Jesus Estanislao, Ex-Ministro das Finanças na Presidência de Corazon Aquino

«Jogo não é bom para Manila»

A’O CLARIM, o antigo responsável pela pasta das Finanças das Filipinas abordou a realidade do País com espírito de missão, ao salientar que a receita para combater a corrupção é diferente do modelo implementado na China, e que o conceito da indústria do Jogo em Macau e Singapura não se adequa à realidade de Manila. Sobre as relações com Pequim, Jesus Estanislao admitiu que são precisas pessoas razoáveis de ambos os lados para lidar com as disputas territoriais no Mar do Sul da China.

O CLARIMFoi ministro das Finanças na presidência de Corazon Aquino. Quais os desafios de então?

JESUS ESTANISLAO – O grande desafio foi sobreviver como Governo, até porque éramos uma democracia instalada após uma ditadura e havia problemas relacionados com os militares que tentavam tomar o controlo. Tivemos que ser firmes. Isto foi do ponto de vista da segurança. Herdámos também uma economia que estava falida e fez-nos trabalhar para termos a certeza de que poderíamos voltar aos mercados financeiros internacionais, dos quais havíamos sido postos de parte. A sociedade estava muito fracturada, muito dividida, e tinha que haver uma maneira de aproximar as pessoas. Até hoje temos problemas separatistas no Sul.

CLComo vê hoje as Filipinas?

J.E. – Não há dúvida quanto à solidez das instituições democráticas. Ninguém está a pensar em destruir ou acabar com a democracia. Em muitos aspectos a economia seguiu a direcção do crescimento acelerado. Temos agora um bom grau de investimento e estamos nos mercados financeiros internacionais desde 1992.

CLOs países asiáticos são muitas vezes apontados como bastante corruptos. O Presidente chinês, Xi Jinping, está a implementar medidas fortes para combater o problema dentro de portas. Será a melhor forma?

J.E. – À sua maneira poderá funcionar na China, mas é algo diferente da forma como lidamos aqui [nas Filipinas], porque temos a nossa cultura, o nosso sistema legal e judicial, entre outros mecanismos. Mas deixe-me explicar desta maneira: Quanto a sério estamos? Mandámos para a prisão dois ex-presidentes [Joseph Estrada e Gloria Macapagal-Arroyo], acusámos um juiz do tribunal superior e pusemos sobre detenção três actuais senadores. Penso que não há muitos países assim…

CLEspecialmente na Ásia…

J.E. – Especialmente na Ásia.

CLAs Filipinas está no bom caminho?

J.E. – Está. Não digo que é tarefa fácil, mas pelo menos tem havido progressos.

CLApós deixar a pasta das Finanças em 1992 enveredou pelo governo das sociedades…

J.E. – Primeiro tive que converter este pequeno Centro [para Pesquisa e Comunicação] na Universidade [da Ásia e do Pacífico]. Depois do meu mandato decidi encontrar-me com o BDA [Banco de Desenvolvimento Asiático] para estabelecer o instituto deles em Tóquio e só depois me perguntei: “O que vou fazer agora?”. A resposta que encontrei foi esta: “Bem, tens de abordar os problemas que encontras”. E pensei que o governo das sociedades seria a chave.

CLPorquê nesta área?

J.E. – Porque a corrupção está aí [nas Filipinas]. Não nos podemos esquecer que após a crise financeira de 1997-98 na Ásia Oriental a corrupção tornou-se um grande problema, que também afectava o governo das sociedades. Disse então: «Isto é algo com que posso começar nas Filipinas».

CLConhece Macau?

J.E. – Visitei duas vezes. Sabia que era um território português antes da transferência de poderes para a China. Não regressei desde então.

CLÉ um território onde a indústria do Jogo é bastante forte. O que pensa do sector em Manila?

J.E. – Para ser franco, não estou lá muito contente. O mesmo passa-se com Singapura. Penso que há alternativas para encaixar muitíssimo dinheiro. Sei que Macau se desenvolveu exponencialmente por causa da indústria do Jogo, mas este talvez não seja o nosso forte.

CLA escolha pelo governo das sociedades teve alguma coisa a ver com a sua fé como católico?

J.E. – Sim e não, porque a fé diz para sermos justos com todos, para estarmos ao serviço do maior número de pessoas possível e para sermos honestos. Esta é uma utilidade da fé, que também traz muita ciência da gestão, e o que verificamos é que essas motivações são provenientes de fé. Usamos estas ferramentas práticas para termos outras mais. Claro que a motivação é uma responsabilidade social.

CLComo viu a visita do Papa Francisco às Filipinas?

J.E. – Foi fantástica. A mensagem para os responsáveis governamentais foi em cheio, ao apelar à integridade e à anti-corrupção. Qualquer prática de corrupção visa, de alguma forma, roubar os pobres. Foi algo que os nossos políticos tiveram que ouvir e é algo no qual estamos a trabalhar para haver a certeza de que temos voz moral.

CLO Papa também realçou «a muitas vezes esquecida contribuição real dos filipinos da diáspora para a vida e bem-estar das sociedades onde vivem». É um problema?

J.E. – É um desafio. Tem muitos pontos bons e outros maus, se virmos que os filipinos são capazes de fazer o bem, mas também têm famílias que estão divididas, o que requer muitos sacrifícios. Esperamos incrementar novas oportunidades de emprego e económicas nas Filipinas para que menos pessoas saiam [para o estrangeiro]. O que temos de fazer é olhar para as formas e para os meios de cuidar das pessoas que vivem no estrangeiro em variadíssimas culturas e ambientes económicos.

CLAinda sobre a RPC, que análise faz à disputas territoriais entre os dois países no Mar do Sul da China?

J.E. – Trata-se de uma [situação] irritante e é algo que está atravessado entre nós, mas não é o único aspecto do nosso relacionamento. Temos muitos outros pontos em que somos amistosos. Por exemplo, no campo económico estamos bem. O que precisamos de fazer é trazer pessoas razoáveis de ambos os lados e procurar formas de coligação e de interesse comum.

PEDRO DANIEL OLIVEIRA

Em Manila

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