A Criação e a Evolução serão crenças contraditórias?
As Sagradas Escrituras falam-nos em como, em seis dias, Deus criou o mundo visível. O Compêndio do Catecismo da Igreja Católica (nº 62) refere que “ao narrar os ‘seis dias’ da criação, a Sagrada Escritura dá-nos a conhecer o valor dos seres criados e a sua finalidade de louvor a Deus e serviço ao homem. Todas as coisas devem a sua existência a Deus, de quem recebem a sua bondade e perfeição, as suas leis e o lugar no universo”.
Quer isto dizer que não há lugar para conceitos como “evolução”? Não necessariamente. Antes de ser eleito Papa, o cardeal Ratzinger (“In the Beginning: A Catholic Understanding of the Story of Creation and the Fall” – “No Início: Uma Compreensão Católica da História da Criação e da Queda”) escreveu: “Não podemos dizer a criação, ou a evolução, na medida em que estas duas correspondem a duas realidades diferentes”.
Com respeito à criação, o cardeal Ratzinger refere: “A história do pó da terra e da respiração de Deus, que acabámos de ouvir, de facto não explica como as pessoas evoluíram e se desenvolveram para se tornarem no que são. Isto explica a sua origem mais íntima e lança uma luz sobre o projecto que elas constituem”.
Quanto à evolução, o cardeal sublinha: “Procura compreender e descrever desenvolvimentos biológicos. Mas ao fazê-lo não consegue explicar de onde apareceu o ‘projecto’ das pessoas humanas, nem a sua origem interior, nem a sua natureza própria”. E conclui: “Até este ponto confrontamo-nos com duas realidades complementares, em vez de mutuamente exclusivas”.
A 27 de Outubro de 2014, o Papa Francisco emitiu uma declaração para a Pontifícia Academia de Ciências: “A evolução na natureza não é incompatível com a noção de criação”. Segundo o Santo Padre, “[Deus] criou seres e permitiu que evoluíssem de acordo com a leis internas que Ele deu a cada um, de forma a que eles pudessem desenvolver-se e alcançar a sua plenitude de ser. Ele concedeu autonomia aos seres do universo ao mesmo tempo que os assegurava da Sua presença contínua, dando o ser a toda a realidade. E assim a criação continuou durante os séculos, milénios e milénios, até que se tornaram no que nós conhecemos hoje, precisamente porque Deus não é um demiurgo ou um mágico, antes um criador que dá o ser a todas as coisas. O ‘Big Bang’, que hoje em dia é considerado como a origem do mundo, não contradiz o acto divino de criar, mas antes necessita dele. A evolução da natureza não contrasta com a noção de criação, assim como a evolução pressupõe a criação de seres que evoluem”.
No entanto, a Igreja mantém a doutrina defendida pelo Papa Pio XII na sua encíclica “Humani generis” – “A Raça Humana” (1950), onde o Sumo Pontífice declara que a “Igreja não proíbe que pesquisa e discussões, por parte de homens experientes em ambos os campos, tenham lugar, no que diz respeito à doutrina da evolução, na medida em que investiga a origem do corpo humano como provenientes de matéria preexistente e viva”. Ainda assim, Pio XII deixou bem claro que a alma do homem é criada directamente por Deus – não pode evoluir da matéria porque é espiritual; e que todos os homens descendem de Adão e Eva, os quais transmitiram o pecado original à raça humana.
Ao fim dos seis dias, o Génesis 2:2-3 conta que “Deus acabou a sua obra, a qual tinha feito, e descansou ao sétimo dia de todo o trabalho que havia feito. Assim, Deus abençoou o sétimo dia e consagrou-o, porque nele descansou de toda a sua obra que ele havia feito na criação”.
São João Paulo explicou que tal não significa que Deus tenha “tirado uma soneca” no fim. “Seria banal interpretar o ‘descanso’ de Deus como uma espécie de ‘inactividade’ divina. Era como se que Deus ficasse a admirar, perante o trabalho muito bom (Génesis 1:31) que as Suas mãos tinham forjado, com o objectivo de lançar sobre ele um olhar pleno de alegria. Este é um olhar ‘contemplativo’, o qual não parece contemplar novas realizações, mas que goza da beleza do que já foi feito (Dies Domini, 1998 – Dia do Senhor). Assim, da mesma forma que imitamos o trabalho de Deus, também imitamos o Seu descanso; contemplamos o trabalho que [Deus] fez”.
Pe. José Mario Mandía