Fortes Pakeong Sequeira

VOCALISTA DOS BLADEMARK FOI BAPTIZADO EM 2015

A improvável viagem de Fortes ao encontro da Fé

«A determinada altura, deparei-me com a necessidade de olhar para mim e sentir que era uma boa pessoa». O testemunho é de Fortes Pakeong Sequeira e é desta forma que o músico e artista plástico, com raízes numa das mais tradicionais famílias macaenses do território, remata a extraordinária viagem pessoal que culminou com a redescoberta das suas raízes católicas e a afirmação de uma fé inabalável em Cristo.

Vocalista dos Blademark, uma das mais bem-sucedidas bandas de “heavy metal” de Macau, Fortes Pakeong Sequeira tem, aos 43 anos, uma carreira de sucesso em áreas como a música, o design gráfico e a ilustração, mas as perspectivas nem sempre foram as mais brilhantes para o também fundador da Sparrow Music Culture Ltd., a agência de produção cultural com que propõe “sacudir” o panorama cultural da RAEM.

Nascido em 1978, Fortes viu os pais separarem-se quando tinha apenas seis anos de idade. O agora ilustrador passou os anos formativos da infância com o pai, mas a relação intempestiva que foi amadurecendo entre ambos atingiu um ponto de ruptura no início da década de 1990. Com apenas treze anos, Fortes saiu de casa, abandonou a escola e deu por si a viver na rua. «Deixei a escola, fugi de casa e tornei-me um sem-abrigo. Tinha treze anos», recorda, acrescentando: «Durante o dia trabalhava num restaurante e à noite dormia na rua, a maior parte das vezes no Jardim Vasco da Gama».

Tomada nos verdes anos da adolescência, a decisão acabou por empurrar Pakeong Sequeira para as margens da sociedade. Vulnerável, deu por si a ser recrutado por organizações criminosas e a trilhar um vertiginoso percurso que termina, cinco anos depois, numa prisão de Hong Kong, onde vai parar por envolvimento com uma rede de tráfico de estupefacientes.

A atitude compassiva de um agente das forças de segurança da então colónia britânica, que conseguiu localizar a mãe de Fortes em Macau, foi a centelha de esperança que o resgatou de uma vida criminosa. O amor e o sentido de pertença que nunca lhe foi dado na infância fizeram o resto. «O meu pai era uma pessoa com uma perspectiva chinesa muito tradicional e houve uma série de experiências pelas quais eu nunca passei. Eu nunca partilhei o estilo de vida que a família do lado da minha mãe seguia, porque o meu pai era uma pessoa muito severa. Eu não podia usar perfume ou coisas desse género», explica. «A minha família do lado da minha mãe era profundamente católica, em particular a minha avó. A minha avó ia à Igreja todos os dias. Ela fez-nos ter confiança em Deus. O problema é que eu não cresci com a minha família materna e quando saí de casa, quando fugi do meu pai, tentei ser como eles. Tentei arduamente ser um macaense. E regressar à Igreja era algo que eu estava ansioso por fazer».

Ao fim de mais de uma década de separação, Fortes reencontra a mãe e apressa-se a sanar o tempo perdido: reata a ligação com a família do lado materno, completa o Ensino Secundário, ressuscita o gosto pelo desenho e pela ilustração. Lá pelo meio, cimenta novas amizades com a ajuda do basquetebol e da música. «É engraçado porque eu nunca quis ser músico. Nunca me passou pela cabeça integrar uma banda. É verdade que sempre gostei muito de cantar. Quando estava no nono ano, alguns dos meus amigos começaram a tocar guitarra. É curioso porque todos eles eram macaenses», sublinha. «Nessa altura, íamos com alguma frequência para estabelecimentos de “karaoke”, cantávamos um par de canções e eles começaram a dizer que eu até tinha uma boa voz, e uma coisa levou à outra. A primeira banda de que fiz parte chamava-se MP. Os outros membros foram abandonando o projecto e a determinada altura só restava eu do alinhamento original. Como não fui o único fundador da banda, pareceu-me que fazia sentido optar por outro nome e foi assim que nasceram os Blademark», lembra.

Em paralelo, e já com os sombrios dias em que teve a rua como casa bem enterrados no passado, completou uma licenciatura em design gráfico na Escola de Artes do Instituto Polítécnico de Macau. Em 2005, o Armazém do Boi acolheu a sua primeira exposição individual – “Mad! Mad! Mad! Fortes Sketches Solo” – e desde então o seu trabalho chegou aos quatro cantos do mundo, a cidades como Pequim, Xangai, Tóquio, Singapura, Lisboa e Nova Iorque. Com os Blademark, Pakeong Sequeira actuou em Hong Kong, na Austrália e em várias cidades chinesas, chegando a representar Macau no Festival da Canção da Asian Broadcasting Union, o equivalente asiático ao Festival da Eurovisão.

Depois de uma infância difícil e de uma adolescência turbulenta, o jovem artista – tido como um dos mais versáteis e promissores de Macau – consumava aquilo que se teria prefigurado, menos de uma década antes, como um improvável percurso de redenção: «Naquela altura, o que eu desejava era sobretudo ser uma boa pessoa. Queria estar ao nível da minha família e queria que esse se torna-se o meu estilo. O problema é que eu nem sequer tinha sido baptizado em criança».

Madrasta, a vida reservou em 2013 uma última rasteira a Fortes. A morte da mãe deixou o jovem artista devastado, mas colocou-o em definitivo na senda de Cristo. «A minha mãe morreu em 2013 e depois disso dei por mim a deslocar-me à Igreja com bastante frequência. Mandámos celebrar várias missas pela alma da minha mãe e a frequentar mais amiúde a igreja de São Lázaro, e o padre e as irmãs da paróquia acolheram-me e deram-me apoio. Fiquei completamente desorientado na altura. Sentia tanto a falta da minha mãe que não conseguia fazer nada», recorda Fortes, que viria a ser «baptizado em 2015, na igreja de São Lázaro». Desde então, «todas as semanas» regressa à igreja. «Todas as semanas regresso a São Lázaro», remata o vocalista e artista plástico.

Marco Carvalho

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