“Paulo, Apóstolo de Cristo”.
Os apóstolos Paulo e Pedro são considerados os pilares em que assenta a Igreja Católica Apostólica Romana. O filme sobre o apóstolo Paulo, que hoje estreia nos Estados Unidos, intitulado “Paul, Apostle of Christ”, antevê-se de grande qualidade, não só em termos cinematográficos, como sendo fiel às escrituras e tradição da Igreja. Prova disso, é o debate inspirador organizado recentemente na Universidade Franciscana de Steubenville (Estados Unidos), liderado por Raymond Arroyo, jornalista da EWTN (Eternal Word Television Network), com o actor Jim Caviezel, que representa o papel de Lucas, o produtor executivo Eric Groth e o teólogo Scott Hahn. Os convidados são homens de vivência e fé profunda. O filme será um catalisador para o espectador se deixar envolver por um dos apóstolos mais fervorosos e evangelizadores da Igreja primitiva. Prova textual são as suas inúmeras viagens, todo o sofrimento e perseguição que suportou em nome de Cristo e os frutos de inspiração divina (as treze cartas neo-testamentais que nos deixou e que fazem parte dos 27 livros do Novo Testamento). O filme retrata também a relação íntima de amizade entre Paulo e Lucas. Os escritos destes apóstolos formam mais de metade dos livros do NT. A conversão de Paulo, a sua missão e obra evangelizadora é certamente uma das mais notáveis da história do Cristianismo. Chegando a dizer-nos na sua carta aos Gálatas: «Já não sou eu que vivo, mas é Cristo que vive em mim» (GL., 2:20).
Raymond Arroyo modera o painel de convidados e inicia o debate com uma série de perguntas, dirigindo-se ao actor Jim Caviezel: «Gostaria de perguntar ao painel, porquê esta história de São Paulo? E porquê agora? O Jim tem recebido ofertas, eu sei, depois da Paixão de Cristo, para actuar como apóstolo, santo, vilão, Jesus novamente. Porquê este papel? Porquê Lucas? E por que demorou tanto para estar de volta a um épico bíblico?».
Jim Caviezel esboça um sorriso: «Essa é uma pergunta longa. Quando olhei para a Paixão de Cristo vi um óptimo roteiro. Mel Gibson tinha saído com “Braveheart”, é um director notável e não tive como desviar-me desse papel (“A Paixão de Cristo”)». Este filme é incrível – afirma Jim – ressaltando que também têm um roteiro fantástico.
Quando o filme estava praticamente pronto, Jim trouxe uma pessoa para assistir. Ela não conhecia Deus nem nenhuma religião. Jim queria apenas ouvir o que diria. «Disse-me que era um excelente filme e que o escritor era um génio, que era um filósofo. Perguntei-lhe o que destacava? Respondeu: Viver é Cristo, morrer é ganho! Esse é um conceito muito interessante», contou, acrescentando: «Disse-lhe que isto está na Bíblia. E então exclamou: Oh, está?». Alguns dias depois, Jim foi contactado: «Sabe, eu talvez queira ver a sua “Paixão de Cristo”, e eu logo me prontifiquei: Ok, eu vou buscar uma cópia. Ele retorquiu: Espere, eu digo que talvez queira ver… Pelo menos ele planeja ver; obtivemos o efeito que procurávamos».
Raymond Arroyo teve o privilégio de já ter visto o filme “Paul, Apostle of Christ”. Destaca o momento na prisão em que Jim (Lucas) ensina às pessoas o Pai Nosso, quando estas estavam prestes a serem entregues ao “circo” de Nero e atiradas aos leões, e pergunta a Jim se naquela cena houve alguma preocupação ou hesitação à volta desse tempo bíblico ou com o desempenho, fazendo-o parecer com Jesus?
Vale a pena meditar na resposta de Jim Caviezel: «Não me importei porque queria que o mundo visse Jesus em Lucas. Não estamos no nosso melhor, quando o mundo vê Jesus em cada um de nós?».
