Servir a Igreja

A Cúria Romana

«Para exercer o poder supremo, pleno e imediato sobre a Igreja Universal, o Romano Pontífice vale-se dos Dicastérios da Cúria Romana. Estes, por conseguinte, em nome e com a autoridade dele, exercem seu ofício para o bem das Igrejas e em serviço dos Sagrados Pastores». Assim se define a Cúria Romana, em sentido lato, no Decreto Christus Dominus, 9, do Concílio Vaticano II (1965). A Cúria Romana é pois o conjunto de dicastérios e organismos que apoiam o Papa no exercício da sua missão pastoral, para melhor servir a Igreja em todos os seus aspectos, na sua missão no mundo, com vista ao reforço da unidade da fé e comunhão do Povo de Deus.

Os Papas, praticamente desde S. Pedro, recorreram à ajuda de diversas pessoas ou organismos para melhor cumprir as funções para que vêm sendo designados, no governo da Igreja. Ao longo dos séculos, esses organismos foram-se agrupando, organizando, de diversas maneiras, acompanhando a evolução da Igreja, no plano pastoral como institucional. Depois do século XI, quando os cardeais entram em cena de forma mais activa e institucionalizada, os Sumos Pontífices chamaram-nos a colaborar no governo da Igreja. A partir do século XIII, os cardeais reúnem-se em Consistório para colaborarem com os Papas, reforçando o peso institucional dos organismos de apoio ao governo da Igreja. Assim, o Papa Sisto V, pela Constituição Apostólica Immensa Aeterni Dei, de 22 de Janeiro de 1588, criou quinze discastérios, com a pretensão de agrupar os cardeais em 15 congregações ou colégios, para assuntos específicos. Aqui poderá ter nascido a Cúria Romana, tal como a conhecemos na actualidade.

Todavia, a Cúria tem sido reestruturada ao longo dos últimos quatro séculos, até ao Regulamento de 30 de Abril de 1999, com base na Constituição Apostólica Pastor Bonus (que substitui a Regimini Ecclesiae Universae, de Paulo VI, de 1980), que é a normativa suprema da Cúria, promulgada pelo incansável reformador da Igreja, o Papa S. João Paulo II, de tão boa memória. Corria o ano de 1988 (28 de Junho), embora já tivesse sido reformulada, do ponto de vista jurídico, pela revisão do Código de Direito Canónico de 1983. Também levada a efeito, ora bem, pelo Papa S. João Paulo II. Num esforço de reforma que vinha desde 1917, para regularização da Cúria, instituição que chegara a ser “hereditária”, com cargos a ficarem em dinastias de cardeais oriundos de várias famílias, quase como numa monarquia, para além de uma hierarquia baseada nesses pressupostos.

Hoje em dia Cúria é composta, como já dissemos, por um conjunto de instituições que se denominam dicastérios. Mas o que é um dicastério, afinal? Como termo, provém do grego δικαστήριον (“dikasterion”, “tribunal”). No plano institucional, os dicastérios são departamentos ou organismos especializados da Cúria Romana que, sob a direcção do Santo Padre, exercendo funções legislativas, executivas ou judiciais, numa coordenação inter-funcional centralizada para melhor organização e funcionamento da Igreja. O Papa confere a cada dicastério uma função especializada do Governo. Não se deve todavia pensar que a Cúria Romana é a cúria da diocese de Roma, como todas as dioceses têm, para a sua administração. As funções desta cúria diocesana são desempenhadas pelo Vigário Geral de Sua Santidade para a Cidade de Roma, tradicionalmente um cardeal, com título de arcebispo, delegado pelo Papa, mas em plano de igualdade a todas as outras diocese do mundo.

Na organização da Cúria Romana, os dicastérios, enquanto estrutura colegial de organização, podem ser de quatro tipos: Congregações, Conselhos Pontifícios, Tribunais e Ofícios, para além da Secretaria de Estado. Esta última é constituída pela Secretaria de Estado propriamente dita e pelo Óbulo de S. Pedro (ajuda económica que os fiéis oferecem ao Santo Padre, para caridade aos mais necessitados). As Congregações são as seguintes: Doutrina da Fé; Igrejas Orientais; Culto Divino e Disciplina dos Sacramentos; Causas dos Santos; Evangelização dos Povos; Clero; Vida Consagrada e as Sociedades de Vida Apostólica; Educação Católica; Bispos. Nos Tribunais, temos a Penitenciaria Apostólica, a Assinatura Apostólica e a Rota Romana. Nos Conselhos Pontifícios, temos: Leigos; Promoção da Unidade dos Cristãos; Família; Justiça e Paz; Cor Unum (Humanismo e Caridade); Pastoral dos Migrantes e Itinerantes; Pastoral no Campo de Saúde; Textos Legislativos; Diálogo Inter-religioso; Cultura; Comunicações Sociais; Promoção da Nova Evangelização. O Sínodo dos Bispos, como organismo, faz parte da Cúria Romana.

Também os Ofícios (Câmara Apostólica; Administração do Património da Sé Apostólica; Prefeitura dos Assuntos Económicos da Santa Sé), as Comissões Pontifícias (Ecclesia Dei; Bens Culturais da Igreja; Arqueologia Sacra; Comissão Pontifícia Bíblica; Teológica Internacional; Catecismo da Igreja Católica; América Latina), a Guarda Suíça Pontifícia, as chamadas Instituições Ligadas à Santa Sé (Arquivo Secreto Vaticano; Biblioteca Apostólica Vaticana; Tipografia Vaticana; L’Osservatore Romano; Livraria Editora Vaticana; a Rádio Vaticano; Centro Televisivo Vaticano; as Basílicas Papais de S. Pedro, de S. João de Latrão, de S. Paulo Fora dos Muros e a de Santa Maria Maior; a Elemosineria Apostólica; a AVEPRO – Agência da Santa Sé para a Avaliação e a Promoção da Qualidade das Universidades e Faculdades Eclesiásticas, e a Autoridade de Informação Financeira), os Serviços Centrais do Trabalho, as Academias Pontifícias (Ciências; Ciências Sociais; para a Vida; S. Tomás de Aquino; de Teologia; Mariana Internacional; de Belas Artes; Romana de Arqueologia; Cultorum Martyrum – Culto dos Mártires; Eclesiástica; de Latinidade) e os Pontifícios Comités (Congressos Eucarísticos Internacionais, Ciências Históricas) compõem a Cúria Romana. À frente de cada dicastério está um Prefeito (Congregações) ou um Presidente (para os outros dicastérios), apoiados por Secretários e Subsecretários. Os membros de cada dicastério reúnem-se em assembleias plenárias ou sessões ordinárias. Além dos membros, há também consultores ou até relatores.

A função pastoral da Cúria Romana é desempenhada por sacerdotes, que deverão cumprir, para além das suas funções curiais, com as suas funções essenciais de presbíteros, a cura das almas. Assim se consigna nas Constituições Apostólicas, e assim se espera deva ser. Mas acima de tudo, a Cúria existe para o serviço do Papa e, portanto, da Igreja, para o melhor cumprimento de todos os objectivos desta.

Vítor Teixeira

Universidade Católica Portuguesa

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