Há uma regra que muitos viajantes adoptam e que costuma resultar: nunca elevar muito as expectativas em relação ao próximo destino a visitar. Acontece que a China é a excepção à regra: por mais que as expectativas do viajante sejam altas, a RPC consegue sempre surpreender.
Há dias, uma delegação de jornalistas de Órgãos de Comunicação Social de Macau, nas línguas portuguesa e inglesa, deslocou-se à Província de Jiangsu, tendo visitado as cidades de Nanjing, Wuxi e Suzhou. E, de novo, foi “surpresa”, e por vezes “estupefacção”, o sentimento reinante em cada momento vivido.
Ao cepticismo do Ocidente, a China vai respondendo com obra. Logo à chegada, os aeroportos – modernos, mais limpos do que num passado não muito distante, e perfeitamente integrados na rede urbana de transportes públicos. Depois, as vias de acesso ao centro das cidades – estradas, autoestradas e caminhos-de-ferro construídos em tempo recorde, por forma a dar resposta aos fluxos de veículos e pessoas.
Por todo o lado são visíveis e se aferem as medidas inscritas nos planos de acção ambiental do Governo Central e que se estendem aos diferentes níveis do poder local, ou seja, do que no Ocidente comumente se designa de “municípios”. Na China são “Municípios” as cidades cujo crescimento económico e social as permitiu emanciparem-se, passando a gozar de autonomia alargada, a ponto de estarem em pé de igualdade com os Governos provinciais.
A oferta hoteleira e de restauração é outro dos itens a ter em conta, pois ombreiam – aliás, superam – com os melhores hotéis de mundo, ao mesmo tempo que empregam muitos trabalhadores com baixas qualificações académicas.
E se no meio deste quadro de desenvolvimento e crescimento económico, o tecido empresarial poderia já não surpreender, pois desde o final dos anos 80 do século passado que tem vindo a ser acompanhado, monitorizado e estudado por empresários, académicos, e até por quem não se interessa por estas matérias (tal é a incontornabilidade da realidade), a verdade é que uma análise, por mais superficial que seja, permite perceber que há um novo paradigma: a economia cultural!
A Província de Jiangsu é um dos melhores exemplos de como a economia e as novas políticas ambientais são uma mais-valia, se aliadas à Cultura e suas diferentes manifestações. A título de exemplo, destaco o museu que preserva as ruínas do Grande Templo de Bao’en, o Museu de Nanjing, a exploração (sustentável) da área urbana atravessada pelo Rio Qinhuai ou ainda o Jardim da Floresta do Leão – serviu de inspiração para a concepção do nosso Jardim de Lou Lim Ioc. Estas são quatro das maiores atracções turísticas de Jiangsu, sendo facilmente perceptível, no caso do museu das ruínas do Grande Templo de Bao’en, a adopção de inúmeras soluções tecnológicas, ao mesmo tempo que vigora um absoluto respeito pela Natureza ambiental e espiritual.
A verdade é que o tecido empresarial chinês mudou muito nos últimos anos, em resultado da conversão das fábricas mais poluentes em unidades fabris mais amigas do Ambiente, o que explica a proliferação de empresas dedicadas ao desenvolvimento de produtos ligados às tecnologias de informação.
Se chegados a este ponto ainda houvesse quem tivesse dúvidas quanto ao potencial chinês, eis que outros, como Singapura, se aproximaram de Pequim, rendidos ao Novo Império do Meio. E foi precisamente com a cidade-Estado que a China firmou um acordo de cooperação, vindo os dois países a desenvolver o Parque Industrial de Suzhou (SIP, na sigla inglesa). Este ocupa uma área total de 278 quilómetros quadrados, com cerca de 807 mil e 800 residentes permanentes, combinando diferentes sectores de actividade e lazer para os trabalhadores e as suas famílias. Do que foi permitido observar, houve o cuidado da parte dos projectistas em adoptar o SIP de infraestruturas sociais, como escolas, Universidades, centros de animação cultural, hospitais e outras unidades de saúde, jardins e zonas de lazer para miúdos e graúdos.
Dado que a médio prazo não é expectável que todas as fábricas poluentes saiam da China, ou passem por um processo de reconversão, muito do foco está em minimizar o impacto ambiental e social das empresas nas comunidades onde se estabelecem. As políticas implementadas para o alcançar tem permitido melhorar a qualidade de vida das populações, mesmo nas periferias das cidades. Assim, evita-se a proliferação de bairros suburbanos, autênticos guetos em que o sentimento de exclusão do grupo é combustível para a criminalidade.
Quanto às críticas, nomeadamente da autoria de personalidades ou de Estados – é algo que haverá sempre, o que é perfeitamente normal quando se pretende menosprezar as maiores e mais fortes economias do mundo. Lembremo-nos dos ataques diplomáticos aos Estados Unidos nos anos 80 e 90…
A conclusão que se tira é simples: apesar da China ser hoje a segunda maior economia do mundo, caminhando a passos largos para o pódio cimeiro em que há muito se encontram os Estados Unidos, tende-se a ignorar o que de bom a China vai fazendo, preferindo-se enaltecer o mau e menos bom. Sim, porque também há disso exemplos, claro! Mas desafio o leitor a nomear um país em que tudo seja perfeito.
Immanuel Kant dizia que somos livres quando podemos fazer o que não queremos. Eu acrescentaria: e quando fazemos o que não queremos, atingimos a liberdade e a prosperidade. Todas as religiões o explicam.
José Miguel Encarnação
na Província de Jiangsu