Natal é tempo de encontro, renovação e família
Paz, saúde, mais amizade e tolerância, mas sobretudo a dádiva do tempo e da disponibilidade para o encontro. Para milhões de pessoas em todo o mundo, o Natal é sinónimo de vida, luz, alegria e esperança. E a comunidade católica, em Macau, não foge à regra! O nascimento de Jesus é, por excelência, celebrado em família. Entre os muitos desejos revelados a’O CLARIM, destacamos a vontade do padre Bosco Chan de se fazer do Natal também uma oportunidade para todos partirmos ao encontro do Outro.
A celebração do nascimento de Jesus – a Encarnação do Filho de Deus feito Homem – convida à partilha e ao tempo em família, e para Miguel de Senna Fernandes, advogado, “família” é o conceito-chave de uma quadra festiva que a comunidade maquísta, tradicionalmente católica, celebra com solenidade e reverência.
O aspecto estritamente religioso das comemorações natalícias, argumenta o também presidente da Associação dos Macaenses (ADM), continua a ser uma dimensão fundamental da forma como a época festiva é assinalada nos lares macaenses. No entanto, se tivesse de explicar a plenitude do Natal, recorrendo a uma única palavra, Senna Fernandes fá-lo-ia de modo célere e sem grandes hesitações. «O Natal é um período fundamental para a comunidade macaense e continua a sê-lo; muito embora nos últimos dez, quinze anos, a prática de acorrer à Missa do Galo talvez tenha diminuído. É essa a minha percepção», assinala, acrescentando: «De qualquer modo, o espírito de Natal continua a ser muito importante para os macaenses. Não há macaense que, tendo família em Macau, não celebre o Natal com grande significado, seja ele religioso ou não. Já há muito tempo que a celebração é mais uma questão de família do que propriamente uma celebração estritamente religiosa, isto com todo o respeito para o que possam pensar os outros macaenses».
Pai, e agora também avô, Miguel de Senna Fernandes admite que o volver dos anos embrulha a vivência do Natal com uma outra relevância, ainda que a família se mantenha como o expoente fundamental. Tempo de alegria por excelência, a época convida igualmente à nostalgia e a uma grata incursão pela memória: «O Natal é viver a família, e dizer “família” é dizer memórias. Agora, na pele de pai e de avô, lembro-me naturalmente com muita ternura dos anos em que comemorei o Natal com o meu pai, da maneira como me tratava e interagia com as minhas filhas. O Natal também é nostalgia, mas este é um aspecto que só reforça a felicidade habitual no Natal».
CELEBRAR JESUS E SÃO FRANCISCO XAVIER
Família, sim, mas também fé – e não apenas a motivada pela óbvia boa-nova do nascimento de Jesus Cristo. Para Charlot Noruega, este ano o Natal é sinónimo de regresso às origens. Com raízes familiares em Goa, colónia de Portugal até 1961, a catequista e responsável pelos coros de língua portuguesa da paróquia da Sé vai celebrar os mistérios da Natividade com os seus, mas a circunstância que mais pesou na decisão foi o facto de os restos mortais de São Francisco Xavier estarem actualmente em exposição no mais pequeno dos Estados indianos. «Decidimos ir a Goa passar o Natal com a minha família e com a família do meu marido, mas até o decidimos mais por causa da exposição das relíquias de São Francisco Xavier», revela. «Pessoalmente, já tive a oportunidade de ver as relíquias quando era muito pequena. Eu não vivi em Goa durante muito tempo. Vivia no Bahrain e, num ano em que regressámos a Goa, o meu pai levou-me à Basílica do Bom Jesus. Eu era muito pequena naquela altura e quase não tenho memórias disso. Este ano, em conversa com o meu marido, decidimos que era bom se pudéssemos aproveitar esta oportunidade. São Francisco Xavier só é exposto de dez em dez anos, e quem sabe se daqui a dez anos ainda temos força para fazer a peregrinação», explica Charlot Noruega.
Em Goa, Macau, ou no Reino Unido, onde vive a filha, Natal é luz, família e alegria. «Normalmente fazemos o jantar em família e o almoço no Dia de Natal. Celebramos sempre com alegria, em família e com amigos. É uma época feliz. É o nascimento de Jesus, o aniversário de Jesus, que tem de ser celebrado com a dignidade que lhe é devida», aponta. E o que seria uma boa prenda neste Natal?, perguntamos. Responde: «Acho que o aspecto mais importante é a paz no mundo. Para mim e para os meus, peço saúde e alegria. Mas principalmente paz entre cada um de nós e também paz no mundo. Isso é mesmo o mais relevante».
TEMPO PARA O ENCONTRO
Para o padre Bosco Chan, a ternura com que recorda os Natais da infância e da juventude, e a quase tangível sensação de esperança que rodeia a quadra, foi parte fundamental do trajecto que o conduziu ao Sacerdócio. Criado em Hong Kong, o jovem padre lembra com gratidão os «Natais memoráveis da juventude» e como a comunidade onde cresceu se unia para celebrar o mistério do nascimento de Jesus Cristo.
«Tenho muitas recordações memoráveis do Natal e da preparação para o Natal – o período do Advento. Esses momentos transformaram, sem qualquer dúvida, a minha vida; ajudaram a fazer de mim quem eu sou hoje. Tenho memórias muito nítidas dos momentos que partilhei com a minha comunidade, a ensaiar cânticos de Natal. Todos os anos fazíamos o presépio e as imagens eram levadas em procissão. São vivências que fizeram de mim quem sou hoje, e gostava de poder partilhar esta alegria, cá em Macau, com a minha paróquia e os meus paroquianos», refere o padre Bosco.
Na perspectiva do sacerdote, «encontro» e «comunidade» são incontornáveis da vivência do Natal. Se pudesse obter do Deus Menino uma graça, o padre Bosco pediria exactamente a dádiva do tempo e uma maior abertura para que os Homens possam partir ao encontro dos outros: «Deixámos de ter tempo para ir ao encontro dos outros. Vivemos, hoje em dia, escravizados por uma série de circunstâncias. Em tempos de guerra ou em tempos de paz, onde quer que estejamos, o mundo sofre desse mal que é não ter tempo para ir ao encontro dos que nos rodeiam, de ouvir aquilo que eles têm para dizer. Deixámos mesmo de estar em contacto com os nossos próprios sentimentos. Aprendemos a adormecer o que sentimos, deixámos de ter tempo para sentir. Peço por isso ao Senhor para nos dar, neste Natal, a graça de termos tempo para partir ao encontro do Outro».
Marco Carvalho