Será que só vai à estalada?

Enquanto o vasculhar no caixote do lixo do “Panama Papers” vai dando que falar entre os media e a curiosidade pública, causando calafrios a alguns ilustres mundiais, entre os quais mais de 200 portugueses “afortunados”, Portugal sorriu com um episódio político caricato, que teve como actores o ministro da Cultura e dois cronistas da imprensa escrita.

O ministro João Soares (filho de Mário Soares) não gostou de algumas críticas que lhe foram feitas pelos dois cronistas da imprensa e, vai daí, através das redes sociais ameaçou-os com um par de estaladas, à boa maneira do PREC, no tempo do seu pai.

O Primeiro-Ministro, António Costa, não gostou da linguagem do seu ministro e “puxou-lhe as orelhas”, declarando publicamente que os ministros não podem esquecer que são ministros, mesmo à mesa do café. Resultado: o ministro demitiu-se em nome da sua “liberdade de expressão”.

Para o essencial do que quero dizer pouco interessa se os cronistas tinham razão ou não nas críticas que fizeram ao ministro, nem se essas críticas eram justas ou ofensivas da dignidade do senhor. Sabemos que os titulares de cargos públicos estão sempre sujeitos às opiniões contrárias e que, nessa qualidade, são obrigados a engolir muitos sapos, sem perder as estribeiras da linguagem oral ou física. Situação que justifica a atitude de António Costa em fazer soar as “sinetas de alarme” ao seu ministro.

Mas o que eu acho mais interessante em toda esta “ópera bufa”, que se criou num país mergulhado em verdadeiros e sérios problemas que não este, foi a posição pública de João Soares ao ter-se demitido. Segundo ele, fê-lo em nome da “liberdade de expressão”. E aqui, pese embora a sua deselegância ministerial em oferecer um par de estaladas aos seus críticos, tenho dúvidas que, muitas vezes, oferecer um bom par de tabefes não possam fazer parte do nosso léxico libertário perante muitos actores da vida pública, nomeadamente aqueles cuja acção tanto tem contribuído para o empobrecimento do nosso povo e do País em geral.

Refiro-me, nomeadamente, aos banqueiros, reguladores, administradores, financeiros e políticos coniventes e distraídos com os sucessivos “desastres” da Banca nacional.

Em todos os casos anteriores, e agora a propósito do Banif, é de bradar aos céus assistir aos inquéritos parlamentares e ouvir as respostas dos inquiridos Não sei,… não fui eu,… ninguém me disse,… não é do meu pelouro,… foi o outro, etc., etc.

Ninguém assume a culpa de nada. Estavam todos a “dormir” e a culpa vai morrendo solteira. Entretanto, o povo paga! E a vontade do povo de lhes oferecer uns “bons sopapos”, para ver se os acordam para a verdade, não pára de crescer.

O BPN de Oliveira e Costa e os seus favores aos “amigos”; o BPP e as “espertezas” de João Rendeiro; o BES de Ricardo Salgado e os seus involutos administradores, num silêncio do “Espírito Santo” face às novas “offshores” do Panamá; o desastre anunciado do Novo Banco; o Banif, transformado num autêntico mini-BES, com as custas adicionais por ter caído de maduro; o BCP de Jardim Gonçalves (o da reforma milionária), a esperada devolução dos dinheiros públicos e a possível ameaça (OPA) do “apetite” financeiro espanhol; as “diatribes” do BPI e a eventual (necessária) capitalização da CGD foram (e a conta não fica por aqui) os responsáveis pelo “peditório nacional”, que levou já os portugueses a dar mais de 13 mil milhões de euros para salvar o nosso sistema financeiro e a serem ameaçados com um aumento da factura.

Bem sei que o actual Governo de Portugal tem em vista retirar dos bancos portugueses todo o “lixo tóxico” e enviá-lo para um banco “podre”, como medida de prevenção contra futuras crises do nosso sistema financeiro. Mas só espero que tal medida correctiva não venha a “intoxicar” ainda mais os doentes que, em última instância, somos nós! Também sei que o ministro da Cultura não tem direito de ameaçar os seus opositores com um par de estaladas, em nome da sua liberdade de expressão. A diplomacia “oblige”, ponto!

Mas os portugueses, de acordo com a sua vernácula “cultura” lusitana, depois do “estaladão” financeiro que já pagaram e do que eventualmente os espera, também têm todo o direito à sua “liberdade de expressão”, propondo-se agir contra este estado de coisas, oferecendo a todos estes sanguessugas dos dinheiros públicos um bom par de estalos, para além de outras medidas (também correctivas), como obrigá-los a comer o seu próprio “lixo tóxico”.

LUIS BARREIRA

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