Licença para matar
Todo o ser humano pode e deve, em qualquer circunstância, considerar que a vida é um bem e lutar por viver de acordo com a nobreza e a grandiosidade desse mistério, que recebeu como dom.
Curar, aliviar a dor, prolongar a vida e retardar a morte, sempre foi o cerne da prática clínica consagrado no “Juramento de Hipócrates” há mais de vinte e cinco séculos, actualmente jurado por todos os médicos em acto solene, sendo ainda hoje uma exigência deontológica, preconizada pelo espírito de serviço e respeito pela riqueza da vida, pela essência do Homem, que por mérito transcendente foi elevado à qualidade de Pessoa, expoente máximo da dignidade humana.
A realidade do sofrimento, no fim da vida preocupa e assusta, todavia o que mais dói, é sem dúvida, a enorme dor da solidão, é ter de sofrer sozinho e sentir-se desamado.
Procurar na “morte assistida” – eutanásia – a fuga ao sofrimento da pessoa que com doença incurável e numa situação final da sua vida entenda que não quer continuar a viver, é uma falsa questão, é confundir a opinião pública.
A eutanásia é a ausência de capacidade de resposta para o drama do sofrimento. Mais premente do que querer legalizá-la, será perguntar que mais se poderá fazer pelos pacientes que perderam a vontade de viver.
No triunfo duma visão utilitarista da vida e da “cultura do descarte”, que considera os idosos inúteis para a sociedade, transfere a decisão de se desfazerem deles para os médicos e familiares, matando-os com o apoio do Estado, pois também este se liberta do peso dos encargos e das verbas elevadas despendidas nestes casos.
Eis como desaparece a liberdade de escolha num ser humano fragilizado e debilitado pela doença e pelo sofrimento físico e emocional, ficando à mercê dos interesses económicos, dos falsos critérios de utilidade social, sendo seduzido para uma “morte doce”, contribuindo para um inaudito protagonismo político de querer legalizar um acto que por si é imoral e por isso sempre foi punido por lei.
É bom não esquecer que a Medicina dos nossos dias já tem uma resposta técnica e humanizada para as situações de sofrimento e doença terminal, promovendo a qualidade de vida, no tempo físico que ainda resta: Cuidados Paliativos ou Cuidados Continuados, conforme o caso.
São cuidados de saúde activos e totais, prestados aos doentes que não respondem aos tratamentos curativos, desenvolvidos por equipas de profissionais especializadas, que promovem a qualidade e a dignidade do doente. Estes serviços respeitam a vida e encaram a inevitabilidade da morte sem a antecipar ou atrasar artificialmente.
Promover a humanização da pessoa em sofrimento, confortá-la na dor, rodeá-la de carinho e acompanhá-la nos momentos finais, é um imperativo moral da Medicina, que importa não esquecer e fomentar.
Urge pois que todas as instituições, Igreja incluída, laborem em conjunto nesta tarefa de criar novas sinergias de autêntica caridade e defendam uma cultura de Amor, Vida, Solidariedade e Paz.
SUSANA MEXIA
Professora