«Deus não precisa de se restringir ao planeta Terra ou à espécie humana».
A ciência e a religião não estão em conflito, assegura o padre Javier Sánchez, professor e investigador na Universidade de Navarra, em Espanha. Para o provar, a’O CLARIM fala sobre Stephen Hawking, da mão de Deus na criação de vida extraterrestre, do papel da religião na colonização de outros planetas, e de criacionismo e evolucionismo, sem esquecer a Física e a Teologia.
O CLARIM – Por que razão há a necessidade de falar na relação entre ciência e fé?
PADRE JAVIER SÁNCHEZ – É sempre necessário fomentar o diálogo entre a ciência e a fé. Algumas pessoas pensam que a ciência e a religião estão em conflito, mas isso é simplesmente falso. Se alguém estudar um pouco a História, facilmente percebe que a relação entre si é mais complexa e que muitas vezes as visões religiosas têm inspirado o progresso científico. Mesmo que a ciência e a religião possam ter abordagens diferentes da realidade, estão ambas interessadas em conhecer a realidade única, na qual vivem os seres humanos. E porque a ciência e a religião procuram o conhecimento verdadeiro, é natural que precisem de dialogar entre si.
CL – Stephen Hawking era ateu. No entanto, foi membro da Pontifícia Academia das Ciências do Vaticano. Será que a fé pode ter forte influência na percepção da realidade?
P.J.S. – Stephen Hawking e muitos outros cientistas foram membros da Pontifícia Academia das Ciências porque a Igreja Católica está profundamente envolvida no diálogo sobre a visão científica do mundo. Não é preciso ser-se crente para fazer parte desta academia como membro e participar no diálogo que decorre a muitos níveis. Por outro lado, manter uma visão religiosa do mundo como crente pode dar uma motivação adicional a um cientista que deseja entender a natureza e ver Deus por detrás da inteligibilidade do universo.
CL – Que entendimento tem do universo, por um lado segundo a ciência, e por outro lado de acordo com o plano de Deus?
P.J.S. – Um cientista que é crente respeita a autonomia das leis naturais que governam a evolução do universo. Ao mesmo tempo, acredita na existência de uma fonte mais profunda que sustenta a inteligibilidade do universo: o próprio Deus. Para citar o Papa Bento XVI: “o próprio universo é estruturado de maneira inteligente, de modo que existe uma profunda correspondência entre a nossa razão subjectiva e a razão objectiva da natureza. Torna-se inevitável perguntar a nós mesmos se não há uma inteligência única original, que é fonte comum a ambas. Deste modo, é precisamente a reflexão sobre o desenvolvimento da ciência que nos leva para o Logos criador”.
CL – A existirem extraterrestres, será que fazem parte da criação de Deus?
P.J.S. – Claro que serão parte da criação de Deus. O amor super-abundante de Deus não precisa de se restringir apenas ao planeta Terra ou à espécie humana.
CL – Como vê a futura colonização de outros planetas?
P.J.S. – Trata-se de um tema frequente na literatura de ficção científica, nos filmes e nas séries de televisão. Dentro das nossas perspectivas actuais, parece que isso está realmente fora das possibilidades humanas. Mesmo sendo verdade que o número de exoplanetas dentro da franja habitável está a aumentar exponencialmente, é certo que estão ainda muito longe para que o homem os possa colonizar. No entanto, talvez num futuro muito distante os seres humanos precisem de abandonar a Terra.
CL – E qual será o papel da religião nesta nova realidade?
P.J.S. – Pode sempre desempenhar um papel positivo como alerta da natureza transcendente dos seres humanos.
CL – Regressando ao nosso planeta… Qual é a actual situação em torno do criacionismo e do evolucionismo?
P.J.S. – Em termos gerais, a luta entre o criacionismo e o evolucionismo não é problema para o Cristianismo. A relação entre a doutrina cristã da criação e as consequências filosóficas da teoria da evolução torna-se um problema apenas quando são adoptadas posições fundamentalistas.
CL – Além de director do Grupo “Ciência, Razão e Fé”, na Universidade de Navarra é também investigador do Grupo Mente-Cérebro do Instituto de Cultura e Sociedade, e professor-associado da Escola Eclesiástica de Filosofia. Dado que já publicou vários artigos sobre Física, quais são para si os assuntos com interesse que dizem respeito à Física e à Teologia?
P.J.S. – Em minha opinião a Física e a Teologia podem manter um diálogo graças à mediação filosófica. A filosofia da Física é um campo em desenvolvimento que explora principalmente as consequências da Mecânica Quântica e da Teoria da Relatividade para a nossa compreensão básica da natureza. A forma como a natureza se determina entre as muitas possibilidades físicas é um campo de pesquisa que está em aberto, o que pode ser muito relevante para a nossa compreensão da presença de Deus na criação e para o desenvolvimento de uma renovada Teologia da Natureza.
PEDRO DANIEL OLIVEIRA
pedrodanielhk@hotmail.com