O poder de um milhão e meio de jovens em silêncio
A convite da AILD (Associação Internacional de Luso-Descendentes), do MCP (Movimento Cumprir Portugal) e da Benemerente Casa da Flora, esteve em Portugal, para participar na Jornada Mundial da Juventude, o jovem Aloísio Gonzaga que actualmente estuda na Universidade de São José.
Aloísio pertence à comunidade luso-descendente bayingyi de Myanmar e é um testemunho vivo do momento particularmente difícil que esta atravessa. Subsistindo essencialmente da agricultura e distinguindo-se dos restantes birmaneses, na maior parte dos casos, por óbvios traços caucasianos, os bayingyis há muito esqueceram o idioma e apelidos portugueses, mas mantêm viva a prática do catolicismo romano: sem dúvida, o seu traço mais distintivo.
A razão e o significado da vinda de Aloísio a Portugal foi, precisamente, a participação na JMJ de Lisboa, «na qualidade de jovem católico», respondendo assim «ao apelo do Nosso Senhor» para dar a conhecer, através do seu testemunho, «o sofrimento vivido presentemente por todos os católicos de Myanmar». Daí, o seu desejo de transmitir esse apelo de viva voz ao Papa Francisco no encontro que este teve com jovens refugiados na reitoria da Universidade Católica Portuguesa, no passado dia 3 de Agosto. Infelizmente, tal não foi possível. «Gostaria de ter pedido ao Santo Padre que rezasse pela Igreja Católica em Myanmar, pois nalgumas regiões do País as capelas e santuários foram incendiados. Mas mesmo assim as pessoas não perderam a Fé. Antes pelo contrário, fortaleceram-na. Cada vez há mais fiéis a assistir às missas», disse a’O CLARIM.
Pensou-se inicialmente que Aloísio era o único jovem do Myanmar inscrito na JMJ – «ainda procurei na multidão a bandeira do meu país…» –, mas soube-se mais tarde que estiveram presentes três outros birmaneses, provavelmente refugiados de etnia “karen”, que se deslocaram a Portugal a convite de uma das paróquias do Porto. Aloísio sentiu-se verdadeiramente privilegiado pois «a Igreja em Myanmar carece de meios para poder enviar os seus jovens ao estrangeiro». Esta foi uma oportunidade única de compartilhar com os jovens de outros países as actuais dificuldades da Igreja em Myanmar, em particular dos jovens, os que mais sofrem com a presente guerra civil.
Quanto ao impacto que o Catolicismo tem no seu país, Aloísio não está com falsas modéstias: «O Catolicismo faz parte da história e do desenvolvimento do meu país. Myanmar passou por tempos difíceis no passado e de novo encara sombria realidade; não obstante, nunca a Igreja local abandonou os cidadãos, independentemente da sua religião. A Igreja Católica está a ajudar todos e de todas as maneiras possíveis».
“Durante esta Jornada Mundial da Juventude façam perguntas a Jesus e compartilhem os vossos segredos com Ele, falem-Lhe da vida dos vossos entes queridos, das vossas alegrias e preocupações, e até dos problemas dos vossos países e do mundo”. Para Aloísio, foi esta a mais marcante mensagem deixada pelo Santo Padre. Este apelo tocou-o profundamente, já que foi a necessidade de expor os problemas vividos pela sua comunidade que o trouxe a Lisboa.
No decorrer do evento, o jovem bayingyi teve a oportunidade de fazer amigos de diferentes nacionalidades. E quando se apresentava, de imediato estes lhe perguntavam pelos seus compatriotas, já que a esmagadora maioria dos participantes se apresentaram inseridos em grupos. «Infelizmente – comentou – tive que lhes dizer que por causa da guerra civil em Myanmar não foi possível reunir uma delegação representativa do País». Ao relatar os mais recentes e trágicos acontecimentos, Aloísio notou grande interesse da parte dos seus interlocutores e estes garantiram-lhe que doravante orariam «pelo meu país».
Grato com os jovens da Movimento Cumprir Portugal que o acompanharam durante o evento, Aloísio Gonzaga salientou ainda a gentileza e hospitalidade da família lisboeta que o acolheu. «Uma família maravilhosa e muito religiosa. Foi uma experiência incrível! Antes de vir, confesso, estava um pouco assustado, mas eles trataram-me como um verdadeiro irmão».
Além de uma intensa participação na Jornada, Aloísio teve oportunidade de ver alguns pontos turísticos e históricos, não só em Lisboa, mas também em Cascais e Sintra. Destaca o Cabo da Roca, o ponto mais ocidental da Europa. «Nunca tinha visto um mar assim. Senti-me muito emocionado, sobretudo ao pensar que um dos meus antepassados veio desta parte do mundo. Tenho muito orgulho nas minhas raízes portuguesas», confessou.
Quando encontrar de novo, no início do novo ano lectivo, os seus colegas da USJ, Aloísio não hesitará em compartilhar com eles os momentos mais marcantes que viveu na capital portuguesa. Não esquecerá a cerimónia de «devoção ao Santíssimo Sacramento» na noite de vigília com o Santo Padre: um milhão e meio de jovens de tudo o mundo em silêncio total. «Inacreditável! Um silêncio assim é o maior grito de Fé!», exclamou Aloísio, que também não olvidará outro dos conselhos de Francisco: “Guardem o momento que mais vos marcar no vosso coração e usem-no quando se sentirem tristes ou abatidos”.
Joaquim Magalhães de Castro
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