CRISE NO SEIO DA COMUNIDADE CATÓLICA DO SRI LANKA

CRISE NO SEIO DA COMUNIDADE CATÓLICA DO SRI LANKA

Indemnização às vítimas dos ataques de 2019

A vaga de manifestações e protestos anti-governamentais sem precedentes que, a partir da Primavera de 2022, abalou o Sri Lanka, nação com 22 milhões de pessoas, pode ter abrandado significativamente, mas os problemas económicos, a inflação e a escassez de combustíveis e de medicamentos continuam a ser problemas do dia-a-dia, sem solução à vista. Quem tinha meios financeiros e profissionais para o fazer deixou já o País. Por exemplo: quase um milhar de médicos rumaram a outras paragens nos últimos doze meses; o mesmo aconteceu com muitos dos profissionais das engenharias e demais áreas científicas. A Igreja Católica esteve sempre na linha da frente alertando para o agravamento da crise económica, o enfraquecimento da classe média e a trágica condição dos mais desfavorecidos. No pico da crise houve até quem não tivesse acesso à alimentação básica e diariamente lutasse pela sobrevivência, como foi o caso de certas comunidades católicas. Um relatório da UNICEF mencionava 2,3 milhões de crianças no Sri Lanka a precisarem de ajuda nutricional.

Neste momento, e após empréstimos multibilionários de instituições internacionais que de uma forma artificial estabilizaram financeiramente o País, o Sri Lanka luta pela recuperação económica e social. Porém, o problema continua a ser a falta de reformas políticas sinceras e efectivas, e as persistentes dificuldades económicas que continuam a melindrar a população e a qualquer altura poderão gerar novas manifestações e novos confrontos de rua. Em declarações à agência noticiosa FIDES, o padre Basil Rohan Fernando, sacerdote da arquidiocese de Colombo e director nacional das Obras Missionárias Pontifícias no Sri Lanka, não podia ser mais claro: «Estamos numa luta sem tréguas para conseguir superar a crise; continuam a ser muitas as pessoas em extrema situação de pobreza». Assim sendo, vencer o egoísmo, optar pela partilha e pela solidariedade nacional é o único caminho a seguir. «Muitos jovens, sobretudo estudantes, exigem uma mudança de governo para que haja garantia de um futuro melhor. A pensar neles, todos temos o dever de trabalhar para garantir uma vida digna a todos os cidadãos», observou ainda este clérigo cingalês de origem portuguesa. De resto, as preocupações da comunidade cristã, as diversas formas de enfrentar a crise económica e política, o contributo das muitas comunidades religiosas para o bem comum, a verdade e a justiça, foram temas que estiveram no centro da conversa decorrida em Outubro do ano passado entre o recentemente eleito Presidente do Sri Lanka, Ranil Wickremesinghe, e o bispo de Kurunegala e Presidente da Conferência Episcopal do Sri Lanka, D. Harold Anthony Perera, também ele de ascendência portuguesa.

No turbilhão desta fortíssima e longa tempestade político-social transparecem, contudo, algumas boas notícias. Numa sentença histórica proferida a 13 de Janeiro deste ano, o Supremo Tribunal de Justiça do Sri Lanka considerou que o ex-Presidente do Sri Lanka, Maithripala Sirisena, e quatro outros altos funcionários foram negligentes ao não tomaram as medidas preventivas necessárias para impedir os tristemente célebres ataques terroristas de Domingo de Páscoa de 2019, que tirariam a vida a 279 pessoas. A 21 de Abril desse ano, três igrejas e três hotéis de luxo na capital comercial, Colombo, foram alvo de uma série de atentados terroristas suicidas coordenados e executados por membros do Estado Islâmico. Mais tarde, nesse mesmo dia, ocorreram explosões menores num complexo habitacional, em Dematagoda, e numa casa de hóspedes, em Dehiwala. Maithripala Sirisena, de 71 anos, foi condenado a pagar uma indemnização de cem milhões de rupias (273 mil dólares americanos) às famílias das vítimas que entraram com o processo no Supremo Tribunal. Também alguns ex-chefes da polícia, dos serviços secretos e do Ministério da Defesa do Sri Lanka foram responsabilizados e obrigados a pagar indemnizações aos familiares das vítimas. Esta é a primeira vez que um Chefe de Estado do Sri Lanka é responsabilizado por não ter evitado um ataque terrorista. O veredicto, como seria de esperar, foi recebido com grande satisfação entre a população do Sri Lanka, sobretudo no seio da comunidade católica, a mais visada com os sangrentos ataques e aquela que desde o início criticou a “investigação inadequada do Governo” no que diz respeito aos ataques àquela que é já conhecida como “Páscoa sangrenta”, tendo tomado a iniciativa de pedir às Nações Unidas uma investigação internacional.

«Enquanto Igreja Católica, sempre exigimos e continuaremos a exigir a verdade, a justiça e a responsabilidade. Temos o direito de saber quais foram os instigadores e quais os objectivos não declarados desses ataques», disse à agência FIDES, o padre Basil Rohan Fernando. «Foi dado um importante passo importante para que seja feita justiça. Nos últimos anos, estivemos próximos das famílias das vítimas dos ataques e sempre tentamos apoiá-los nesta árdua jornada de recuperação».

Joaquim Magalhães de Castro

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