«Queremos que as crianças possam brincar e interagir umas com as outras»8
O CLARIM– A Creche Internacional de São José é um novo projecto que vem responder a uma das grandes necessidades de Macau. Todos os anos é muito difícil para os pais de crianças pequenas arranjarem um local de qualidade onde possam deixar os filhos. A creche aparece também com o objectivo de dar resposta a este tipo de necessidade?
NAIR CARDOSO– Eu penso que sim. Este projecto é subsidiado pelo Instituto de Acção Social e conta com o apoio da diocese de Macau. Foi iniciado, em 2018, pela Universidade de São José, daí ter sido baptizado com o nome de Creche Internacional de São José. Entretanto, a Universidade achou que a creche devia estar mais sobre a égide da Diocese e, este ano, com a saída do padre Peter Stilwell da reitoria, decidiu-se em Julho – altura que coincide com a minha entrada como directora – mudar para a dependência da diocese de Macau. E isto porquê? Porque a Diocese tem mais experiência. A Diocese já tem várias creches em Macau e, sendo uma creche internacional, nós queríamos não só estar ao nível das creches tradicionais de Macau, mas também destacarmo-nos através dessa faceta mais internacional. Os funcionários, quando eu entrei, já cá estavam. O pessoal que foi contratado não fala Português e a ideia é implementar, através de funcionários em “part-time” – e também com a minha ajuda – o Português aqui na creche.
CL– O objectivo para este seu primeiro ano à frente dos destinos da creche passa pelo quê? Quantas crianças vai a Creche Internacional de São José acolher no próximo ano lectivo?
N.C.– Na primeira fase, queremos 120 crianças. Digo queremos porque temos funcionários suficientes para 150 crianças. Não queremos, no entanto, arrancar com a capacidade máxima, também para que os funcionários possam ter algum intercâmbio com os pais que vão colocar cá as crianças pela primeira vez. Com a mudança de pedagogia que se implementou agora em Julho, elas vão precisar de algum tempo para perceber como é que os novos objectivos funcionam. Se formos à capacidade máxima de ter trinta crianças por sala, penso que poderá ser bastante difícil numa fase inicial. Estamos a prever, numa fase inicial, umas 22, 25 crianças por sala. Temos capacidade para 240, mas para este ano lectivo talvez mantermos quatro, cinco salas e depois, então, progressivamente aumentarmos para a capacidade máxima: oito salas, trinta por sala, 240 crianças.
CL– Este projecto, em termos pedagógicos, vai buscar inspiração onde?
N.C.– Numa fase inicial, quando eu entrei no projecto, disseram-me: “A creche vai ser uma creche internacional e nós vamos querer ensinar Inglês às crianças”. Mas penso que o conceito de internacional, não só requer a aprendizagem da língua, a comunicação, mas também a filosofia de ensino. E requer, sobretudo, muita brincadeira. Vamos privilegiar a brincadeira: do primeiro aos três anos, não tencionamos ensinar nada académico, passe a expressão. Queremos, isso sim, que as crianças possam brincar, possam interagir umas com as outras. Queremos que os pais se apercebam de uma forma natural qual é o benefício de vir para a escola em vez de ficarem em casa com as empregadas, até porque há muita facilidade aqui em Macau de poder deixar as crianças com os avós e com as empregadas. A vantagem vai ser mesmo essa parte social, a parte emocional – como a criança se desliga dos pais. E depois poder estar numa escola, num ambiente completamente diferente. Queremos valorizar a arte. E porquê a arte? A primeira coisa que eu disse quando cá cheguei foi: “Esta é uma escola tão moderna em termos arquitectónicos, que nós queremos um ateliê aqui”. Um ateliê onde as crianças possam trabalhar com barro, possam trabalhar com arte. Onde se possam sujar à vontade e também aprender a valorizar os sentidos, as brincadeiras sensoriais. Poderem brincar e valorizar os sentidos e, através disso, fazer crescer a parte do Inglês, do Português e do Cantonense através da brincadeira.
CL– Estamos a falar de crianças de muito tenra idade. De que forma é que a creche vai envolver os próprios pais neste processo?
N.C.– Penso que será muito importante este triângulo entre os pais, as crianças e a escola, bem como com os educadores. Penso que terá que ser norteado por um princípio de transparência. É um princípio que tem de ser alimentado e que tem de ser alimentado desde o início. Vamos querer que os pais deixem as crianças à porta da sala. Há algumas creches em Macau – eu própria já trabalhei em algumas – em que os pais deixam as crianças na parte da recepção e, depois, as educadoras é que conduzem as crianças até às salas. Queremos mudar um bocadinho essa filosofia. Não queremos ver aquelas cenas em que as crianças estão a berrar e a chorar, quando são deixadas pelos pais. Numa fase inicial é difícil, porque isto é uma novidade para eles: o facto de saírem de ao pé dos pais e de virem para uma sala de aula, com um ambiente totalmente diferente, com pessoas diferentes, não é emocionalmente fácil para as crianças. Mas queremos que os pais tenham confiança em nós. Queremos que aos poucos possam vir, por exemplo, meio-dia, e depois acrescentar mais um bocadinho. Essa transparência, essa abertura entre pais e os educadores é o que pretendemos na Creche Internacional de São José.
CL– Por que razão é que vale a pena optar pela Creche Internacional de São José e não por uma creche tradicional, digamos assim?
N.C.– Não posso dizer que todas as creches tradicionais são iguais. Eu conheço algumas. Mas começa logo pelo espaço. As nossas salas têm a vantagem de ter luz directa em todas as salas. O espaço é ligeiramente maior do que os das escolas tradicionais. Até o próprio Instituto de Acção Social, quando sancionou o projecto, reconheceu que a escola tem espaços bastante grandes. Tem uma área de brincar enorme: chamam-lhe um ginásio polivalente. Em termos de espaço, acho que é um espaço muito bonito. Por outro lado, temos as próprias refeições. Se calhar, nas outras escolas são servidas refeições de fora, mas aqui temos a vantagem de sermos um bocadinho mais flexíveis. Se eles não comem alguma coisa, podemos ter esse aspecto em conta. Agora há a tendência de as crianças irem mais para o vegetariano, não poderem comer de carne porco por causa da religião. Perante essas circunstâncias, adaptamos o nosso trabalho. A nossa própria cozinheira está habituada a trabalhar em creches. Tem três anos de experiência e está habituada a isso. Isto é uma vantagem. As outras são a arte, a pedagogia e o podermos implementar o Português e o Inglês aos poucos.
Marco Carvalho