A dinâmica diária em Portugal começa a ser dominada pelas eleições que se aproximam e que, pelo que se vai vendo, nada de novo trazem. Felizmente que desde há uns anos a esta parte deixei de me importar com política e cores partidárias. Relativamente a votar, penso que a última vez que o fiz foi para a Assembleia Legislativa de Macau. Sei que os críticos já estarão a pensar que o dever de votar foi ganho pelos nossos antepassados e que deve ser usado para bem da democracia e de toda a sociedade. Para mim, como não vejo a sociedade preocupada com mais nada que não seja o seu umbigo, as eleições passam-me ao lado e tão cedo não irei mudar de opinião, tendo em consideração o panorama político e as caras dos novos e velhos partidos. São “mais do mesmo” – digo eu e muitos da minha geração.
À semelhança do que acontece com outros portugueses que estiveram emigrados e regressaram a Portugal, considero que o mais importante é haver oportunidades de trabalho e.. que nos deixem trabalhar! Depois de três anos de altos e baixos, nota-se que ainda muito há a fazer para que Portugal seja um país de oportunidades, e não de oportunistas.
Quando falo com estrangeiros que visitam Portugal, ou que por cá decidem fixar residência, chego à conclusão que – afinal – ainda há pior! Deve ser por isso que diariamente, segundo números oficiais publicados recentemente, cerca de dez mil estrangeiros pedem para fixar residência em Portugal. Infelizmente, não foi revelada a sua proveniência. Pelo que vamos apurando aqui e ali, durante as nossas deambulações de norte a sul do País, muitos até são naturais ou viviam em países, supostamente, com economias mais fortes do que a portuguesa. Acontece que escolheram fixar residência em Portugal tão e simplesmente porque é barato e há bom tempo durante quase todo o ano. Curiosamente, ainda não encontrámos ninguém que dissesse que havia optado por Portugal por se tratar de um país onde o investimento é fácil. De facto, o excessivo peso e a complexidade da burocracia continua a ser um entrave a novos investimentos, sendo disso prova as “dores de cabeça” sentidas por um par de investidores que conhecemos. Claro está que não é o único problema, pois há sempre a questão da língua que nos primeiros anos é difícil da dominar. Os altos custos de todo o processo de investimento é outro dos problemas apontados.
Recentemente um nosso amigo, ligado por laços familiares a uma das grandes famílias chinesas de Macau, esteve no Norte de Portugal com um filho que vive na Europa, com o objectivo de investirem no sector imobiliário, ramo muito procurado pelos estrangeiros dado a sua forte capacidade aquisitiva. Ao final de uma semana, depois de alguma prospecção de mercado e de encetarem contactos com agentes influentes no meio, deixaram Portugal rumo a França. Acabaram por gastar algumas centenas de milhar de dólares de Hong Kong, sem que nada de muito substancial tivesse avançado com vista aos investimentos que tinham em mente. Já depois de terem deixado Portugal perguntei-lhes como havia corrido a viagem, tendo ficado a saber que andaram cinco dias de um lado para o outro, entre repartições e conservatórias com o advogado por eles contratado, e que nada ainda estava oficializado. Quanto aos investimentos em concreto, como decidiram comprar duas ou três propriedades na cidade do Porto, em zona classificada pela UNESCO, o processo estava mais bem encaminhado, mas ainda pendente de um documento oficial. Segundo eles, tencionam investir em Portugal através de uma empresa portuguesa e não por meio de uma empresa estrangeira. Mas para isso é vital que a tal empresa seja constituída, o que tarda em acontecer.
Outro exemplo, em menor escala, é o de um casal inglês que adquiriu há uns anos uma pequena casa de aldeia. Entusiasmados com a moda do Alojamento Local, transformou-a num pequeno e requintado espaço para dezasseis hóspedes. Quem gere o negócio é a senhora, pois o marido decidiu manter-se afastado do investimento para conseguir manter o casamento, depois de quatro anos de sucessivas frustrações. Ainda hoje a carga burocrática é de tal ordem, que não há semana em que não nos peça ajuda com algum documento. Felizmente, se por alguma razão não recorre a nós, fá-lo junto de outros amigos portugueses. Diz ela que se estiver sempre a contratar advogados e tradutores o mais certo é acabar por encerrar o negócio, enviando para o Fundo de Desemprego cerca de quinze pessoas que para ela trabalham. Trata-se de um pequeno investimento, mas na aldeia onde se insere é o que mais emprega.
Quem conhece sabe que Portugal é um país maravilhoso. No entanto precisa de ser abanado da cabeça aos pés, pois é a única forma de entrar nos eixos, de uma vez por todas. Temos de ser capazes de criar condições de investimento – e de manutenção a longo prazo desse mesmo investimento – para que a economia floresça, e atrás dos primeiros investidores venham outros com novas ideias.
O abanão tem de começar por cima, acabando com toda a teia de benefícios e de favores criada pelos partidos políticos, com consequências nefastas desde São Bento até à Junta de Freguesia mais pequena do País.
João Santos Gomes