Aproveitando uma pergunta da audiência, Raymond Arroyo interpela Jim sobre se o facto de ter actuado como Jesus o ajudou de alguma forma, ou o preparou, para interpretar a personagem de Lucas, de quem não conhecemos muito, pois não há muita biografia e material nos Evangelhos sobre Lucas.
Com emoção, o actor lembra que o papel de Jesus foi muito mais difícil em termos físicos; muito mais exigente: «Os choros, os espancamentos, o deslocamento do ombro, o tempo da maquiagem. Gravávamos desde as 2:00 horas da madrugada até às 10:00 horas da manhã. E das 10 horas e 30 da manhã às 4 horas e 30 da tarde; geralmente estava a tremer de frio. Ao remover a maquiagem – demorava duas horas todos os dias – ficava com cortes em todo o corpo. Depois tive um caminho atormentado (diabólico). Fui atingido por um raio, o que resultou numa cirurgia de coração aberto; mas de outra forma nunca teriam visto aquela performance – gravada em estúdio – onde estava cheio de dor».
A dor no filme “Paul, Apostle of Christ”, explica Jim, simplesmente negligencia o que Deus sente, que é o que sente quando vai à missa todos os dias: «O mundo não O ama. Quando se faz algo assim, vamos para um lugar muito, muito profundo: Se tiramos a cruz, se tiramos alguma espécie de sofrimento, não vamos ter a força de que precisamos, especialmente nos nossos dias».
O prisma da produção por Eric Groth
Raymond Arroyo dirige-se a Eric Groth e pergunta «porquê São Paulo? E este momento da vida do apóstolo?». O jornalista sublinha que as tribulações de São Paulo poderiam dar um filme de Indiana Jones, onde o homem é espancado e preso. Mas este filme é o verdadeiro drama que acontece com Paulo: «Porquê esta parte, a última etapa da sua vida, quando está na prisão? É uma espécie de santidade confinada no final?. Por que todos vocês escolheram esta parte da história?».
Eric Groth confidencia que no momento de decidir como se iria contar a história de Paulo pensou que seria preciso realizar uma série com episódios múltiplos, dado a história de vida deste apóstolo. Mas depois de reflectir – com emoção – sobre a vida destes santos maravilhosos do passado, olhando para a incrível experiência de conversão por que Paulo passou, optou por retratar os últimos anos deste apóstolo.
Para o produtor, Paulo é uma pessoa muito humana, que sabe que é salva pela graça de Deus e, ainda assim, luta com a sua humanidade. Eric considera que é importante pensarmos e podermos reflectir: «É muito como eu sou!», revela.
Raymond Arroyo pede ainda a Eric para comentar a relação entre Paulo e Lucas? É muito bonito ver como estes actores lhes deram vida, diz Eric: «Quando se vê os contactos que teriam surgido, algo realmente humano, o seu relacionamento, é lindo».
Eric Groth ilustra o relacionamento de Paulo e Lucas como «um irmão mais velho e um irmão mais novo; o mentor de alguém novo na fé; é algo bonito de se mostrar. Penso que no nosso mundo de hoje, como cineastas, queremos colocar no contexto destas histórias todo o tipo de coisas com as quais nos podemos ligar. Temos necessidade de mentores nas nossas vidas, termos pessoas que seguimos, termos pessoas que aprofundem mais a nossa fé. E isto é tão importante para nós que influenciou o processo de realização do filme».
Visão académica do teólogo Scott Hahn
Indo ao encontro de Scott Hahn, professor de Teologia na Franciscan University of Steubenville e fundador e presidente do St. Paul Center for Biblical Theology, o moderador pede-lhe que fale sobre Lucas – o que sabemos dele, seja através da sagrada tradição ou de alguns detalhes que a Bíblia nos transmite.
