«A luz de Cristo gloriosamente ressuscitado nos dissipe as trevas do coração e do espírito».
Durante o tempo Quaresmal, experimentámos um momento extraordinário de graça – as «24 Horas para o Senhor» – uma iniciativa promovida pelo Papa Francisco, por meio da qual ele convidou todos os fiéis da Igreja Universal a celebrar o Sacramento da Reconciliação durante a adoração do Santíssimo Sacramento. O Santo Padre inspirou-se nas palavras do Saltério «Mas de Ti vem o perdão» (Sl 130: 4) como tema de fundo deste ano. De sexta-feira, 9 de Março, a sábado, 10 de Março, tivemos a oportunidade de adorar o Santíssimo Sacramento, experimentar esse momento de Reconciliação e ser iluminados pois através do perdão e da reconciliação, a escuridão é dissipada e uma «nova luz» se acende nos nossos corações (in Missal Romano, «lucernário» da Vigília Pascal).
Desejo recordar o que escrevi na minha Mensagem de Natal do ano passado: «Exorto todos os grupos e instituições pastorais da Diocese a trabalhar para uma cultura de misericórdia: reconciliação e comunhão entre os jovens e a família. Convido os jovens e as suas famílias a organizar e discutir actividades relacionadas com este tema, dando-nos as mãos para promover uma cultura de misericórdia, de caridade e de alegria». Precisamos urgentemente de uma cultura de misericórdia para promover a reconciliação e a comunhão entre gerações.
Infelizmente, a escuridão permanece e continua a crescer nas nossas famílias. Não existe a família perfeita! Nós não temos pais perfeitos; nós mesmos não somos perfeitos; não nos casamos com a pessoa perfeita e nem temos filhos perfeitos. Os membros da família reclamam um com o outro e ficam desapontados um com o outro. Por essa razão, não pode haver casamento saudável ou família saudável sem o exercício do perdão. Somente confiando na única luz verdadeira – a Luz de Cristo, a luz da Sua Ressurreição e perdão, poderemos dissipar as forças das trevas.
O Papa Francisco falando sobre a família dizia que «o perdão é vital para a nossa saúde emocional e sobrevivência espiritual. Sem perdão, a família torna-se um palco de conflitos e um bastião de queixas. Sem perdão, a família adoece». O perdão desintoxica a alma, purifica a mente e liberta o coração. «Quem não perdoa não tem paz interior e comunhão com Deus. A dor é um veneno que intoxica e mata. Manter uma ferida no coração é uma acção auto-destrutiva. É uma autofagia. Aquele que não perdoa adoece fisicamente, emocionalmente e espiritualmente… É por isso que a família deve ser um lugar de vida e não de morte; um enclave de cura e não de doença; um lugar de perdão e não de culpa» (Discurso do Papa Francisco durante o encontro com as famílias em Cuba, 22 de Setembro de 2015). O perdão e a cura trazem alegria, enquanto a miséria produz dor e causa doenças.
A fim de permitir que a luz de Cristo brilhe sobre as famílias, precisamos de manifestar as três características fundamentais da família católica:
Primeiro de tudo, a família reza. Como podemos orar em família? Deixem-me recordar mais uma vez as palavras do Papa Francisco: «Parece que a oração seja uma coisa pessoal; além disso, nunca se encontra um momento oportuno, tranquilo, em família…». Isto recorda-nos a nós cristãos da necessidade de ser sempre humildes, de perceber que precisamos de Deus. A sugestão do Papa vai directa ao problema: «Todas as famílias precisam de Deus… Precisamos da sua ajuda, da sua força, da sua bênção, da sua misericórdia, do seu perdão. E é preciso simplicidade: para rezar em família, é necessária simplicidade! Rezar juntos o “Pai Nosso”, ao redor da mesa, não é algo extraordinário: é fácil. E rezar juntos o Terço, em família, é muito belo; dá tanta força! E também rezar um pelo outro: o marido pela esposa; a esposa pelo marido; os dois pelos filhos; os filhos pelos pais, pelos avós… Rezar um pelo outro. Isto é rezar em família, e isto fortalece a família: a oração» (Homilia para o Dia da Família, 27 de Outubro de 2013).
Em segundo lugar, a família guarda a fé. De que modo nós, em família, guardamos a nossa fé? Conservamo-la para nós mesmos, na nossa família, como um bem privado ou, como sugere o Papa Francisco, «sabemos partilhá-la com o testemunho, com o acolhimento, com a abertura aos demais?… As famílias cristãs são famílias missionárias. Elas são missionárias também na vida quotidiana, fazendo as coisas de todos os dias, colocando em tudo o sal e o fermento da fé! Guardai a fé em família e colocai o sal e o fermento da fé nas coisas de todos os dias» (Homilia para o Dia da Família, 27 de Outubro de 2013). Com essa mentalidade, podemos manter a fé nas famílias e levar ao quotidiano o sal e o fermento da fé.
Em terceiro lugar, a família vive a alegria. Devemos saber que a verdadeira alegria não é algo superficial, não vem das coisas. O Papa Francisco disse: «A alegria verdadeira vem da harmonia profunda entre as pessoas, que todos sentem no coração, e que nos faz sentir a beleza de estarmos juntos, de nos apoiarmos uns aos outros no caminho da vida». No entanto, «a base desse sentimento de alegria profunda está na presença de Deus, a presença de Deus na família, está o seu amor acolhedor, misericordioso, cheio de respeito por todos. E, acima de tudo, um amor paciente: a paciência é uma virtude de Deus e nos ensina, na família, a ter este amor paciente, um com o outro» (Homilia para o Dia da Família, 27 de Outubro de 2013).
Diante do Círio pascal, convido-vos a meditar sobre o mistério da ressurreição de Cristo. Da luz da vela, discernir e ver que Cristo é rico em amor e perdão no meio da família. Lá podeis encontrar o seu amor, alegria e paz. Lá podeis experimentar verdadeiramente como «a luz de Cristo gloriosamente ressuscitado dissipa as trevas do coração e do espírito».
+ D. Stephen Lee Bun Sang
Bispo de Macau