TERCEIRO DOMINGO DA PÁSCOA – Ano A – 23 de Abril

TERCEIRO DOMINGO DA PÁSCOA – Ano A – 23 de Abril

A Eucaristia dominical é o antídoto para a desilusão pós-baptismo

Durante a Vigília Pascal quase duzentos catecúmenos de várias paróquias de Macau receberam os Sacramentos da Iniciação Cristã. Através do Baptismo adquirimos novos irmãos e irmãs em Cristo. Estou certo de que muitos dos presentes na liturgia se emocionaram grandemente.

Ao observar o derramamento da água sobre as suas cabeças, rezei no meu coração para que os recém-baptizados persistissem na Fé, especialmente nos momentos de dificuldade e dor, quando ao seguirem de Jesus chegarem ao pé da cruz. A Fé é um dom que não pode ser dado como certo e precisa de passar pelas provações destinadas a testar a nossa determinação e a aprofundar o nosso relacionamento com o Senhor. As razões para abandonar a Fé e deixar a Igreja são muitas e bem fundamentadas: a Igreja não está à altura do Evangelho, os católicos são hipócritas, o clero está envolvido em todos os tipos de escândalos, Deus parece completamente ausente quando precisamos d’Ele, as regras morais são muito rígidas, a Fé não faz diferença na nossa sociedade e assim por diante. O entusiasmo dos neófitos pode rapidamente transformar-se em desilusão, que geralmente se começa a manifestar com o abandono da Eucaristia comunitária dominical.

Os dois discípulos no caminho de Emaús descritos no Evangelho deste Domingo (Lc., 24, 13-35) podem ser considerados entre os primeiros crentes “caídos” de que há registo. A decepção deles para com Jesus é palpável: «Acreditávamos que fosse Ele quem havia de trazer a total redenção a Israel» (versículo 21). Em vez disso, estes homens testemunharam sua crucificação, o tipo de execução reservada a criminosos amaldiçoados pelos homens e por Deus. A sua esperança de uma nova vida desmoronou e voltaram para casa muito tristes.

Sabemos o resto da história. O Cristo ressuscitado aproximou-se deles, sem ser reconhecido, e citando as Escrituras revelou-lhes o profundo significado por trás do Seu sofrimento e morte. Quando enfrentamos dificuldades, muitas vezes concentramo-nos apenas no lado negativo da história e perdemos de vista o quadro geral. O Cristo ressuscitado fez-lhes compreender que o Seu sofrimento e a Sua morte faziam parte de um desígnio maior de amor, para o qual também eles foram convidados a contribuir. Os seus corações foram reacendidos: a sua escolha de seguir a Cristo não foi em vão, apesar de tudo.

Disse o Papa Francisco, na Audiência Geral de 7 de Dezembro de 2022, que a confirmação de uma boa escolha passa pela sensação de que tudo se encaixa. Na ocasião, deu até deu um exemplo interessante: «Na Praça de São Pedro, há dois pontos exactos – os focos da elipse – de onde se vêem as colunas de Bernini perfeitamente alinhadas. De maneira análoga, o homem pode reconhecer que encontrou o que procura, quando o seu dia se torna mais ordenado, sente uma integração crescente entre os seus múltiplos interesses, estabelece uma hierarquia correcta de importância e consegue viver tudo isto com facilidade, enfrentando com renovadas energia e força de espírito as dificuldades que se apresentam».

Recorrendo à mesma metáfora, os dois pontos focais a partir dos quais os dois discípulos começaram a realinhar as suas vidas foram as Escrituras e “o partir do pão”, que são o cerne de cada celebração eucarística: «Porventura não nos queimava o coração, quando Ele, durante a nossa jornada, nos falava, quando nos explicava as Escrituras?» (versículo 32). «Então os dois comunicaram o que havia ocorrido no caminho e como Jesus fora reconhecido por eles enquanto partia o pão. Jesus aparece aos discípulos» (versículo 35). A Eucaristia então construiu a Igreja: os dois discípulos põem-se imediatamente a caminho para se reunirem à comunidade.

Liturgia e vida quotidiana não podem ser separadas, nem colocadas em compartimentos distintos da nossa existência. No entanto, uma das maiores armadilhas da nossa vida cristã – especialmente para os católicos de longa data – é o enfraquecimento da relação íntima entre a adoração e as actividades do dia-a-dia. Deste modo, a Eucaristia dominical torna-se simplesmente uma rotina, uma obrigação a cumprir, um ritual desligado da realidade da nossa vida.

Pelo contrário, como escreveu recentemente o Papa Francisco: “O domingo, antes de ser um preceito, é um dom que Deus faz ao seu povo (por esse motivo a Igreja o guarda como um preceito). A celebração dominical oferece à comunidade cristã a possibilidade de ser formada pela Eucaristia. De domingo em domingo, a Palavra do Ressuscitado ilumina a nossa existência, querendo realizar em nós aquilo para que foi mandada (cf. Is., 55, 10-11). De domingo em domingo, a comunhão no Corpo e no Sangue de Cristo quer fazer também da nossa vida um sacrifício agradável ao Pai, na comunhão fraterna que se faz partilha, acolhimento e serviço. De domingo em domingo, a força do Pão partido nos sustenta no anúncio do Evangelho no qual se manifesta a autenticidade da nossa celebração” (Carta Apostólica Desiderio Desideravin.º 65).

Quando ocorrem provações e desilusões, sejamos recém-baptizados ou “velhos católicos”, é pois chegado o momento de nos reunirmos em comunidade, de relermos a nossa vida à luz das Escrituras e de partirmos juntos o pão. Levará tempo, mas garanto que eventualmente tudo se encaixará.

Pe. Paolo Consonni, MCCJ

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