Os Menonitas – VI
Depois de uma interrupção na série sobre os Menonitas, ei-los de novo, para começarmos a finalizar o tema. Religião, espiritualidade, educação e futuro são hoje as linhas do nosso artigo. Que mais não é do que o retrato da simplicidade deste grupo cristão que persiste neste mundo agitado e globalizado.
Após a missa, ao Domingo, cada família menonita entra na sua carroça e dirige-se para casa, ou de algum parente. Cada carroça é como uma cabana de metal pintada de cinzento, forrada com madeira por dentro, puxada por um cavalo. O Domingo é sagrado para os menonitas, único dia em que não se trabalha, como está plasmado nas Escrituras e manda a religião. Ser menonita é trabalhar todos os dias, excepto no dia do Senhor. Dia de missa e família, convívio comunitário, simples.
Depois temos a educação. Esta tem quatro “ciclos”, ministrados por professores escolhidos pela comunidade. A educação é obrigatória e consiste em instrução religiosa, leitura e escrita, além de realização de operações matemáticas elementares. A fase escolar ocorre entre os 5-6 e os 13-14 anos. Numa única sala, os rapazes à direita e raparigas à esquerda, como na igreja, os alunos recebem o ensino fundamental até o professor decidir se e quando se deve passar para a próxima fase. Se o grupo de alunos é grande, pode haver dois ou até mais professores. A escola possui uma sala de aula, um grande pátio, anexos e a casa do professor. A sala tem uma mesa para cada cinco alunos, a mesa do professor e livros de canções religiosas, orações, aritmética, leitura e Bíblias. Aprendem bastante geometria, com exemplos práticos de aplicação, como o cálculo de perímetros, áreas e volumes de corpos geométricos, operações de vendas. Mas não aprendem, por exemplo, história – apenas o que está referenciado na Bíblia –, nem geografia, biologia, química, física ou cidadania.
Cada comunidade sustenta a escola, todos contribuindo para o seu sustento, através do líder. Ninguém contesta, todos confiam na justiça da contribuição, de acordo com a condição financeira de cada família.
A escola é financeiramente sustentada pelos habitantes do campo, liderados pelo Chefe do Campo, encarregado de cobrar aos vizinhos o valor necessário para o seu apoio. As propinas escolares nunca são negadas ou contestadas, pois têm total confiança na sua correcta aplicação. O valor das parcelas está de acordo com a condição financeira do colaborador, ou seja, paga mais quem tem mais. O professor recebe um valor mensal, assistência médica, uma casa perto da escola e oito a dez hectares de terra. O salário é recebido durante o período correspondente ao ano-lectivo. As aulas decorrem, normalmente, das 8 horas e 30 às 11 horas e 30 da manhã, e das 12 horas e 30 até às 15 horas e 30. O método pedagógico de ensino é analítico de correcção de erros, tudo em “baixo Alemão” (como se fala no Norte da Alemanha e nos Países Baixos), o idioma oficial da instrução escolar. O sistema usado para operações matemáticas é o sistema inglês de pesos e medidas.
A temporada dos grandes trabalhos agrícolas marca o calendário escolar, sendo que as férias são agendadas para que os mais novos possam ajudar os pais no trabalho dos campos. Desta forma, os períodos de Novembro a Março (Inverno, findo o qual vêm as sementeiras, por exemplo) e Maio a Agosto (findo o qual vêm as colheitas e a preparação dos campos) são dedicados ao estudo. Como o telefone ou até o telégrafo não existem nas comunidades mais tradicionais, a única comunicação é feita por correio normal do país em que se inserem. Se houver urgência, usam-se os cavalos ou carroças.
RELIGIÃO, ACTUALIDADE E FUTURO
Os princípios menonitas são todos religiosos. É a religião que regula as atitudes e decisões individuais e colectivas. Portanto, a sociedade constitui uma verdadeira teocracia, de moldes rígidos, sem uma verdadeira organização sacerdotal, pois mantêm-se iguais ao que eram há quatrocentos anos. A união é alcançada através da identificação espiritual, da comunhão de interesses e de uma forte crença comum. Muitos consideram os menonitas como uma forma ultrapassada de protestantismo. O seu livro base é e será sempre a Bíblia, como os luteranos, por exemplo. Mas em relação a estes apresentam variantes do ritual que remontam a épocas anteriores à Reforma Luterana. O baptismo, por exemplo, só ocorre após a puberdade.
Defendem também de forma intransigente o pacifismo, que os caracteriza, com base na recomendação bíblica: “deves dar a outra face” e a decisão inviolável de não prestar juramento sob nenhuma circunstância. No que diz respeito à organização religiosa, a autoridade eclesiástica é confiada aos bispos; um para cada colónia e um grande número de pregadores, um para cada circunscrição. Todos são nomeados por eleição entre os membros mais proeminentes e a nomeação é normalmente vitalícia. Os pregadores estão encarregados de realizar cerimónias religiosas nas igrejas ao Domingo, o dia do culto.
Os templos, “igrejas”, apresentam a mesma simplicidade do clero. São construções espaçosas e simples, sem decoração. Não há torres nem sinos, pinturas, esculturas, altares e qualquer objecto religioso. A “missa” começa às oito da manhã e dura várias horas. Pelo menos duas horas são dedicadas a canções religiosas, exclusivamente vocais, a maior parte das quais são as mesmas desde há mais de quatrocentos anos. O pregador faz dois sermões: um oficial, em” alto Alemão” (hochdeutsch), outro, menos formal, em “baixo Alemão” (niederdeutsch). O pregador celebra à maneira das ilhas da Frísia (actualmente, no Nordeste dos Países Baixos e Noroeste da Alemanha): fato preto comprido, um macacão preto, botas altas e chapéu de pescador que segura na mão. Os crentes comparecem vestidos como sempre. A proibição mais estranha dos menonitas é a da música. O uso de aparelhos de rádio ou qualquer tecnologia reprodutora de som não é permitido e, quanto ao canto, só é permitido o religioso, como nas igrejas. Portanto, a dança não é praticada, sendo mal vista. A vida social é limitada a reuniões esporádicas, onde são servidos doces e chá. Não há celebrações e expressões exageradas de alegria, as quais são consideradas de mau gosto e próprias ao “pecado”. Os casamentos presididos pelo pregador consistem num ritual formalmente parecido com o do… funeral! Na essência, o pregador dirige um sermão aos noivos, enquanto os membros da família rezam e entoam canções religiosas. Depois, há um banquete. Após a cerimónia, os noivos desfrutam de uma semana de folga (sem trabalho nos campos), em que costumam visitar parentes e amigos e vão à autoridade civil do Estado para formalizar o casamento.
Vítor Teixeira
Universidade Católica Portuguesa