SHELDON ERIC D’SOUZA

SHELDON ERIC D’SOUZA É ESTE SÁBADO ORDENADO SACERDOTE

«Macau tem ainda um enorme potencial para a evangelização»

Natural de Pune, Sheldon Eric D’Souza trilhou desde pequeno os caminhos da fé numa Índia onde ser católico é ser diferente. O Terço em família e a participação assídua na Eucaristia ajudaram a robustecer uma fé que via como indubitável, mas que sofreu um abalo de impensável magnitude quando a irmã, então com catorze anos, foi diagnosticada com leucemia. A provação colocou a família D’Souza na órbita do Caminho Neocatecumenal e o itinerário de formação católica revelou-se instrumental na descoberta e afirmação de uma vocação que se cumpre plenamente, amanhã, às 15:00 horas, na igreja da Sé Catedral. Sheldon Eric D’Souza, futuro padre da diocese de Macau, em entrevista a’O CLARIM.

O CLARIM– Quem é Sheldon Eric D’Souza? E como chegou a este ponto, de ser ordenado sacerdote em Macau?

SHELDON ERIC D’SOUZA –Nasci na Índia e tenho uma irmã mais velha. Nasci no seio de uma família católica. Os meus pais transmitiram-me a fé católica desde criança: íamos à Missa com regularidade e frequentávamos a igreja todos os Domingos. Participávamos nas novenas e rezávamos o Terço em casa. Desde criança que vivo a minha fé muito activamente, mesmo tendo crescido num ambiente não-católico. Na Índia, o Catolicismo é uma minoria e muitos dos meus amigos eram hindus ou muçulmanos. Ainda assim, a fé católica foi-me transmitida pelos meus pais, principalmente dentro de casa. Mas houve um momento em que a minha família se deparou com uma situação com a qual não sabíamos muito bem como lidar e começámos, inadvertidamente, a questionar Deus. Lembro-me muito bem. Em 1999, a minha irmã foi diagnosticada com leucemia. Ela tinha catorze anos e eu nove. A doença confrontou a minha família com uma situação de desconforto e de incompreensão. Como é que Deus pode confrontar uma família como a minha com uma situação como esta? Uma família religiosa, que ia à Igreja todos os Domingos? Porque é que Deus colocou este desafio no nosso caminho? Mais tarde apercebemo-nos que esta situação – a doença que afectou a minha irmã – foi algo que ajudou verdadeiramente a minha família a compreender Deus ainda melhor. Por um lado, porque nos ajudou a conhecer esta realidade da Igreja que dá pelo nome de Caminho Neocatecumenal. Por outro, porque compreendemos que Deus permitiu que sofrêssemos para que pudéssemos compreender o quanto Ele nos amava.

CL– De que forma é que esse contacto com o Caminho Neocatecumenal influenciou e determinou as suas escolhas?

S.E.S. –Aquilo de que me apercebo hoje é que Deus me chamou para ser sacerdote logo quando nasci. Foi esse o propósito que reservou para mim quando me deu vida, mas a percepção de que Deus me chamou para ser sacerdote só a alcancei através do Caminho Neocatecumenal. Antes disso, nunca me tinha ocorrido tornar-me padre. É um dos instrumentos que mais me influenciaram, eu diria. Pertencer ao Caminho Neocatecumenal ajudou-me a descobrir esta vocação. Ajudou-me a ver que Deus me estava a chamar verdadeiramente para o Sacerdócio, para que fosse cumprida a Sua vontade e eu alcançasse a felicidade.

CL– Um percurso que culmina amanhã na Sé Catedral. Como é que Macau surge na equação?

S.E.S. –Eu ouvi o chamamento de Deus pela primeira vez em 2009, tinha eu dezanove anos. Depois, ao fim de dois anos de discernimento na minha própria cidade, com os catequistas, com os formadores do Caminho Neocatecumenal na Índia…

CL– Qual é a sua cidade?

