Dificilmente poderemos ser felizes sós. Precisamos de usufruir da companhia dos outros. A afectividade, o amor, o carinho, a atenção, importam, e muito. Fomos criados para comunicar, para viver em comunidade, para construir, para partilhar os bons e maus momentos, para amar. Neste contexto, reveste-se da maior importância o papel aglutinador da família, ainda que não seja, às vezes, tão perfeita conforme gostaríamos. Contudo, é o local onde nos aceitam como somos, nos apoiam, nos ajudam a ir em frente, nos educam, nos ensinam as virtudes, os valores, a lutar pelos nossos projectos, a ser solidários, tudo isto nos diferentes ciclos que vivenciamos. A família é uma escola de vida, que nos dá as bases essenciais, preparando-nos assim para construirmos o nosso próprio caminho, segundo a nossa escolha, esperando-se que seja para o bem. Muitas vezes, quando tudo falha na vida, regressamos às origens, ou seja, à família, e quando esta já não existe, por qualquer motivo, falta-nos a segurança, a protecção, o aconchego do lar, a protecção familiar, sentimos um enorme vazio, parecendo que o chão falha debaixo dos nossos pés. Uns suportam o isolamento sentido, a saudade, melhor do que os outros. É a vida a passar com os seus momentos altos e baixos! Por outro lado, os amigos, a vivência em sociedade, a cultura, ajudam-nos a minimizar a solidão algumas vezes sentida.
Mais difícil se torna quando a idade avança. Olhamos à nossa volta e constatamos que até a maior parte dos nossos familiares amigos já partiram, provocando a sensação de nos encontrarmos privados de ligações humanas que tinham para nós um significado extremamente importante. Cada um de nós, lida com a solidão de um modo diferente. Uns, aceitam-na, procurando tornar-se mais independentes. Outros sentem-se mais desamparados. Para quem tem fé é mais fácil suportar esta realidade. Recordo a frase de Jesus: «Vinde a mim, todos vós que estais cansados e oprimidos, e eu vos aliviarei». Com Deus a nosso lado torna-se mais fácil navegar pelas águas da solidão, encontrar descanso e paz. São Josemaría escreveu no seu livro “Sulco”: “Fomenta na tua alma e no teu coração – na tua inteligência e no teu querer – o espírito de confiança e de abandono na amorosa Vontade do Pai celeste… – Daí nasce a paz interior por que anseias”. Volto ao tema da solidão. Desta vez para dar alguns exemplos de como é possível ajudar a minimizá-la. Ao abrir hoje o computador deparei-me com várias mensagens. Uma amiga brasileira feliz, enviava-me um poema que tinha escrito sobre a pandemia. Apesar de se encontrar em confinamento, e já com mais de oitenta anos, continuava a desenvolver a sua actividade intelectual. Outra amiga, também já com alguma idade, enviava fotografias das amoras deliciosas do seu quintal, referindo que ia fazer uma compota excelente para os sobrinhos. Um amigo bem mais jovem, comentava a sua nova realidade. Tinha concluído o curso de medicina e tinha iniciado a especialidade. Estava muito feliz! Outra amiga residente no estrangeiro chegava a Lisboa por pouco tempo. Convidava-me para tomar um café. E assim se ia ultrapassando alguma solidão.
Entretanto, outra amiga referiu que ia haver no parque uma tarde musical dos anos 70, com o conjunto “Lucky Duckies”. Combinámos assistir. Foi muito bom e muito participado cumprindo todas as regras de segurança em vigor. Um verdadeiro bálsamo depois de tantos meses de confinamento. Os músicos estavam felizes e emocionados por terem público. Há seis meses que não tocavam com público a participar. Foi muito bom. Tantas famílias com crianças! Os mais resistentes foram os mais idosos, muito nostálgicos destes ritmos musicais. No dia seguinte, quando fui tomar café, deparei-me com um novo evento, dedicado ao Dia Mundial da Criança, denominado: “Magia no Parque Bensaúde”. Logo à entrada estavam duas mascotes, o Mickey e a Minnie, entre muitos balões coloridos que faziam o gáudio das crianças. Havia imensa animação no parque destacando o picadeiro com cavalos da Polícia Florestal. Havia filas de crianças, na companhia da família, ávidas por montar. E muito mais a que infelizmente não foi possível assistir porque o programa ocupava o dia todo.
Termino este artigo com parte da letra da música denominada: “What a Wonderful World” de Louis Amstrong, cantada na véspera pelo conjunto “Lucky Duckies”: “Eu vejo as árvores verdes, as rosas vermelhas a florescer para mim. O céu é azul, as nuvens brancas, o brilho abençoado do dia e a escuridão sagrada da noite, e penso, que mundo maravilhoso! Vejo amigos a apertar as mãos, a dizer como estás? Bebés a chorar, que vejo a crescer, aprenderão muito mais do que eu. Que mundo maravilhoso!” Concluo, referindo: “Dificilmente poderemos ser felizes sós!”.
Maria Helena Paes
Escritora