Cinquenta anos de diálogo
Era uma vez um casal normal. A sua unidade matrimonial era tal, que os dois até utilizavam a mesma pasta de dentes.
Ele era um homem metódico: gostava de dobrar com grande cuidado o tubo à medida que ele se gastava. Ela, pelo contrário, era uma mulher temperamental: preferia apertar o tubo onde lhe desse mais jeito, sem excessivas precisões. Esta desarmonia originava frequentes discussões. Tais atritos quase chegaram a ser uma verdadeira tragédia com um final pouco feliz.
Até que um dia os dois descobriram o caminho da felicidade conjugal. Ser marido e mulher não significava compartilhar exactamente as mesmas opiniões sobre tudo. Por isso, cada um passou a ter o seu tubo de pasta de dentes e a apertá-lo de acordo com o seu modo de ser.
Aprenderam, com este modo de actuar, a respeitar esse pequeno âmbito de individualidade. Superaram, neste diminuto detalhe, as pretensões de se imporem mutuamente critérios ou gostos pessoais.
Este caso faz pensar: conviver não é uma tarefa fácil. Todos nós tendemos a impor aos outros o nosso modo de ver as coisas. É preciso que nos convençamos de que isso não acontece somente na casa ao lado.
Reconhecê-lo é o primeiro passo para que exista da nossa parte uma atitude de abertura em relação à perspectiva alheia.
Então aprenderemos a ser flexíveis. Flexibilidade não é frouxidão de carácter – é capacidade de reconhecer as nossas rigidezes!
Depois do reconhecimento vem o esforço – que tem de ser sincero – sem aparentar uma segurança que não possuímos.
Geralmente, é esta aparência que nos torna difíceis no convívio mútuo. Não somos melhores do que os outros. Pensar o contrário é o que nos separa daqueles com quem convivemos. Não são as nossas limitações.
O esforço sincero inclui uma característica muito importante: saber escutar.
É uma atitude de quem deseja compreender o outro e aquilo que ele tem para nos dizer. É prestar atenção e não limitar a nossa capacidade de aprender. É não permitir que ideias fixas substituam o pensamento aberto e livre.
São estas ideias fixas – diferentes das nossas convicções – que impedem a atitude de abertura que é fundamental para o diálogo. E porque a violência é néscia e não resolve nada, e o desprezo pelos outros também não, o diálogo é a única solução verdadeira para os problemas da convivência.
Dizia-me um amigo, recentemente, ao celebrar as suas bodas de ouro: Cinquenta anos de casamento são cinquenta anos de diálogo.
Pe. Rodrigo Lynce de Faria
Doutor em Teologia