O que torna os seres humanos imprevisíveis?
Já vimos que o comportamento das plantas e dos animais, as suas reacções a estímulos ambientais, são previsíveis. Além disso, as suas respostas aos estímulos podem ser condicionadas. Numa certa extensão o comportamento humano também pode ser previsível e também pode ser condicionado. No entanto, o Homem tem a capacidade de reagir de maneiras diferentes do que se poderia esperar. Assim a questão é: O que faz com que o Homem seja imprevisível? O que faz dele (Ser Humano) um mistério?
Vimos antes que todos os seres vivos possuem poderes ou capacidades cognitivas, conhecimento (“entrada” – aquisição), resposta (“saída” – reacção). Examinando como essas capacidades operam somos capazes de encontrar as respostas para as nossas interrogações. Deixem-nos dar uma vista de olhos à primeira capacidade – cognição (aquisição de conhecimento).
A capacidade cognitiva começa com o que vemos, ouvimos, cheiramos, provamos, sentimos ou tocamos. Isto é algo que temos em comum com os animais. Mesmo quando o conhecimento se insere mais profundamente, na realidade, ainda assim, é verdade que “nihil [est] in intellectu nisi prius [fúerit] in sensu” – não existe nada no intelecto, a menos que tenha passado através dos (sido adquirido pelos) sentidos. Este grau de conhecimento a que poderemos chamar de “sentido do conhecimento” também abrange os nossos órgãos de sentidos, corporais ou físicos. A Biologia explora e explica esses processos.
Tal é a importância dos sentidos no conhecimento que ficou demonstrado que quanto mais sentidos nós usamos no conhecimento de alguma coisa, maior é a possibilidade de aprender bem ou aprender mais sobre essa coisa. Por exemplo: alguém aprende uma língua não apenas lendo, mas também ouvindo, e ouvindo bastante (e naturalmente, repetindo, repetindo muitas vezes). Outro exemplo: se uma criança ouviu que é bom demonstrar respeito, então adquiriu algum conhecimento. Mas se, para além de ter ouvido dizer algo sobre este assunto, ela tiver visto como se faz, e tiver sentido como o respeito lhe foi concedido, ela não só apreendeu na sua mente, mas aprendeu realmente a mostrar respeito pelas outras pessoas nas suas acções.
No entanto, há algo de não material no facto de conhecer. Deixem-me tentar explicar, por comparação, os dois actos de Conhecer e Comer. Os dois processos de conhecimento e de comer têm algo em comum. Quando comemos alguma coisa, vai para o interior do nosso corpo, torna-se parte de nós. Quando tomamos conhecimento de algo, de alguma forma também vai para dentro de nós. Mas há uma diferença entre o conhecimento e o comer. Quando comemos alguma coisa, digamos uma maçã, temos que inicialmente destruir a maçã e só depois a convertemos em parte de nos próprios. A maçã que comemos, desaparece. Mas quando conhecemos alguma coisa, como por exemplo a mesma maçã, nós não a destruímos, ela não desaparece, fica na mesma. Nada muda. Mas mesmo assim “alguma” parte da maçã tornou-se parte de nós. E qual é essa “parte” ou aspecto da maçã que adquirimos sem a destruir?
Relembremos as lições 35 e 36 (sobre as quatro causas). Sabemos, por isso, que todas as coisas materiais possuem uma forma (“O que é?”) e matéria (“Isto é feito de quê?). Precisamos desses dois conceitos para entendermos o processo do conhecimento. O acto de comer afecta tanto a forma como a matéria da coisa que está a ser comida. Mas o acto de conhecer apenas envolve apreender a forma da coisa conhecida. Por causa disso o acto de conhecer não abrange matéria, recebe apenas algo não-material (a forma). Sendo assim, uma filosofia puramente materialista nunca poderá explicar satisfatoriamente como é que o sentido da cognição ou do conhecimento acontece.
Mas ainda não respondemos à pergunta: “Porque é que o Homem é imprevisível?” Teremos que considerar algumas outras coisas antes de podermos dar uma resposta.
Pe. José Mario Mandía