo duas verdades evocadas pelo sinal do Escapulário: a protecção contínua da Virgem Santíssima na vida e na morte, e a consciência de que a devoção a Maria não deve limitar-se a orações e homenagens devocionais, mas constituir-se num “hábito”, que é o próprio tecido da vida cristã por inteiro.
A Bem-aventurada Virgem Maria, Mãe da Divina Misericórdia, sempre estende as mãos para ajudar os seus filhos que passam por necessidades e dificuldades, em especial pela sua conversão e salvação.
Nossa Senhora do Carmo, rogai por nós!
Miguel Augusto
com Aleteia e Ordem do Carmo em Portugal
LEGENDA:
Igreja de Nossa Senhora do Carmo, na Taipa.