Será que o homem precisa de um sistema de navegação moral?
Já vimos que precisamos de normas morais e formais que advêm da lei moral (natural) e são necessárias pela nossa natureza. É uma lei que pode ser reconhecida pela razão e pode ser considerada como sendo razoável. Este código moral natural é confirmado e melhor esclarecido por uma lei revelada divinamente (a divina lei positiva), a qual, para além disso, convida o Homem a almejar um objectivo mais elevado, um objectivo que ultrapassa a sua natureza, um objectivo superior: a santidade.
A lei moral (a natural e a revelada) é ponto de referência objectivo para as acções morais. Ao invés da lei da natureza, que necessariamente governa os seres não racionais, a lei moral necessita ser aceite e interiorizada por cada pessoa. Cada um de nós precisa de padrões subjectivos, porque cada um é livre e responsável. A este padrão subjectivo chamamos “consciência”.
A consciência é como um sistema de navegação. Mas à semelhança do sistema de navegação de um barco, ou de um avião, que necessita de um ponto de referência exterior [pelo menos no início da viagem] e de um destino, o consciente também precisa de padrões objectivos externos (a lei natural e a divina lei positiva, ou lei revelada) para auxiliar o Homem a navegar ao longo vida.
A consciência é um julgamento feito pelo intelecto. Não é apenas uma percepção ou intuição. Assim sendo, podemos adaptar ao nosso consciente o que estudámos sobre o nosso intelecto.
Para efectuarmos correctamente um julgamento necessitamos de estar informados e formados. A falta de informação é ignorância. A ignorância é um defeito do intelecto, assim como da consciência. A ignorância pode acontecer devido a vários factores:
1 – Desconhecimento sobre o que se passa, o que pode ser detalhado melhor como se segue: 1.1 – A natureza da acção (exemplo: estou a “roubar” ou a “pedir emprestado”? Estou simplesmente “a dizer a verdade” ou “a dizer a verdade e prejudicar a reputação de alguém ao mesmo tempo?” E o que concerne à moralidade dessa acção (“esta acção foi boa ou má?”). 1.2 – A minha intenção em fazer algo – muitas vezes as nossas intenções são um misto de bom e não-tão-bom. 1.3 – As circunstâncias que rodearam a acção: o “quem”, “onde”, “quando” e “como”.
2 – Desconhecimento da lei natural. Assim como o intelecto não pode inventar ou criar o seu próprio conhecimento, a consciência é um julgamento baseado num padrão exterior ou norma: a lei moral (natural e revelada). Para se fazer um julgamento correcto precisamos de saber quais os padrões necessários.
A ignorância pode desculpar alguém das responsabilidades? Nós vimos (FILOSOFIA, UMA DENTADA DE CADA VEZ, nº 48) que a responsabilidade decorre de uma acção livre, e que uma acção livre necessita de conhecimento. Se uma pessoa não souber plenamente a natureza, a intenção, as circunstâncias, ou a moralidade da acção, a sua ignorância poderá atenuar ou mesmo eliminar a responsabilidade das suas acções.
Uma pessoa agindo na ignorância (do acto) pode ser culpável dependendo se a sua ignorância é (1) vencível ou culpável, ou (2) não vencível ou inculpável. E qual é a diferença? Como o próprio nome indica, a ignorância vencível pode ser ultrapassada porque a pessoa é mentalmente capaz de compreender os princípios envolvidos. Se essa ignorância for devido a falta de esforço, a ignorância é culpável. “Este é o caso de quando um homem ‘tem pouco interesse em saber o que era verdade e bom, ou quando a consciência é, aos poucos, quase cegada pelo hábito de pecar’ [Gaudium et Spes, 16]. Nestes casos a pessoa é culpada pelo mal que cometeu” (Catecismo da Igreja Católica, 1791).
Por outro lado, a ignorância inculpável iliba a pessoa da responsabilidade. Poderá também existir em pessoas de grande capacidade intelectual porque terá acontecido que elas tenham sido doutrinados por pessoas que respeitavam e tenham aderido aos seus ensinamentos.
Pe. José Mario Mandía