Os Menonitas – IV
O êxodo continua. A sina da migração mais uma vez surgia como o caminho a ser trilhado para a sobrevivência dos Menonitas. Mais um exílio como forma de salvação, numa tradição bíblica que começava a fazer parte da vida deste grupo de cristãos reformados. O novo destino era o México, a nova terra da promissão e do futuro. Mas sempre conscientes de que podia ser mais uma etapa.
Foram enviados alguns representantes dos menonitas para estudarem e analisarem o destino e as possibilidades, tendo os resultados da missão sido animadores. Contactaram depois com funcionários do Governo mexicano, alguns do topo da hierarquia do País. Estes contactos foram muito proveitosos, em particular junto do círculo do Presidente Obregón (1880-1928, Presidente desde 1820).
Vários grupos menonitas mostraram um imediato interesse em se estabelecerem no México e formariam mesmo uma delegação que iria ao México para finalizar o acordo. De Manitoba e Saskatchewan, principalmente, partiram comunidades inteiras para o Estado de Sonora, no Noroeste do México, via Arizona e Texas, nos Estados Unidos, onde as formalidades de emigração foram tratadas.
NOVAS TERRAS,O MESMO POVO
David Rempel, cronista da coluna migratória, narrou todas as peripécias e aventuras vividas durante a viagem, de Winnipeg, em pleno Inverno, via El Paso (Texas) e Tucson (Arizona), para o México. E lá foram, lá ficaram, até hoje. Desde 1922, o ano em que este périplo até ao México se desencadeou. De recordar que em 1917 um pequeno grupo deslocou-se à Argentina, país onde se viria a fixar mais tarde uma comunidade. Em 1927 fixou-se a primeira comunidade no Paraguai, a partir de 1930 no Brasil, em 1954 fixam-se na Bolívia, em 1958 no Belize e, depois, na Costa Rica, Uruguai e na Colômbia. Chile, Equador, Guatemala, Honduras, El Salvador, Jamaica, Panamá ou Perú, Venezuela, entre outros, são alguns dos destinos americanos para comunidades menonitas, onde se mantêm vivas.
Outra data importante é a de 1920, ano em que se fundou o Comité Central Menonita, com recursos de congregações do Canadá, Estados Unidos e dos Países Baixos, a nação onde nasceram na Europa e onde ainda perduram actualmente. A primeira missão do Comité foi a de angariar fundos para auxiliar os irmãos que remanesceram na Ucrânia, onde sofreram os horrores da Primeira Guerra Mundial (1914-1918), experiência dramática que reviveriam numa escala ainda mais horrenda no grande conflito seguinte, a Segunda Guerra Mundial (1939-1945).
Segundo a Conferência Mundial Menonita, existiam em 2007 cerca de um milhão 480 mil membros, em 82 países, isto só contando os indivíduos baptizados (crianças excluídas, portanto). Repartiam-se assim, por continente, em finais de 2006, antes daquele relatório da Conferência: África: 530 mil; América, um milhão 126 mil (América do Norte: 500 mil, América Central e Caribe, 356 mil, América do Sul, 270 mil); Ásia e Pacífico: 241 mil e 500; por fim na Europa, 52 mil e 500. Se durante quase quatrocentos anos estiveram sempre no Hemisfério Norte, a partir de meados do século XX irradiaram pelo planeta. E estatisticamente têm crescido até aos nossos dias. Por exemplo, nos princípios do século actual, somente cerca de 37 por cento dos menonitas vivia na Europa e América do Norte. Em 2015, num último “censo” da citada Conferência, concluiu-se que há hoje mais menonitas em África do que em qualquer outro continente. Com efeito, os menonitas africanos são cerca de 750 mil, contra 680 mil na América do Norte, 420 mil na Ásia-Pacífico, 280 mil na América Latina e Caribe, e 65 mil na Europa.
COMO VIVEM OS MENONITAS?
Mas falemos do povo, das suas crenças, das suas comunidades, tradições, religiosidade, modo de vida. Há os que são conservadores e há os que são liberais. Mas os que mais se distinguem são os conservadores, são os que nós identificamos afinal como sendo menonitas e os distingamos de outros grupos cristãos reformados.
Comecemos pelas habitações menonitas. Entrar numa casa menonita é parar no tempo. Ou melhor dizendo, é recuar duzentos anos. Os móveis preservam a ancestralidade das formas e dos gostos, como que transplantados na cápsula do tempo da Prússia e Leste da Europa para qualquer quinta menonita de hoje. Transmitidos de geração em geração, pintados com cores vivas, onde predominam o vermelho e o amarelo, são em tudo idênticos aos dos ancestrais, dos pioneiros, colocados num chão em tudo igual ao de antigamente, sempre impecável e bem cuidado. As camas dispõem-se como que em camadas, camaratas, até atingirem o tecto, destacando-se nelas os colchões grossos e as almofadas de penas. Foi sempre assim.
Os menonitas são extremamente conservadores, sem superfluidades nem ostentação ou excessos, são muito poupados, económicos, mas também muito empreendedores. Apenas usam máquinas agrícolas modernas para as necessidades do campo, mas continuam a usar vagões – chamados “bóias” no Brasil – que são puxados por fogosos e poderosos cavalos da raça Percheron. Os menonitas dominam a preservação de carnes frias, salgadas e defumadas, frutas e legumes, e conhecem muito bem o potencial de uma padaria, as virtudes do pão. Mas a sua principal virtude, ou imagem de marca, convenhamos, além da agricultura, é a produção de laticínios, principalmente a produção do famoso “queijo menonita”.
No vestir, são também conservadores. Com uma tradição de quatro séculos, as roupas dos menonitas não mudaram muito, parecem mesmo retiradas de um livro de história dos séculos passados. As mulheres desde a sua infância que usam vestidos largos e floridos, sobre fundo preto ou alguma cor escura (cinzento, por exemplo, azul marinho), cobrindo os ombros com xailes pretos ou floridos, levando chapéus largos com fitas de cores vivas, além de lenços vermelhos, rosa e brancos quando são solteiras, pretos depois do casamento e na viuvez. Os homens, por seu turno, usam calças ou macacão com chapéu de abas largas, de palha; aos Domingos, ou em ocasiões especiais, usam fatos pretos com camisas pretas e sem gravatas, além chapéu de feltro com abas largas. Sobriedade, austeridade e pouquez, são as palavras que descrevem a forma de vestir menonita. Como em tudo na vida desta tendência reformada cristã, que tem ainda mais características muito próprias que definem a sua idiossincrasia peculiar e típica, como veremos….
Vítor Teixeira
Universidade Católica Portuguesa