Filosofia, uma dentada de cada vez (22)

O que é “ens”?

Quando uma criança nasce torna-se consciente do que a rodeia. Mesmo que o bebé ainda não possa distinguir uma coisa de outra, mesmo assim tem a consciência da existência de coisas: quando nascemos tornamo-nos conscientes da existência das coisas (em Latim, “ens”).

O que é o “ser” (ens)? “Ens est id quod est” – “O Ser é o que existe”. (Na realidade já falámos sobre este assunto há algum tempo atrás, no segundo artigo desta série sobre filosofia). Qualquer coisa que exista, tudo o que é real, é “ser”. Enquanto lemos este estudo deixem-nos dar uma vista de olhos à nossa volta: Tudo o que vemos são “entia” – seres – (“entia” é o plural de “ens”), tudo o que se vê são “seres” ou “entia”.

O papel ou o monitor do computador onde estamos a ler estas palavras é um “ens” (ser), assim como a mesa à nossa frente, o vosso telemóvel, o vosso relógio, o arroz ou a sanduíche que comeram ao almoço, e mesmo vós próprios, são seres. Mas sim, também existem “entia” (entidades) que não podem ser vistas. Mas por agora deixemo-nos usar somente os “entia” (coisas) visíveis, para facilitarmos a nossa discussão.

Enquanto olhamos à nossa volta, para os “entia” que nos rodeiam, veremos que existem diferenças e semelhanças entre eles. A folha de papel sobre a mesa, o monitor do computador, o telemóvel, o relógio, a sanduíche, são todos diferentes uns dos outros. Uma folha de papel não é um monitor de computador, e o monitor do computador não é um relógio, nem é uma sanduíche.

Há algo que faz cada coisa ser o que é, algo que faz com que o papel seja papel e não uma sanduíche, algo que faz com que um relógio seja um relógio e não um monitor de computador. Na filosofia, chamamos esse facto de essência (em Latim, “essentia”). Cada coisa possui a sua essência própria. A essência é o que faz com que os “seres” sejam diferentes uns dos outros. É o que distingue um gato de um rato, uma caneta de um lápis, etc.

Mas a folha de papel sobre a mesa, o monitor do computador, o telemóvel, o relógio, a sanduíche, também têm algo em comum: todos eles “são”. Nós dizemos que eles têm “esse” (“esse” – lê-se ésse – em Latim significa literalmente “ser”).

Se a essência é o que faz uma coisa ser o que é, “esse” é o que faz com que algo seja (exista). Todos os seres têm a qualidade de “ser”, mas a essência de cada espécie de cada “ser” é diferente. A essência circunscreve o “ser” (esse) a um certo “modus essendi” (maneira de ser). Por exemplo: a essência de uma folha de papel não inclui a “vida”, ao passo que a essência da mosca inclui (a vida). A essência de um pardal inclui a capacidade de voar, mas a essência de uma vaca não inclui (a capacidade de voar). A essência do “ser” humano inclui a capacidade de reflectir e raciocinar, o que o faz ser diferente de todos os outros animais. É importante entendermos isto? Sim. Especialmente quando falamos de Ética.

Mas voltemos ao “esse” – o acto de “ser”. Quando dizemos “acto” o que queremos dizer com isso? Será que significa uma acção do género de comer ou andar, ou saltar? Não, ou melhor, não apenas estas acções. Aqui seguimos a definição de Aristóteles. Para Aristóteles, a palavra “acto” (“energeia”, em Grego) significa tudo o que é perfeito ou completo. E isto é o oposto de potência (“dynamis”, em Grego) que significa uma capacidade real (e não apenas uma possibilidade) de adquirir uma certa perfeição (para os curiosos, consultem Aristóteles, Metaphysica IX, 6, 1048 b 1). Assim sendo, quando dizemos “o acto de ser” referimo-nos ao princípio que faz com que uma coisa “seja” (exista), o princípio que torna essa coisa “real” e lhe concede a perfeição de “ser”.

Resumindo, aprendemos aqui três conceitos básicos: “ens”, “essentia” e “esse”. E agora, podem explicar isso pelas vossas próprias palavras?

Pe. José Mario Mandía

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