S.E.S. –Pune. A minha cidade é Pune. Ao fim de dois anos de discernimento, o Caminho Neocatecumenal enviou-me a Roma, para participar numa reunião em 2011. É neste encontro que todos os anos se reúnem aqueles que sentiram o chamamento para o Sacerdócio. Estive nesse encontro com os iniciadores do Caminho Neocatecumenal Kiko Arguello e Carmen Hernández, esta já falecida, e também com o padre Mário, um sacerdote que integrava essa equipa. Participámos num retiro com eles e no final desse retiro foi organizado um sorteio, e esse sorteio determinou para que seminários seríamos enviados. O Caminho Neocatecumenal possui cerca de 120 seminários Redemptoris Mater, como são chamados, espalhados pelo mundo. São seminários com um carisma missionários. Somos seminaristas diocesanos, mas também estamos abertos à missão, a partir para onde quer que Deus nos queira enviar, sempre em comunhão com o Bispo. Em 2011, esse sorteio premeditou que eu fosse para o Rio de Janeiro, no Brasil.

CL– Essa é, então, a razão pela qual o Sheldon também fala Português?

S.E.S. –Sim, é a razão pela qual eu falo Português. Viajei para o Rio de Janeiro em 2012, onde completei sete anos da minha formação. Terminei os meus estudos de Filosofia e fiz dois anos de Teologia. Depois, ao abrigo da preparação como seminarista, o Caminho considera fundamental que tenhamos uma experiência missionária e foi essa a razão pelo qual eu fui enviado para a China, para a cidade de Harbin, no Nordeste da China. Passei dois anos em Harbin, com um sacerdote e famílias missionárias do Caminho Neocatecumental. Depois disso, em 2019, o Vaticano anunciou a criação, aqui em Macau, de um novo seminário para a evangelização da Ásia. Foi aí que Macau entrou na minha vida. Não sei muito bem porque razão fui escolhido, mas fui indagado sobre a minha disponibilidade, sobre a minha predisposição, e perguntaram-se se estaria disposto a continuar a minha formação em Macau. Vir para Macau foi algo que me deixou muito feliz. Desde que participei naquele encontro em 2011 senti que estava a ser chamado para evangelizar na China, para evangelizar nesta parte do mundo.

CL– Quais são os grandes desafios que se colocam a essa missão de evangelizar num território como Macau, onde os católicos são uma minoria?

S.E.S. –Na minha opinião, um dos desafios é exactamente esse que referia, o facto de o Catolicismo ser uma minoria em Macau. Para a população, o que é importante é ver um sinal do Catolicismo nos católicos locais. Como Jesus Cristo diz nos Evangelhos, nós somos chamados a ser a luz do mundo, o sal da Terra. Muitas vezes, andamos tão ocupados com as nossas vidas que nos esquecemos que não temos que ser necessariamente missionários para sermos um sinal da presença de Cristo. A existência de várias religiões é algo a que estou habituado, dada a minha experiência na Índia. Na Índia, o Catolicismo também é uma minoria, a exemplo do que acontece em Macau e no interior da China. Há outras religiões que as pessoas vêem como mais importantes e, muitas vezes, o problema com que nos deparamos é fazer com que as pessoas percebam que Deus – o nosso Deus, o Deus dos católicos – é o verdadeiro Deus. Parte do problema são as comparações. As pessoas tentam adaptar o nosso Deus à sua mentalidade. Nós não conseguimos compreender Deus. Não é algo que possa ser compreendido de forma racional. Temos de ter a experiência de Deus. E é por isso também que eu penso que Macau é muito importante para abrir as portas para a evangelização, para a Missão, porque foi aqui que os primeiros frutos da evangelização foram colhidos, com São Francisco Xavier e muitos outros sacerdotes que passaram por Macau. Esta cidade, na minha opinião, tem ainda um enorme potencial para a evangelização.

Marco Carvalho

N.d.R.: Na edição da passada semana, O CLARIMpublicou uma entrevista a José Oliveira Marques, que também irá ser ordenado sacerdote juntamente com Sheldon Eric D’Souza.

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