O “fantasma” dos impostos

Andam por aí alguns portugueses muito preocupados e exaltados com a intenção do Governo em lançar mais impostos sobre a riqueza, no próximo Orçamento Geral do Estado para 2017, declarando permanentemente que Portugal caminha para o abismo.

Referindo-me ao tão badalado imposto, antes mesmo de se conhecer os detalhes e o conteúdo desta nova fiscalidade, dizem que é “um acto criminoso”, que é “um ataque à classe média”, que é “um atentado à economia de Portugal”, etc….

Como não conheço (nem ninguém conhece) as incidências particulares deste novo imposto, não vou falar sobre o mesmo. Antes prefiro falar sobre outros aspectos ligados à realidade de Portugal, ao invés de gritar “bitaites” sobre a injustiça deste imposto, que toda a gente ignora.

O que eu conheço, considerando a fiabilidade de investigação de duas prestigiadas instituições, como é o caso do INE (Instituto Nacional de Estatísticas) e da FFMS (Fundação Francisco Manuel dos Santos), relacionadas com o desenvolvimento económico e social no País, é que:

– O desemprego, um dos maiores flagelos nacionais, está a descer desde Fevereiro deste ano;

– Face a uma situação global de retracção económica, as exportações não atingem os objectivos planeados pelo Governo, mas as importações diminuíram, tal como o consumo das famílias (talvez os portugueses tenham aprendido a lição do excessivo endividamento), não aumentando o défice comercial e mantendo as contas do Estado em boa forma. Esta situação conduziu já a Comissão Europeia a afirmar que, até Maio deste ano, a execução orçamental “decorreu conforme previsto” e três agências de “rating” a afirmarem que Portugal está numa perspectiva estável e, portanto, não antevendo nenhum tipo de crise.

Todos reconhecem que o actual Governo português, até pela maioria parlamentar que o apoia, tem vindo a repor uma boa parte das melhorias sociais que foram abusivamente retiradas pelos Governos anteriores e que causaram uma desenfreada desigualdade entre os portugueses, durante os períodos de crise mais aguda. Situação que só pode ser compreendida porque, nestes períodos, a rentabilidade do capital cresce a um ritmo superior ao da economia. Senão vejamos:

Entre 2009 e 2014, o número de portugueses pobres subiu 116 mil. O estudo da FFMS revela ainda que, no mesmo período, os dez por cento mais pobres perderam 25 por cento dos seus rendimentos, a contrastar com os mais ricos que apenas perderam treze por cento.

A acentuada desigualdade social no País conduziu a que, entre os 28 países da União Europeia, Portugal ocupe o desonroso nono lugar dos países com maior nível de desigualdade.

Portugal tornou-se, assim, entre os nove países da zona euro analisados pelo Banco Central Europeu, o terceiro país com uma maior concentração de riqueza, apenas atrás da Áustria e da Alemanha, em que 1 por cento das famílias é responsável por trinta por cento da riqueza nacional. Os pobres ficaram ainda mais pobres, com menos dinheiro para gastar, aumentando a intensidade da pobreza em trinta por cento, ou seja, em 2014, cerca de 2,5 milhões de portugueses encontraram-se na situação de pobreza.

Por outro lado, no País, considera-se o salário líquido mensal de 422 euros como estando no limiar da pobreza. Sabendo que o salário mínimo nacional, onde se integram 21,4 por cento dos trabalhadores, é de 530 euros e que, retirando os descontos, fica em 471,7 euros, a diferença até à pobreza é de 128 euros, ou seja, é mínima!

Se, por exemplo, em 2014 alguém tivesse um salário líquido de dois mil euros, podia dar-se por muito feliz porque 85,2 por cento dos trabalhadores portugueses tinham um rendimento líquido inferior ao seu…

Quando se fala em impostos a aplicar aos cidadãos portugueses e se clama contra a injustiça do acto, sem ter em conta a realidade mais geral dos concidadãos e não reconhecendo que quanto maior é a desigualdade maior é a pobreza, fala-se no abstracto, na ignorância ou com intencionalidade perversa.

Não tendo nós uma economia próspera, que permita um desenvolvimento social mais harmonioso, torna-se necessário diminuir o enorme fosso entre ricos e pobres, distribuindo melhor os rendimentos, ou seja, taxando mais os primeiros.

Não se trata de retirar rendimentos à chamada classe média que, embora ninguém a saiba definir em Portugal, é uma classe intermédia essencial à ascensão social. É uma questão de justiça perante um povo sacrificado e, na sua maioria, pobre ou prestes a atingir esse estatuto.

LUIS BARREIRA

Leave a Reply

Your email address will not be published. Required fields are marked *