O Atleta de Deus

O poder do Espírito Santo

A ENCARNAÇÃO DO VERBO LEMBRA-NOS A ACÇÃO ENTRE O “FIAT” DE NOSSA SENHORA E OS DESÍGNIOS DE DEUS

A poucos dias do Natal, a comunidade católica um pouco por todo mundo anseia pelo momento alto após o Advento – a celebração da Natividade do Menino Jesus. A Encarnação do Verbo deu-se numa jovem imaculada, a Virgem Maria, pela sua cooperação com o poder do Espírito Santo. Num gesto de fé e humildade, a Mãe do Senhor disse: «fiat» (faça-se), colaborando no mistério da Encarnação no seu ventre – «Eis a serva do Senhor, faça-se em mim segundo a tua palavra» (Lucas, 1:1-38). Este “fiat” remete-nos ao “fiat lux” (faça-se luz) na abertura da narrativa do Livro do Génesis, quando o Espírito de Deus criava o mundo. Nossa Senhora não é apenas uma participante passiva no Plano Salvífico de Deus, mas activa em união com o Espírito Santo, o Paráclito.

Maria Santíssima é um exemplo de vivência da fé. A Mãe que nos foi dada na Cruz por Jesus é uma mãe que espera também pelo nosso “fiat”, para nos encaminhar ao Filho, por caminhos que aos homens são inatingíveis. O Catecismo da Igreja Católica (CIC) diz-nos que no termo desta missão do Espírito, Maria torna-se a “Mulher”, a nova Eva “mãe dos vivos”, Mãe do “Cristo total”. Ela que esteve presente com os Doze, “num só coração, assíduos na oração” (Actos dos Apóstolos, 1:14), “no alvorecer dos ‘últimos tempos’, que o Espírito vai inaugurar na manhã do Pentecostes, com a manifestação da Igreja” (CIC nº 726). A Igreja nasce assim ungida pelo Espírito Santo, como Jesus tinha prometido antes de ascender aos Céus. A Sua promessa profética é descrita por São Lucas no Livro dos Actos: «Não vos compete saber os tempos nem os momentos que o Pai fixou com a sua autoridade. Mas ides receber uma força, a do Espírito Santo, que descerá sobre vós, e sereis minhas testemunhas em Jerusalém, por toda a Judeia e Samaria e até aos confins do mundo» (Actos dos Apóstolos, 1:7-8).

O Espírito Santo está presente nas Escrituras, sendo Ele a fonte da Revelação Divina: «De facto, toda a Escritura é inspirada por Deus e adequada para ensinar, refutar, corrigir e educar na justiça, a fim de que o homem de Deus seja perfeito e esteja preparado para toda a obra boa» (2 Timóteo, 3:16-17). São Pedro, numa das suas cartas, confirma as revelações de São Paulo, dizendo: «Porque jamais uma profecia foi proferida pela vontade de um homem; mas, sendo movidos pelo Espírito Santo é que certos homens falaram da parte de Deus» (2 Pedro, 1:21).

Na continuidade desta reflexão, que nos encaminha para a importância do Espírito Santo na vida da Igreja, em cada cristão membro do Corpo de Cristo (1 Coríntios, 12:27; Romanos, 12:5), lembramos as palavras do Senhor que nos dá com clareza o pedido e a oração que cada cristão deve elevar a Deus, numa analogia entre o pai terreno e o Pai Celeste: «Pois se vós, que sois maus, sabeis dar coisas boas aos vossos filhos, quanto mais o Pai do Céu dará o Espírito Santo àqueles que lho pedem!» (Lucas, 11:13). Jesus deixa claro que o melhor que poderá vir do Pai para cada um dos Seus filhos é o Espírito Santo. A presença do Espírito Santo vem iluminar a alma, e nessa presença Divina o homem recebe as graças rumo à sua santidade e salvação, em união com os seus esforços, lutando contra o pecado e as más inclinações.

ENSINAMENTOS DE “STARETS”, UM MONGE RUSSO

São Serafim de Sarof, nascido em 1759, em Kursk (Rússia), com o nome de Prokhor Moshnin, era um homem de grandes dons espirituais e proféticos, tendo sido agraciado por uma visão de Nossa Senhora no final da sua vida. Ele atraiu muitos seguidores e era chamado de “Starets” que em Russo significa “mestre (pai) espiritual”.