Hahn refere que há uma certa ironia, «porque a maior parte do que sabemos sobre Paulo é através de Lucas, no livro dos Actos dos Apóstolos, e muito do que sabemos sobre Lucas é através de Paulo, em termos de fontes escritas, referindo-se a ele como o médico amado». O teólogo resume que Lucas provavelmente era um gentio, mas também companheiro de Paulo. Desde o capítulo 16 do livro dos Actos dos Apóstolos – acentua Hahn – mais do que apenas um companheiro, Lucas era discípulo de Paulo.
O entrevistado considera que é também aqui onde entra a tradição oral da Igreja, pois é delicioso saber que Lucas sabia o que escrevia. Por exemplo, em Lucas, capítulo 2, versículo 51: «Sua mãe guardava todas estas coisas no seu coração». Segundo Hahn, a tradição preenche o espaço em branco ao nos contar que não só Lucas passava tempo com a Virgem Santíssima, como também a pintou: «Essa era outra característica que ele tinha, o dom da arte. O ícone de Nossa Senhora remonta a Lucas na nossa tradição».
Lucas era profundo e, ao mesmo tempo, humilde sobre si mesmo. No livro dos Actos dos Apóstolos dá-nos a conhecer a maior parte do que sabemos sobre as viagens de Paulo.
Raymond Arroyo pede a Scott Hahn para contextualizar este momento da vida de Paulo na Bíblia, uma vez que parece estarmos apenas perante uma comunidade cristã sob assalto, escondida e perseguida: «Paulo está na prisão. Mas o que há mais para além disso no filme?» Hahn lembra que o Império Romano de Nero caiu numa corrupção muito profunda; fala-se da uma escuridão que provavelmente era demoníaca: «Aqui está a comunidade cristã, como o corpo de Cristo, experimentando o que o corpo de Jesus já tinha passado algumas décadas antes, no início dos anos 30. Então reconhecemos que esse é o momento em que parece que este império, esta cultura da morte, apagará a vida do corpo de Cristo».
O teólogo realça a relação entre Paulo e Lucas. Confessa gostar muito do modo como o actor James Faulkner interpreta Paulo. Não tem a certeza se todos gostam de Paulo, mas acredita que irão gostar depois de verem o filme: «Eu adoro Paulo desde os quinze anos. Há 45 anos que nutre o meu interesse. Penso que o filme nos remete para um velho provérbio: “enterram-nos, mas não sabem que somos sementes”».
Raymond Arroyo coloca mais duas questões para finalizar: «Qual a importância de São Paulo hoje? E qual a sua relevância?». Hahn destaca que durante os últimos dois mil anos nenhum outro escritor teve a influência de Paulo. Quando olhamos o Novo Testamento vemos que escreveu treze dos 27 livros. «Era o mentor de Lucas. Lucas era companheiro de Paulo. Neste filme, mostrar os dois, partilhando um só coração, uma vida, é significativo». Lucas só escreveu dois livros do Novo Testamento: o Evangelho de Lucas, que é o livro mais longo, e em segundo lugar o livro dos Actos dos Apóstolos.
Nos seus dois livros do Novo Testamento, Lucas escreve mais palavras que Paulo. «Os dois juntos somam mais de metade do Novo Testamento. Há dez anos, o Papa Bento XVI declarou o ano de São Paulo. Focámo-nos então, durante um ano inteiro, nos seus escritos. Uma espécie de redescoberta do seu génio, mas também do seu coração».
Que este filme seja mais um caminho para irmos ao encontro do Evangelho, das Escrituras, para assim ouvirmos a voz de Deus, que nos chama e nos ilumina na nossa peregrinação para o céu. O apóstolo Paulo é, sem dúvida, uma chama que tem de arder no coração de cada cristão.
Miguel Augusto (*)
(*) descrição de um debate na Universidade Franciscana de Steubenville (Estados Unidos), moderado pelo jornalista Raymond Arroyo, com o actor Jim Caviezel, o produtor Eric Groth e o teólogo Scott Hahn.