Uma nova escalada
Na viagem apostólica ao Chile e Peru, o Papa Francisco afirmou que «basta um incidente qualquer para activar o gatilho da guerra», confirmando ter receio de um conflito nuclear mundial.
Não é para menos. O SIPRI, Instituto Internacional de Investigação para a Paz que observa o comércio mundial de armas, afirma, num relatório publicado em 2017, que desde 2012 existiu um aumento de mais de oito por cento na despesa com o armamento a nível mundial.
Que o Presidente americano, Donald Trump, tenha anunciado um aumento das despesas militares pode não surpreender, sendo preocupante que tal ocorra sobretudo na área do armamento nuclear, mas é significativo o facto de a Suécia, um país neutral e pacífico, ter retomado o serviço militar obrigatório. A Rússia não quis ficar atrás e tem vindo a demonstrar uma forte capacidade militar, aumentando o seu potencial nuclear. A China e a Índia, potências nucleares, aumentaram, em relação a 2016, em sete por cento e treze por cento, respectivamente, as despesas com armamento, além de uma quantidade considerável de Estados no Médio Oriente. Os números parecem do tempo da Guerra Fria, mas o quadro torna-se inquietante, parecendo uma vaga de armamento que vai acontecendo, numa desordem mundial, sem nexo e de forma massiva de tudo contra todos. É o propagar de uma mentalidade perigosa que pode levar a situações de crise, que vão além das intenções, terminando em conflitos fora de controlo.
«É preciso eliminar as armas nucleares, trabalhar pelo desarmamento», afirmou, ainda, o Papa Francisco, como que acalentando o sonho para que nasça outra vaga de fundo, que se oponha aos mercados das armas e dos arsenais repletos, que seja um movimento de pressão pela paz na opinião pública.
Entretanto, outras guerras vão sucedendo, noutros palcos e de alcance internacional. Basta ver o que vai acontecendo, a nível mundial, nas confrontações através de meios electrónicos e informáticos.
Além da ameaça que põe em causa a vida do cidadão comum, os custos da corrida ao armamento são enormíssimos – perto de dois biliões de euros – podendo aplicar-se noutras batalhas, como na luta contra a fome – onde dez por cento da despesa mundial em armamento bastaria para alcançar os objectivos globais da erradicação da fome e da pobreza em quinze anos, no tratamento de doenças, como o cancro, que parece tornar-se, cada vez mais, numa doença crónica, e no esforço gigantesco que deverá ser feito para se recuperar a sustentabilidade do planeta, devido ao desperdício, à subida do nível de dióxido de carbono (CO2), etc., sem esquecer toda a problemática dos 250 milhões de refugiados que procuram abrigo e formas de sobrevivência.
É necessária uma mentalidade alicerçada nos ensinamentos do Evangelho senão o «crescimento da iniquidade vai resfriar o amor de muitos» (Mt., 24,12), como recorda o Papa Francisco, que convida à prática dos pilares da Quaresma – a oração, o jejum e a esmola – para que não «arrefeça em nós a caridade», correndo o risco, perante a ilusão da felicidade a preço de saldo e a indiferença, que o «amor se apague». Abrir-se em espírito de generosidade é tomar parte da Providência de Deus, que «nos dá sempre novas oportunidades para amar», de forma a que, na escalada do amor cristão, o coração «volte a arder de fé, esperança e caridade».
Pe. Francisco Rebelo
Director da Família Cristã