E entretanto, chegámos a 2020! Ainda parece que há bem pouco tempo estávamos todos a festejar o início de 2019, e no entanto já estamos de pés bem assentes na segunda década do segundo milénio. Foi a terceira passagem de ano que celebrámos em Portugal desde que aqui assentámos arraiais em 2016. No ano passado a quadra do Natal e o Ano Novo foram vividos num clima bem quente, a bordo do nosso veleiro, entre as ilhas holandesas de Aruba, Curaçao e Bonaire, o Haiti e as Bahamas.
Depois de tantos anos a viver em Macau, e mais uns quantos a viver no clima tropical das Caraíbas, passar o Inverno em Portugal ainda custa um pouco. Não que o frio seja por aí além, o problema é que a maioria das casas em Portugal não estão, simplesmente, preparadas para temperaturas abaixo dos quinze graus.
Regra geral, a semana antes do Natal, a semana antes do fim-de-ano e a primeira semana do novo ano são, para nós, de grande azáfama. A de preparação do Natal teve maior carga porque, como expliquei numa crónica anterior, coube ao casal com menos anos e experiência nas tradições natalícias portuguesas preparar a não menos tradicional ceia. Afinal, pelo que nos foi dado a saber, até correu muito bem! Já a semana antes da passagem de ano foi de recuperação e descanso.
O adeus a 2019 e as boas-vindas a 2010 foram dados na Praia de Mira, onde vimos o fogo-de-artifício e dormimos na auto-caravana, estacionados junto ao lago da barrinha (o nome do lago de água doce que existe na Praia de Mira). Pena que nessa noite, sem que ninguém o esperasse, o nevoeiro decidiu aparecer e reduziu o espectáculo de fogo-de-artifício a um mero evento onde nada se viu e mal se conseguiu respirar devido à exagerada concentração de fumos da combustão da pólvora e de todos os outros ingredientes que fazem a miríade de cores e efeitos dos espectáculos de fogo-de-artifício. Ficámos um pouco desiludidos mas, infelizmente, ninguém pode ser culpado por caprichos da natureza. Para compensar a nossa desilusão, decidimos fazer uma viagem de ano novo ao Sul de Portugal. Como tínhamos tempo e disponibilidade, rumámos a Sul, via Estrada Nacional 2.
A nossa Estrada Nacional 2 é considerada a congénere da Route 66 dos Estados Unidos, e nos últimos anos tem sido alvo de variadas campanhas, mais ou menos oficiais, para divulgação das suas atracções. A reboque dessas campanhas mediáticas, a pouco e pouco, fui seduzido pelos seus encantos.
Para quem não sabe, como eu também não sabia até há bem pouco tempo, a Estrada Nacional 2, ou EN 2, integra a rede nacional de estradas de Portugal. Actualmente é formada por cinco troços: Santa Marta de Penaguião – Peso da Régua (A24), Góis (N342) – Portela do Vento (N112), Sertã (IC8) – Abrantes (IP6), Ervidel (N18) – Aljustrel (N263) e Castro Verde – Faro, de acordo com dados disponibilizados na Wikipedia em Português.
A estrada foi construída em 1945 com o objectivo de ligar Chaves a Faro, contando hoje com uma extensão de 739,260 quilómetros. “Corta” Portugal em duas metades – de Este a Oeste – e cruza onze distritos. A Norte passa por cidades de grande dimensão como Viseu, Vila Real, Chaves e Lamego. No Centro e Sul apenas se destaca a cidade de Faro. O restante do percurso atravessa vilas e aldeias de menor dimensão, que de forma positiva emprestam um charme especial a esta via alternativa de viajar e visitar Portugal.
As campanhas de promoção deste itinerário surgiram em 2016, depois dos edis dos municípios atravessados pela EN2 se terem unido e organizado. Para que a viagem fique completa e as memórias possam ser guardadas de forma mais eficaz, existe mesmo um passaporte.
“Antes de partir, e para ficar com uma recordação que comprove a passagem por esta via, muna-se do respectivo passaporte que poderá obter num Posto de Turismo e sempre que parar para visitar as várias localidades não se esqueça de procurar o carimbo que comprova a sua presença”, explica a página oficial do Turismo de Portugal.
Para se cumprir o trajecto na íntegra a viagem tem de começar junto ao marco que assinala o quilómetro 0 (zero), na rotunda perto do jardim público de Chaves, e acabar na Doca de Faro, bem a Sul do País.
Aproveitamos a ida a Sul, não apenas para festejar o ano novo e compensar o desaire que foi o fogo-de-artifício na Praia de Mira, mas também para visitar o nosso fornecedor de produtos tailandeses. Juntando o útil ao agradável, e porque a Maria ainda estava de férias, fomos andando devagar, sem quaisquer planos, parando onde e quando queríamos, rumo a São Teotónio, bem na Costa Vicentina.
Conduzimos entre a Vila de Mora (distrito de Évora) e Castro Verde (distrito de Beja), onde tivemos de seguir em direcção ao litoral para conseguirmos chegar ao nosso destino. Pernoitámos em Santiago do Escoural, estacionados ao lado da igreja, e de manhã fomos tomar o pequeno-almoço num pequeno café cheio de locais que olharam para nós como se fôssemos de outro mundo. Uma família de fora, com uma asiática e uma euro-asiática. Mas rapidamente nos deram a entender que por aquelas paragens todos são bem-vindos.
À saída, no regresso à auto-caravana, tive a oportunidade de compreender porque é que os passeios que ladeiam as estradas desta vila me pareciam tão brancos. Andei curioso durante vários quilómetros até conseguir ver que são feitos de mármore. Não sei se será caso único em Portugal mas para mim foi uma completa novidade.
Ficámos de tal maneira bem impressionados que já decidimos que iremos percorrer a Estrada Nacional 2, de Norte a Sul, num futuro próximo para tentar descobrir mais pormenores deste país cheio de surpresas e encantos.
João Santos Gomes