C.Y. Leung, o “betinho” de Pequim
Na passada terça-feira corria o nono dia de desobediência civil em Hong Kong e O CLARIM deslocou-se a Admiralty para tomar o pulso aos protestos desencadeados por estudantes e membros do movimento “Occupy Central”. Acima de tudo, retivemos o facto de o Chefe do Executivo da RAEHK, C.Y. Leung, ter a vida muito pouco facilitada.
De manhã estivemos no distrito de Central, e o que chamou mais a atenção foi a escassez de trânsito rodoviário que circulava pelas oito faixas de rodagem (quatro em cada sentido), na artéria contígua à estação do “Peak Tram”, em frente aos Jardins Zoológico e Botânico de Hong Kong.
E foi a caminhar por esta zona verde da capital financeira da Ásia que chegámos a Admiralty, sede dos edifícios governamentais, do Gabinete do Chefe do Executivo e do LegCo.
Nas primeiras horas da tarde quase que não se avistava vivalma nas ruas, muito menos automóveis, fossem particulares ou táxis. Apenas uma carrinha de transporte de valores e um camião de recolha do lixo tinham a honra de usufruir da outrora movimentada “Tamar Street”.
A qualidade do ar que se respirava melhorou consideravelmente em relação a qualquer dia normal, porque agora não se fazia sentir o cheiro do monóxido de carbono expelido pelos tubos de escape.
As paredes e as grades cobertas com cartazes, ou “banners”, com palavras de ordem contra o Chefe do Executivo, C.Y. Leung, ou a favor da democracia plena, faziam-nos lembrar que Hong Kong ainda vivia momentos de desobediência civil. “Seja qual for o resultado, lutámos muito e estamos orgulhosos”, lia-se num “banner”, que aqui traduzimos de Inglês para Português.
Na rua “Queensway”, em frente ao edifício do “High Court”, avistámos algumas tendas de campismo junto a uma barreira com grades que atravessavam a estrada, mais a via destinada aos eléctricos. Algumas pessoas caminhavam descontraidamente, ora no piso em concreto, ora por entre os carris-de-ferro, como se o local fosse um autêntico jardim público.
Por nós passaram idosos em passo descontraído, engravatados ocidentais e de etnia chinesa em passo acelerado, mas também jovens que envergavam roupas “casual” e denotavam sentido de missão.
Pelo caminho havia algumas tendas de campismo, mas também barracas de lona onde se podia encontrar muitas garrafas de água, sacos de plástico para a recolha de lixo, chapéus de chuva – símbolo das manifestações – entre outros artigos.
Aproximou-se de nós um jovem com um rádio na mão. Queria saber se precisávamos de água, de comida ou de outra coisa qualquer. Revelámos o nosso propósito e quisemos saber o que pensava das manifestações e por que estava aqui como voluntário.
Depois de se apresentar como Andy, 25 anos, disse que era assistente social numa entidade não governamental. Referindo que em geral estava ali pela democracia porque acredita na democracia e nas pessoas, acrescentou que havia «coisas mais importantes do que o trabalho», tais como «lutar pela democracia e por um futuro melhor em Hong Kong».
Ao perguntarmos o que entendia por democracia, respondeu: «Vivemos neste território e queremos que seja um lugar melhor, e por isso estamos nas ruas. Pedimos um melhor sistema democrático, para que a voz das pessoas possa ser ouvida pelo Governo e pelos poderosos».
Por esta altura já era notório um grande sentimento de solidariedade e de entreajuda no seio de todos estes jovens que deixaram a escola e o trabalho, ou a família, para se dedicarem a uma causa na qual acreditam.
Ainda em Admiralty, fomos até à “Hardcourt Road”, considerada uma das principais artérias de concentração de pessoas (juntamente com outras em Causeway Bay, Mong Kok e Central). O local foi enchendo à medida que a hora avançava. Na “Lennon Wall Hong Kong”, parede de uma escadaria que dava para uma ponte pedonal elevada, avistavam-se centenas de papelinhos de notas coloridos com mensagens de todos os que quiseram deixá-las coladas no local.
A poucos metros estavam duas tendas com jornalistas e operadores de imagem da estação de televisão CNN. Aliás, a “Hardcourt Road” não era estranha aos jornalistas, porque por todo o lado havia pessoas com câmaras de imagem, microfones, máquinas fotográficas e blocos de notas.
Pela artéria também se encontravam tendas de campismo, essencialmente muitos jovens sentados ou deitados nos chão, e demais pessoas, idosas ou não, que passavam descontraidamente ou iam num passo mais acelerado. Muitas delas captavam o momento com os seus “smartphones”.
«Os cidadãos de Hong Kong até podiam aceitar o que foi proposto por Pequim [haver uma primeira triagem de candidatos, antes do sufrágio universal propriamente dito]. O grande problema é que o Chefe do Executivo só olha para Pequim e para as oligarquias, e não para as necessidades da população, que está cada vez mais farta de ver a sua qualidade de vida piorar a cada dia que passa», referiu Patrick, natural do Reino Unido, mas a viver em Hong Kong há cerca de duas décadas. As suas palavras fizeram-nos pensar sobre a realidade de Macau…
Para hoje, sexta-feira, está agendada uma primeira reunião entre representantes dos estudantes e a secretária para a Administração, Carrie Lam.
Pedro Daniel Oliveira