É um dos santos mais conhecidos da Igreja Ortodoxa Russa. Nos seus ensinamentos enfatizava ser o Espírito Santo a fonte de luz que transfigurava a alma dos místicos.

Num diálogo com Nicolas Motovilov, um leigo russo que deixou escrito um encontro notável com São Serafim numa floresta da Rússia central (próximo do mosteiro de Sarov), o sacerdote monge revelou a Motovilov a verdadeira meta da vida cristã, dando-lhe a resposta que há muito procurava na vivência da sua fé: «A oração, o jejum, as vigílias e outras actividades cristãs, tão boas quanto possam parecer em si, não constituem a finalidade da vida cristã, ainda que ajudem a chegar a ela. O verdadeiro objectivo da vida cristã consiste na aquisição do Espírito Santo de Deus». Neste diálogo merecedor de leitura integral, São Serafim inúmera várias linhas do seu pensamento, falando da manifestação da graça e como ela se manifesta nos homens que ilumina: «A graça do Espírito Santo é Luz. Toda a Sagrada Escritura fala disso. David, o antepassado do Deus homem, disse: “A Tua palavra é lâmpada para os meus pés, e luz para o meu caminho”» (Salmos, 118; 105).

Motovilov pedia constantemente para perceber a presença do Espírito Santo em si, ouvindo os exemplos que São Serafim lhe ia transmitindo. É fascinante o que a certo ponto nos revela a narrativa do diálogo. Motovilov, quando tomado por um forte aperto nos ombros pelo padre Serafim que lhe pergunta «estamos ambos, vós e eu, na plenitude do Espírito Santo. Por que não me olhais?», responde algo que nos lembra a transfiguração do Senhor no monte Tabor: «Não posso, padre, olhar-vos. Brotam raios de vossos olhos. O vosso rosto tornou-se mais luminoso do que o Sol. Os olhos doem-me…». O padre Serafim nesse momento descansa-o dizendo: «Não tenhais medo, amigo de Deus. Também vos tornastes tão luminoso quanto eu. Vós também estais agora na plenitude do Espírito Santo, de outro modo não teríeis podido ver-me». Motovilov descreve que São Serafim, inclinando a cabeça sobre ele, murmurou-lhe ao ouvido: «Agradecei ao Senhor por vos ter concedido esta graça indizível. Vistes, nem mesmo fiz o sinal da cruz, no meu coração, em pensamento somente, rezei: “Senhor, tornai-me digno de ver claramente, com os olhos da carne, a descida do Espírito Santo como a teus servidores eleitos quando te dignaste aparecer-lhes na magnificência de tua glória!”. E imediatamente Deus atendeu a humilde oração do miserável Serafim. Como não agradecer-lhe por esse dom extraordinário que a nós dois ele concede? Não é também sempre aos grandes eremitas que Deus manifesta assim a sua graça. Como mãe amorosa, essa graça se dignou consolar o vosso coração desolado, a pedido da própria Mãe de Deus».

O Catecismo da Igreja Católica fala-nos que “o Espírito Santo age juntamente com o Pai e o Filho, desde o princípio até à consumação do desígnio da nossa salvação. Mas é nestes ‘últimos tempos’, inaugurados com a Encarnação redentora do Filho, que Ele é revelado e dado, reconhecido e acolhido como Pessoa. Então, esse desígnio divino, consumado em Cristo, ‘Primogénito’ e Cabeça da nova criação, poderá tomar corpo na humanidade pelo Espírito derramado: a Igreja, a comunhão dos santos, a remissão dos pecados, a ressurreição da carne, a vida eterna” (CIC nº 686).

Ainda no Catecismo lemos que “o termo ‘Espírito’ traduz o termo hebraico ‘Ruah’ que, na sua primeira acepção, significa ‘sopro’, ’ar’, ‘vento’. Jesus utiliza precisamente a imagem sensível do vento para sugerir a Nicodemos a novidade transcendente d’Aquele que é pessoalmente o Sopro de Deus, o Espírito divino” (CIC nº 691).

Que neste Natal, o Menino Jesus conceda a graça de um avivamento do Espírito Santo sobre a Sua Igreja como aconteceu em Pentecostes e que este desejo cresça no coração dos homens – a todos os que procuram união com a Santíssima Trindade, a Santa Mãe de Deus, os Anjos e Santos.

Veni Sancte Spiritus!

Miguel Augusto

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