Filipinos renascem na Páscoa

TESTEMUNHO NA PRIMEIRA PESSOA

Filipinas renascem na Páscoa

As Filipinas são o maior país católico da Ásia, pelo que é também o maior país católico do Extremo Oriente. Para os filipinos de qualquer extracto social, a Páscoa reveste-se de importante significado, sendo algo muito diferente do restante do Calendário Litúrgico e de tudo aquilo que as paróquias celebram ao longo do ano.

Embora o Natal tenha uma importância de todo inquestionável, é principalmente na Páscoa que os fiéis filipinos enchem as igrejas para cumprirem o ritual da Conciliação. Normalmente dirigem-se à igreja mais próxima das suas casas, ou da que mais lhes signifique pessoalmente, e procedem à confissão anual. Por vezes, são tantos os fiéis que é necessário esperar mais de duas horas para se ser recebido por um dos muitos sacerdotes destacados para o serviço da Confissão.

Na Quinta-feira Santa, Sexta-feira Santa e no Sábado Santo é feriado nas Filipinas, sendo na maioria das vezes as únicas férias de que os trabalhadores dispõem. Esta razão explica o facto das reuniões familiares serem preparadas a rigor – em Nueva Ecija, região onde nos encontramos, estes encontros são denominados de “buddlefight” –, com os familiares a juntarem-se à volta de longas mesas, enfeitadas e repletas de boa comida. O momento é aproveitado para colocar as conversas em dia e revelar as novidades.

À semelhança do restante mundo católico, as celebrações pascais iniciam com o Domingo de Ramos. Com as palmas são elaborados desenhos intrincados e esplendorosos, havendo grande parecença com as palmas utilizadas pelos cristãos ortodoxos russos na “sua” Páscoa. A liturgia pensada há séculos para este período religioso é escrupulosamente cumprida ao longo da semana, prevalecendo um ambiente amistoso entre os fiéis.

Dado o número de fiéis, recorremos ao serviço de transporte de um parente próximo para podermos ir à Confissão. Já para participarmos na missa de Domingo, apanhámos um dos sempre eternos “tricycles” – motociclos equipados com motores de média e baixa cilindrada, aos quais é acoplado um “sidecar” –, que pululam por todos os cantos da miríade de ilhas das Filipinas. São bastante incómodos, especialmente para os estrangeiros de maior porte, mas cumprem o objectivo de transportar pessoas e mercadorias a qualquer lugar e em segurança.

Como de costume, chegámos cedo à igreja de Santo Isidro Labrador, em Talavera, onde há dezanove anos dissemos “sim” ao matrimónio. Perto da hora do início da missa a igreja estava praticamente vazia. No entanto, quando os sacerdotes apareceram, encheu-se como por milagre. A explicação para tal fenómeno é simples: embora haja ventiladores de grandes dimensões no tecto e ventoinhas colocadas em ambos os lados da nave da igreja, os 37 graus assinalados nos termómetros faziam-se sentir no seu interior, pelo que os fiéis aguardaram até ao último segundo para entrarem juntamente com o clero.

Durante a missa, a igreja estava sempre cheia, uma prova de que o tremor de terra sentido dois dias antes não assustou os fiéis. A missa foi cantada em Tagalog, como sempre acontece nestas épocas; algo que já não ouvíamos há algum tempo. O ambiente trouxe-nos à cabeça boas e más recordações, quando se vivem tempos de grande incerteza um pouco por todo o mundo.

À saída da igreja os fiéis cumprimentaram-se como se se conhecessem desde sempre. Uma coisa é certa: havemos, pois, de nos voltar a cruzar, nem que seja novamente por altura da Páscoa.

Voltámos para casa espiritualmente mais ricos – até o “tricycle” pareceu mais confortável.

Manuel dos Santos

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